Qual a opinião dos militares graduados sobre os protestos contra o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF), convocados por militantes bolsonaristas para 15 de março? GaúchaZH ouviu integrantes da ativa e da reserva das Forças Armadas, além de especialistas em assuntos da caserna. Alguns externaram de forma explícita seus pensamentos, outros preferem o anonimato.
Constatação imediata: todos concordam, em parte ou totalmente, com a visão de que o Congresso chantageia o presidente Jair Bolsonaro e o STF é tolerante demais para com criminosos.
A palavra chantagem foi usada recentemente pelo ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general da reserva Augusto Heleno, para definir uma delicada negociação de orçamento.
— Não podemos aceitar esses caras chantagearem a gente o tempo todo. Foda-se! — declarou Heleno durante a cerimônia de hasteamento da bandeira, no Palácio da Alvorada, na manhã de 18 de fevereiro, em uma fala captada por um microfone aberto.
Chantagem virou o mote de militantes bolsonaristas para o ato em apoio ao presidente, dia 15. De quebra, muitos pediram fechamento do regime. "Feche o Congresso e o STF! AI-5 - O Brasil inteiro aprova!", diz um cartaz postado no Facebook, num grupo de apoio ao general Heleno.
No cartaz que pede fechamento do Congresso e do STF, foram usadas fotografias de quatro generais do Exército: Hamilton Mourão (atual vice-presidente da República), Augusto Heleno (do GSI), Roberto Peternelli (deputado federal pelo PSL-SP) e Mário Lúcio Araújo (secretário de Segurança de Minas Gerais). Nas fotos, todos usam fardas, apesar de já estarem fora das Forças Armadas.
Abaixo das fotos está cunhada a frase: "Os generais aguardam as ordens do povo", como se todos estivessem convocando para a manifestação do dia 15. E não estão. Dois deles tentaram, nesta quarta-feira (26), se desvincular do ato.
O vice-presidente Mourão declarou, em mensagem à imprensa: "Não autorizei o uso de minha imagem por ninguém. Quanto aos protestos, fazem parte da vida democrática e temos de conviver com eles".
Peternelli enfatizou que "ninguém me pediu para usar minha imagem" e declarou que as expressões "Fora Maia e Alcolumbre" que estão no cartaz são tão impróprias como alguém gritar "Fora Bolsonaro".
"Atrito entre o Executivo e o Legislativo não contribui para o país. Temos de focar no que é bom para o Brasil e buscar o consenso para aprovar as reformas. Agora, fica complicado para o governo quando o relator do orçamento diminui ainda mais a fatia de verbas de que o governo dispõe para suas ações", pontuou Peternelli em entrevista ao jornal Estado de S. Paulo.
Feitas as ressalvas, qual é a opinião média entre generais ouvidos pela reportagem? A mesma do general Paulo Chagas, apoiador de Bolsonaro que, após passar para a reserva, chamou os ministros da Suprema Corte de "diminutos fantoches" e tem se especializado em frases de impacto.
— O Brasil é maior do que a inferioridade da sua Constituição e da sua Suprema Corte — resumiu, dias atrás.
A diferença entre os admiradores de Bolsonaro e muitos militares graduados é que esses fardados não gostam e não querem que sua má impressão do Congresso e do STF seja usada em atos políticos. Muito menos suas fotos em convocações de protesto, como fizeram alguns divulgadores do ato público do dia 15. Temem vincular sua imagem a badernas.
Um ex-ministro, general graduado, revelou a GaúchaZH pensar que o presidente não deveria compartilhar um vídeo de "autolouvação" para chamar um ato em favor de si mesmo. E afirma ser questão de honra, entre os militares de carreira, não terem sua imagem fardada em cartazes que chamam para atos políticos.
— O general Edson Pujol (comandante do Exército) tenta, acertadamente, separar farda de governo — pondera esse militar.
Quanto à opinião sobre Congresso e STF, o general é taxativo: é a mesma de grande parte da população.
— São duas instituições muito políticas e pouco consideradas entre os fardados. Não é justo parlamentares sequestrarem R$ 30 bilhões do orçamento e o governo se calar. Mas isso tem de ser negociado, não virar confusão na rua — resume.
Nelson Düring, editor do site Defesanet.com, especializado em assuntos militares, considera que os militares comungam de ideias negativas sobre políticos, mas se recusam a passar um cheque em branco ao Bolsonaro ou a qualquer governante.
— Quando um general cruza o Eixão de Brasília (via expressa que separa a área militar da civil na capital federal), é como se um legionário da Antiguidade cruzasse o Rio Rubicão, em Roma: vira homem do governo. E passa a ser encarado, na caserna, como político. É por isso que todo general-ministro é estimulado a ir para a reserva. Para não misturar a farda com comício — descreve Düring.