Uma pesquisa israelense, publicada na quinta-feira (20), na revista científica Journal of Clinical Investigation, indicou a presença de anticorpos contra a covid-19 em bebês cujas mães foram vacinadas com a Pfizer/BioNTech. Um dia antes, repercutiu no Brasil o primeiro caso de um recém-nascido, na cidade de Tubarão, Santa Catarina, que herdou os anticorpos da mãe, imunizada com a Coronavac. A notícia é positiva, mas imunologistas alertam que os resultados podem não garantir imunidade e que os anticorpos tendem a decair com o tempo.
O bebê Enrico nasceu em 9 de abril e, um dia depois, foi submetido à coleta de sangue para o teste neutralizante do coronavírus. O exame indica se há a presença de anticorpos no organismo capazes de bloquear a ação viral. Resultados abaixo de 20% são considerados negativos, mas no caso de Enrico, o teste apontou 22% de neutralização.
Médica que atuava na linha de frente em um hospital da prefeitura de Tubarão, a mãe de Enrico, Talita Menegali Izidoro, de 33 anos, recebeu a Coronavac em fevereiro, na 34ª semana de gestação. A decisão foi tomada junto com o obstetra, já que, na época, a imunização para gestantes só era recomendada sob acompanhamento. Como àquela altura o bebê já estava quase formado e seria uma vacina com vírus inativado - com efeitos colaterais mais brandos -, Talita não teve dúvidas:
— O Enrico veio para mostrar que a vacina funciona e que é o caminho.
Segundo ela, que também é professora da Faculdade de Medicina da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), o teste no filho foi feito para colaborar com pesquisas sobre os efeitos da vacinação em mulheres grávidas e para incentivar gestantes a se vacinarem.
Pesquisa em Santa Catarina
Mãe e filho ainda serão acompanhados pelos próximos seis meses por um grupo de pesquisadores catarinenses. Novos testes serão feitos a cada trimestre, e o relato do caso deve ser publicado em uma revista científica internacional.
— O que nós vamos avaliar é se haverá o aumento dos anticorpos (no bebê) e se isso vai estar relacionado com a amamentação — explica o farmacêutico bioquímico Daisson Trevisol, que é secretário municipal da saúde de Tubarão e integrante do núcleo que analisa o caso de Enrico no Centro de Pesquisas Clínicas da Unisul, onde é professor.
Em abril, outros estudos já haviam apontado que mães imunizadas contra a covid passam anticorpos para os bebês pelo leite materno. Uma análise feita pelo Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP), a partir de mais de 100 estudos clínicos, concluiu que os anticorpos poderiam prevenir a infecção ou reduzir a gravidade dos sintomas dos bebês.
O que já se sabe sobre anticorpos maternos em recém-nascidos?
Segundo o imunologista e professor da USP Jean Pierre Schatzmann Peron, pesquisador-líder da Plataforma Científica Pasteur, a transmissão vertical de anticorpos já é conhecida:
— Evolutivamente, o bebê herda os anticorpos da mãe através da placenta e só a partir do sexto mês é que consegue produzir as próprias respostas imunes.
Pesquisas anteriores com vacinas contra coqueluche, tétano e gripe já apontavam respostas semelhantes. A diferença é que, agora, há a comprovação em relação à vacina contra a covid-19.
Segundo Schatzmann Peron, o que se sabe é que os anticorpos decaem com o tempo.
— Não há estudos que comprovem se os bebês estão imunes. O que sabemos é que esses anticorpos têm um potencial para protegê-los. Provavelmente, deve se repetir o que acontece com a vacinação. No caso da Pfizer, é 95% de proteção, e se ele se infectar, vai ter uma doença muito mais branda do que se não estivesse imunizado.