A falta de manutenção e o uso de material asfáltico de baixa qualidade estão sendo apurados pelo Tribunal de Contas da União como possíveis causas da deterioração da freeway. A isso, segundo especialistas, podem ser adicionados outros fatores, como áreas úmidas nos arredores, chuvas localizadas e tráfego contínuo, muitas vezes de veículos com excesso de peso, já que não há balança no trecho.
A reportagem de GaúchaZH percorreu os 96 quilômetros da rodovia na quarta-feira (25) e contou 288 buracos entre Porto Alegre e Osório, em ambos os sentidos, além de rachaduras, lixo acumulado nas margens e restos de pneus sobre os acostamentos.
Afirmar quando a camada asfáltica efetivamente se rompeu requer análise aprofundada do solo. Entretanto, o engenheiro civil Lélio Brito, professor do Laboratório de Pavimentação da UFRGS, acredita que a deterioração aconteceu após o dia 3 de julho, quando venceu o contrato de concessão da rodovia com a Concepa.
— Acho improvável que (os buracos) estivessem lá durante o contrato, porque a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) fazia inspeções pelo menos semanais. Se buracos fossem identificados nestas vistorias, a concessionária estaria suscetível a multas — avaliou Brito.
Ele explica que os buracos surgem de pequenas fissuras, algumas microscópicas, por onde a água se infiltra e danifica o pavimento. Sem manutenção, as imperfeições transformam-se em buracos. Assim, mais água se infiltra e o tamanho aumenta, fazendo com que a deterioração cresça "ferozmente", nas palavras do professor.
As lagoas que embelezam o trajeto em direção ao Litoral também podem ser prejudiciais. Não havendo manutenção do sistema de drenagem, o solo amolece e faz com que as camadas superficiais se movimentem e que o asfalto se rompa.
— Sabe-se, ainda, que na nossa região há grandes volumes de chuva em pontos concentrados. Quanto mais chuva, mais problema — afirma o professor da universidade gaúcha.
O supervisor do Laboratório de Pavimentação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Glicério Triches tem uma opinião diferente. Ele acredita que as pistas não poderiam estar tão ruins com 22 dias sem manutenção, a não ser que a Concepa tivesse entregado a rodovia com fissuras no pavimento.
— A chuva só causa danos se o asfalto estiver trincado — afirma Triches.
A superintendência regional no Rio Grande do Sul do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) já estava em alerta sobre as condições da rodovia, tanto que solicitou levantamento técnico para identificar possíveis problemas estruturais.
— A abertura de buracos está muito rápida. Pavimento de qualidade não se deteriora com tanta facilidade — disse o superintendente Allan Magalhães Machado.
A concessão previa que o pavimento durasse ao menos oito anos após o fim do contrato, apenas com pequenos reparos. Apurações do Tribunal de Contas da União mostram que levantamentos periódicos realizados pela Concepa chegaram a identificar problemas na qualidade do serviço. Porém, ao informar a situação à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), a empresa alterou os resultados.
— Estava estabelecido que, terminando o contrato, aquele pavimento teria de durar oito anos. É uma exigência contratual. Pelos ensaios a que a gente teve acesso, temos a indicação de que isso não vai ocorrer — destaca o diretor da Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura Rodoviária do TCU, Fábio Amorim.
Coordenador da Câmara de Engenharia do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-RS), Márcio Marun Gomes considera que oito anos é um tempo razoável para a durabilidade do asfalto, dependendo das especificações do projeto.
— É muito mais vantagem utilizar material de boa qualidade, que não dará manutenção, do que apostar em consertos periódicos da pista — comentou.
Em nota, a Concepa disse que entregou a rodovia sem buracos, pois realizou trabalhos de conservação até o último dia de contrato, 3 de julho. Também explicou que a ANTT fazia inspeções com regularidade e que, caso constatasse necessidade de algum reparo, dava 12 horas para que fossem iniciadas as atividades de conservação.
Leia a nota da Triunfo Concepa na íntegra
A Triunfo Concepa esclarece que entregou os 121 quilômetros do trecho concedido sem buracos no pavimento, atendendo aos parâmetros estruturais previstos em contrato. Buracos, fissuras e outros danos como os identificados após o fim da concessão estão ligados ao que se chama de parâmetros funcionais, que são os mais perceptíveis aos usuários. Eles são altamente impactados por fatores como clima, peso dos veículos que trafegam e volume de tráfego, e dependem de conservação rotineira, de acordo com o preconizado pelo Manual de Restauração de Pavimentos Asfálticos do DNIT (pg. 26). Por isso, a concessionária mantinha cronogramas rotineiros de trabalhos de conservação, sendo que em alguns casos a própria equipe de inspeção de tráfego fazia o primeiro combate aos buracos, evitando que eles aumentassem, para após as equipes especializadas fazerem as intervenções.
Trabalhos de conservação na rodovia foram realizados até o último dia da concessão (3/7/18), já que era praxe a regularidade nesse tipo de serviço. Equipes da ANTT faziam inspeções independentes no trecho concedido com regularidade. Caso constatassem a necessidade de algum reparo, a concessionária tinha até 12 horas para iniciar as atividades de conservação nas ocorrências de buracos. DNIT e ANTT realizaram vistoria no trecho na entrega da concessão, e imagens da rodovia foram entregues à agência reguladora.
O trecho
Analisando os últimos seis meses de concessão, não houve nenhum pedido de ressarcimento de usuários do trecho então concedido que tivesse relação com danos causados em veículos em função de problemas no pavimento, como buracos.