Há pelo menos três anos a defesa do Grêmio é tida como uma das melhores do continente. Não à toa, desde que a dupla de zaga formada por Pedro Geromel e Walter Kannemann se firmou como titular, o clube voltou a conquistar títulos de expressão e deu seis voltas olímpicas.
Nesta temporada, o início avassalador no Gauchão dava a impressão de que seria mais um ano sem preocupações com o sistema defensivo tricolor — que sofreu apenas um gol no Estadual. Porém, nos últimos três jogos, o time de Renato Portaluppi levou oito gols — cinco só no domingo (5), quando a equipe foi derrotada pelo Fluminense por 5 a 4, na Arena. Em 2019, foram 13 gols sofridos em 25 partidas.
A falta de zagueiros no elenco é apontada com um dos principais problemas do clube. Até agora, já foram nove formações diferentes na dupla de zaga. Hoje, além dos titulares, estão no grupo principal Paulo Miranda, que já se machucou duas vezes no ano e está em fase de recuperação para retornar ao time, Marcelo Oliveira, que rompeu três ligamentos do joelho direito e só deve voltar no ano que vem, e o garoto Rodrigues, recém promovido aos profissionais, que ainda não foi utilizado.
A alternativa encontrada pelo treinador foi improvisar Michel e Rômulo no setor, que teve a saída de Bressan para o futebol dos Estados Unidos no início do ano e, logo depois, a ida de Rafael Thyere para o Sport. A direção gremista admite a necessidade de contratar mais atletas para a posição, mas entende que não passou por isso o resultado negativo diante dos cariocas.
— Acho que o Grêmio precisa, do ponto de vista de números, de um a dois zagueiros, mas não relaciono a derrota com a falta de zagueiro — disse o diretor de futebol Alberto Guerra após o vexame de domingo.
Para tentar retomar o padrão das temporadas mais recentes, em que a defesa do Grêmio foi a terceira menos vazada no Brasileirão de 2017 e a segunda melhor no campeonato nacional de 2018, o clube tenta repatriar Gil, ex-Corinthians, com passagem pela Seleção Brasileira, e avalia a contratação de Alexander Barboza, que foi vice-campeão argentino pelo Defensa y Justicia neste ano, mas pertence ao River Plate. Mas Renato fez questão de ressaltar a confiança em Michel:
— Não foi por isso que perdemos. Perdemos porque alguns jogadores pararam de competir, e isso não pode acontecer. Michel não teve culpa. Nos descuidamos, três ou quatro jogadores acharam que o jogo tinha terminado, mas ainda estava no primeiro tempo. Poderíamos ter tomado seis, sete. Não é por causa da improvisação.
Dividindo a culpa e os méritos
Há um consenso no futebol: não é apenas papel do goleiro e dos zagueiros evitar os gols. Passa pelo primeiro combate dos atacantes, da recomposição dos meias, da marcação dos volantes, do posicionamento dos laterais. Enfim, uma infinidade de fatores define a qualidade do sistema defensivo. No caso do Tricolor, a ausência de Ramiro, que foi negociado com o Corinthians no início do ano, é apontada como uma das motivações para a piora do time nesse quesito.
— O Grêmio perdeu um jogador importante nesse contexto, que é o Ramiro. Mas o que ele tem a ver com o sistema defensivo? Às vezes, a equipe toma um gol com origem no meio ou no ataque, que não acompanharam um adversário. Talvez a ausência dele possa ter influenciado nos gols sofridos — avalia o comentarista das rádios Globo e CBN Francisco Aiello.
Geromel, em entrevista coletiva na tarde de segunda-feira, destacou que não se pode colocar toda a responsabilidade, seja positiva ou negativa, sobre quem joga atrás pelos gols sofridos:
— Quando é a melhor defesa, não é porque o Paulo Victor é o melhor, ou eu, ou o Kannemann. Contra o Fluminense mesmo, vi o André correndo muito para marcar. Quando ganha, ganha todo mundo. Quando perde, perde todo mundo.
Para o narrador do Grupo Globo Eduardo Moreno, o Grêmio fez história ao terminar o Gauchão com apenas um gol sofrido. Contudo, quando os adversários exigiram mais, o time não conseguiu ter o mesmo rendimento.
— Não conheço profundamente a base do Grêmio, se há jogadores a altura pra servir o time de cima. Provavelmente, não. Os que estavam no nível, o Renato já puxou para o grupo principal. A princípio, a solução está em sair ao mercado. O Grêmio tem uma excelente direção, mas que precisa, mesmo que atrasada, buscar contratações, especialmente na zaga e nas laterais, para reequilibrar o elenco — comenta Moreno.
Onde o Grêmio está "dando mole"?
