Nem todas as forças que ajudaram Jair Bolsonaro a vencer as eleições concordam com a convocação, para 15 de março, de um ato em apoio ao presidente. A manifestação, feita pelas mídias sociais, chancela de forma explícita declarações do general Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), que acusou o Parlamento de tentar chantagear o governo nas negociações sobre o Orçamento.
—Nós não podemos aceitar esses caras chantagearem a gente o tempo todo. Foda-se! — declarou Heleno durante a cerimônia de hasteamento da bandeira, no Palácio da Alvorada, na manhã de 18 de fevereiro.
A fala do general, flagrada por um microfone aberto, virou senha para muita gente pedir o fechamento do Congresso e intervenção no Supremo Tribunal Federal (STF), dois poderes vistos com desconfiança pelo núcleo duro do bolsonarismo.
"Presidente, esperamos uma atitude enérgica. Feche o Congresso e o STF! AI-5 - O Brasil inteiro aprova!", simplifica um banner postado num grupo do Facebook criado, há vários anos, em apoio ao general Augusto Heleno.
É justamente esse tipo de frase que incomoda alguns políticos que ajudaram Bolsonaro a se eleger, no segundo turno. O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), por exemplo, diz que a manifestação de 15 de março é "inoportuna". Doria, como se sabe, foi o criador do termo Bolsodória, para justificar o voto nele e no atual presidente, em 2018. Os dois se elegeram.
Agora Doria, que muitos dizem estar de olho na cadeira de Bolsonaro numa próxima eleição, rompeu a parceria e critica o ato conclamado pelos bolsonaristas.
— O país não pode viver uma escalada de autoritarismo. Vivemos numa democracia e o regime democrático prevê respeito pelos poderes Judiciário e Legislativo. Bolsonaro não pode apenas governar para quem pensa como ele ou para os que o seguem nas redes sociais — alfinetou Doria.
E nos meios militares a convocação dos bolsonaristas também provoca celeuma. O general da reserva Carlos Alberto dos Santos Cruz, ex-comandante de duas missões de paz da ONU e um dos mais prestigiados do país, disparou um twitter na segunda-feira (24) no qual chama de "Irresponsabilidade" o uso, por parte de apoiadores de Bolsonaro, de imagens de quatro generais fardados para conclamar para o ato do dia 15.
"Confundir o Exército com alguns assuntos temporários de governo, partidos políticos e pessoas é usar de má fé, mentir, enganar a população", definiu o general, em postagem que teve 9,2 mil curtidas e 1,8 mil compartilhamentos até as 17h desta terça-feira (25).
É importante lembrar que Santos Cruz foi um dos mais importantes ministros de Bolsonaro (chefiou a Secretaria de Governo), antes de ser demitido numa intriga, por supostamente ter falado mal do presidente e dos filhos dele (algo que foi desmentido em investigação da PF).
Falamos com Santos Cruz. Ele não vai no ato em apoio a Bolsonaro, mas diz que o considera legítimo, desde que seja ordeiro e dentro da lei. O general inclusive é a favor do veto presidencial a R$ 30 bilhões orçados pelo Congresso, "porque os parlamentares já têm as emendas impositivas e as extraordinárias".
O que Santos Cruz condena é o compartilhamento de fotos de quatro militares do governo acima da frase: "Fora Maia e Alcolumbre". A montagem circula em redes sociais de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro.
— O Exército é instituição de Estado, defesa da pátria e garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem. Não confundir com alguns assuntos temporários. O uso de imagens de generais é grotesco — resume Santos Cruz.
Uma preocupação que também atinge fardados da ativa: não confundir o governante com a instituição Forças Armadas. Com motivações diferentes, lideranças como Doria e Santos Cruz sinalizam que a direita brasileira não marcha mais tão unida como nas últimas eleições.