Dias antes de o Grêmio disputar sua primeira final de Libertadores, em 28 de julho de 1983, contra o Peñarol, um sonho mudaria o rumo da história do clube. A esposa do meia Tita, Sandra Regina, havia imaginado um gol de César na decisão. Algo improvável, já que o centroavante era reserva da equipe de Valdir Espinosa. Mas foi assim que o Rio Grande do Sul viu, pela primeira vez, a taça mais cobiçada da América ser erguida em solo gaúcho.
Para recordar essa história no projeto Saudade do Esporte, do Grupo RBS, a reportagem ouviu o autor do gol do título da Libertadores de 1983. César conta com orgulho a situação inusitada:
— Essa previsão da esposa do Tita ficou marcada na minha lembrança. Ela disse que eu faria o gol do título, e eu acreditei. Graças a Deus, foi concretizado.
Mas a história não é, assim, tão simplória. Tita e César se conheciam desde antes de jogarem juntos do Grêmio. Ambos moraram na Tijuca, bairro da zona norte do Rio de Janeiro, e cortavam o cabelo na mesma barbearia. Viraram amigos. Quando se reencontraram em Porto Alegre, tinham uma relação próxima.
Na semana da decisão, Tita e a esposa convidaram César para jantar em sua casa, no bairro Menino Deus, próxima ao Estádio Olímpico. Foi neste encontro que Sandra contou do sonho ao César.
— Lembro perfeitamente que uns dois ou três dias antes do jogo final convidei o César para jantar lá em casa, com a família toda. Foi aí que a Sandra, minha esposa, falou para ele: "Eu tive um sonho, e no sonho quem tinha feito o gol do título era você, César" — recordou Tita, em entrevista ao Esporte Espetacular, da Rede Globo, em 2017.
Inicialmente, o centroavante ficou cético. Como ele faria o gol do título se nem sabia se estaria em campo? De fato, aquele foi um ano de altos e baixos para César. O jogador havia sido contratado no início de 1983 para ser o dono da camisa 9. No currículo, tinha a artilharia do Brasileirão de 1979, com a camisa do América-RJ, e uma semifinal de Liga dos Campeões da Europa pelo Benfica. Porém, sofreu com lesões no Rio Grande do Sul e não rendeu tudo o que se imaginava.
Começou a Libertadores como titular, com a 9 às costas, mas, em meio ao torneio, viu Caio ganhar a posição. César era mais centroavante, de jogar dentro da área, enquanto seu concorrente tinha mais velocidade e trocava constantemente de lugar com Tarciso naquele 4-3-3 com dois pontas usado por Espinosa.
Na decisão, precisou esperar 63 minutos sentado no banco de reservas, ao lado de Beto, Leandro, Paulo César e Tonho — os outros quatro suplentes, já que na época apenas cinco atletas podiam ficar na casamata. Quando Espinosa lhe chamou para substituir Caio, autor do primeiro gol, que estava extenuado, tinha a chance de cumprir a profecia.
— Eu acreditava no título, que poderia ajudar. Mas não sabia se faria o gol ou não. Nós queríamos muito aquela Libertadores. Dificilmente eu e outros tantos naquele grupo teriam a chance de chegar até a final de novo. Conseguimos aproveitar a oportunidade que tivemos, e isso me deixa muito feliz — ressalta César.
Ele soube mesmo aproveitar a oportunidade que teve. Quando Renato Portaluppi fez um balãozinho pela direita e deu um chutão para a área, César apareceu e mergulhou de cabeça para recolocar o Grêmio na frente, aos 32 minutos do segundo tempo. Foi, literalmente, a realização de um sonho.
— Me lembrei do que minha mulher tinha dito. Eu não conseguia acreditar. Foi também um misto de felicidade, sabia que conquistar uma Libertadores não era para qualquer um, e aquela era minha segunda. Aí, eu saí comemorando atrás dele — lembrou Tita.
Para César, ficou uma lição: quem acredita sempre alcança. A frase pode ser clichê, mas, para ele, valeu um gol que ficará eternizado para sempre em sua memória.
— Temos de confiar e ter fé em Deus. Acabou sendo um ano maravilhoso, mesmo com todas as lesões e problemas que tive. Agradeço por ter passado por vários momentos dentro do Grêmio. A torcida sempre foi maravilhosa comigo. Sinto saudade daquela época. Até eu morrer, sempre serei grato pelo que vivi no Grêmio — destacou o centroavante, que hoje vive com a família em São João da Barra, no norte do Estado do Rio de Janeiro.