Para diagnosticar os problemas recentes da equipe, GaúchaZH ouviu os comentaristas Francisco Aiello, das rádios Globo e CBN, Eduardo Tirone, dos canais ESPN, e Eduardo Moreno, narrador do Grupo Globo. Veja o que eles disseram sobre o time de Renato Portaluppi.
Jogadores
Aiello: Parecia que estava fácil ganhar. Fazer 3 a 0 em 21 minutos, na cabeça do jogador, dá a impressão de que está praticamente ganho. Acho que isso pode ter passado na cabeça dos jogadores. Aquele lance em que o Julio César perde a bola mostra que o Grêmio estava achando tranquilo o jogo. Se tivesse 1 a 0, acredito que ele não tentaria aquele drible.
Tirone: Acho que o segundo gol do Fluminense trouxe o time de volta para o jogo. Foi uma falha terrível do goleiro. Quando está 3 a 0, é natural que o time entenda que o jogo está decidido. Acontece que os dois times são raros, que não abrem mão de atacar. O Grêmio não sentou na vantagem. Foi isso que aconteceu, foi mole nesse sentido, de falta de atenção para saber que não estava decidido.
Moreno: Ao abrir 3 a 0, talvez tenha havido um relaxamento, que no futebol de alto nível não pode acontecer. Inclusive, os jogadores podem ter começado a pensar no jogo decisivo da Libertadores e começaram, mesmo que inconscientemente, a se poupar. O Fluminense fez dois gols num piscar de olhos e voltou para o jogo deixando o Grêmio atordoado. A partir daí, ficou mais complicado.
Direção
Aiello: Um clube do tamanho do Grêmio não deveria ter de improvisar. Pelo tamanho do Grêmio, deveria ter no mínimo mais dois jogadores por posição em condições de jogo.
Tirone: Que eu me lembre, nunca vi o Renato reclamar da falta de zagueiro no elenco. A maior briga dele foi para ter o Tardelli. Ele tem dois zagueiro muito bons, e tendo dois que ocupem esse espaço no banco, está satisfeito. Isso faz parte do Renato, que gosta de ter um time que propõe o jogo e se preocupa menos com a defesa, até por ter uma dupla titular muito boa.
Moreno: A direção tem sua parcela de culpa. O Grêmio é um caso raro no futebol brasileiro de competência de gestão. Fechou as contas com superávit. Mas peca ao não contratar pelo menos um zagueiro para reposição a Geromel e Kannemann. Já ouvi dizer que é difícil trazer um bom jogador para sentar no banco, mas o Grêmio sabe que, provavelmente, o Kannemann irá sair na próxima janela. Isso pode ser um item importante para convencer um jogador a aceitar a proposta, mesmo que em um primeiro momento seja reserva.
Renato
Aiello: Não acho que ele tenha dado mole. Pelo contrário, já vimos o Renato escalar o Grêmio com 11 reservas no Brasileirão. Contra o Fluminense, o time tinha Kannemann, Everton, Cortez, André. Em termos de escalação, estava tudo certo.
Tirone: Pessoalmente, não sei se faria algo diferente do que ele fez. O que mais ele poderia ter feito? Ter fechado mais o time quando estava 3 a 0? A grande mudança foi a do Fluminense, que tirou Airton e colocou um meia e para ir pra cima. E deu certo. Mas é claro que, quando um time está ganhando por 3 a 0 e perde o jogo, alguma coisa deu errado.
Moreno: Difícil dizer. Ele certamente tinha razões pra mexer do jeito que fez. As entradas do Vizeu e do Luan poderiam ter dado certo. O André perdeu um gol feito no fim, que faria 5 a 4 e talvez todos diriam que as substituições tinham sido corretas. Mas eu não colocaria o Marinho. O Pepê é um cara que tem sido mais utilizado e costuma entrar bem _ como no jogo contra o Libertad. Mas não posso cravar que o Renato mexeu mal.
Gols sofridos por dupla de zaga em 2019
- Geromel e Kannemann — 11 jogos, 6 gols sofridos
- Paulo Miranda e Marcelo Oliveira — 4 jogos, 1 gol
- Michel e Kannemann — 2 jogos, 5 gols
- Geromel e Paulo Miranda — 2 jogos, 0 gol
- Paulo Miranda e Kannemann — 2 jogos, 0 gol
- Michel e Marcelo Oliveira — 2 jogos, 0 gol
- Geromel e Michel — 1 jogo, 1 gol
- Rômulo e Cortez — 48 minutos, 0 gol
- Rômulo e Marcelo Oliveira — 42 minutos, 0 gol
Como foram os gols sofridos
- 2 de cabeça
- 2 de cruzamentos rasteiros da esquerda
- 2 de chutes da entrada da área
- 1 de cruzamento à meia altura da direita
- 1 de cruzamento rasteiro da direita
- 1 por cobertura da estrada da área
- 1 após roubada de bola do goleiro
- 1 de falta
- 1 de pênalti
- 1 contra