No ano em que completou 105 de história, as comemorações deram lugar à solidariedade na Sociedade Gondoleiros, na Capital. Em razão do distanciamento social, o tradicional clube do bairro São Geraldo precisou fechar as portas. Com o salão de bailes vazio, as cordas dos violões se calaram e fole da gaita de quem animava as festanças também fechou – impactando na renda dos artistas que tocavam nos eventos do local.
Pensando na situação dos músicos, o clube mobilizou os frequentadores de seus bailes para arrecadar alimentos e itens de higiene. As doações são destinadas aos integrantes dos conjuntos musicais que, antes da pandemia, davam o tom do arrasta-pé de todo sábado no Gondoleiros.
— Esta é a nossa colaboração, num momento tão difícil como esse, a eles que trazem tanta alegria para nós durante os bailes — destaca Antonio Almeida, 70 anos, presidente da Sociedade Gondoleiros.
Pegos de surpresa
Apesar de a campanha focar em quem já faz parte do convívio do clube, outros profissionais da área também estão sendo beneficiados. A partir de um levantamento feito pela direção, cerca de 250 pessoas foram cadastradas para receberem as doações – entre artistas, membros das equipes de apoio das bandas e demais trabalhadores que atuam nos eventos.
— Muitas pessoas acham que a música não é um trabalho, que é algum tipo de diversão, mas a gente vive disso. Esse é um ramo que emprega muita gente, desde quem toca até quem trabalha na noite, como garçons, recepcionistas e seguranças — pontua Edu Marks, 39 anos, vocalista da banda Edu Marks & Cia.
Segundo o músico José Rosa, 62 anos, integrante da banda Art Show, a pandemia surpreendeu a todos que atuam no ramo. Há quase 90 dias longe dos palcos, a saída, para ele, tem sido a solidariedade.
— Vivo de música desde 1974 e nunca passei por uma situação dessas. Se soubéssemos do que iria acontecer, poderíamos ter nos preparado, mas fomos pegos desprevenidos. Ainda bem que existem pessoas que fazem essa força para nos ajudar. É gratificante ver o carinho que o público tem pela gente — relata José, conhecido no meio como Ganso.
Bailes fazem falta para artistas e frequentadores
Além das dificuldades financeiras, a saudade de comandar a pista de dança é outro fator que aflige os músicos de baile. Para o vocalista da banda Art Show, Jhonny Karvalho, 27 anos, subir ao palco era, também, um remédio contra a depressão. Agora, com a suspensão dos eventos, o carinho dos fãs ganhou outra forma: as doações.
— Tenho por característica interagir bastante com o público e sinto muita falta disso, além da música em si. Mas o contato continua, porque muita gente está passando por uma situação ruim agora e, ainda assim, fazendo o possível para nos ajudar.
Para quem bailava ao som dos conjuntos nas festas do Gondoleiros, o sentimento é o mesmo. Nesse sentido, a iniciativa em prol dos artistas é vista como uma forma de manter acesa a união dos frequentadores – mesmo que, fisicamente, a realidade seja de distanciamento.
— Aos sábados, todo mundo se reunia para se divertir, eles tocando e a gente dançando. Agora, ficou triste a coisa, porque não temos mais aquele momento de encontro com os amigos. Todos estão aguardando ansiosamente pela volta dos bailes, mas chegou a hora de, mesmo sem música, nos unirmos para um ajudar o outro — comenta o jornalista Wilson Rosa, 55 anos, frequentador dos eventos.
Categoria reivindica apoio
Diante da crise econômica, a saída para muitos músicos foi procurar outra fonte de renda. Para Edu Marks, cuja banda fazia cerca de 20 bailes ao mês, a solução encontrada foi a atividade informal em aplicativos de mobilidade, como motorista.
Entretanto, a reinserção no mercado de trabalho não é uma opção possível a todos.
— Toda minha renda vinha da música, e agora parou tudo. Está difícil de arrumar outro emprego nesse momento e, no meu caso, ninguém quer dar serviço por causa da idade —relata o integrante da Art Show José Rosa, de 62 anos.
Preocupados com a falta de perspectiva, e sem saber até quando poderão contar com a solidariedade, os artistas reivindicam apoio para enfrentar as dificuldades financeiras.
— Nós, que somos músicos pequenos, não temos ninguém para nos defender e nenhum tipo de amparo do governo para que possamos viver com dignidade. Muitos não conseguiram acessar o Auxílio Emergencial e estão sobrevivendo só de doações, mas elas vão chegar até quando? — questiona Edu Marks.
Como participar
/// Doações podem ser entregues na sede do Gondoleiros todas as quartas-feiras, das 14h às 18h. O clube fica na Rua Santos Dumont, 1.147, no bairro São Geraldo.
/// Para músicos que necessitarem de doações, o cadastro pode ser feito via WhatsApp: (51) 99751-0612, com Márcia, ou (51) 99316-9056, com Ana.
Produção: Camila Bengo