Há um paredão na frente da área do Grêmio. Em média, cada adversário precisa de duas partidas inteiras para fazer um gol no time neste Brasileirão. Nos 20 jogos disputados no campeonato, somente nove vezes Marcelo Grohe e Paulo Victor precisaram buscar a bola no fundo da meta. Na linguagem dos matemáticos, em que frações podem ser convertidas em números inteiros, é 0,45 gol por jogo.
O mais curioso é que o Grêmio nem precisou de Geromel, o melhor defensor em atividade no país, para atingir esse patamar de melhor defesa do Brasileirão. Convocado por Tite para disputar a Copa da Rússia, o zagueiro só entrou em campo oito vezes no Brasileirão.
A dupla ideal, com Geromel e Kannemann, foi usada somente em cinco partidas. Bressan e Kannemann foram os parceiros mais constantes da zaga, com seis participações. Outros fatores, como o entrosamento entre as peças, também explicam a solidez defensiva. O goleiro, por exemplo, foi o mesmo em quase todas as partidas. Marcelo Grohe, com 15 atuações, só ficou de fora quando Renato preservou os titulares ou ao sentir o desconforto muscular durante o aquecimento para a partida contra o Corinthians, no último sábado. Os laterais Léo Moura e Bruno Cortez estiveram juntos na maioria das partidas.
Renato Rodrigues, analista de desempenho, coordenador do Data ESPN, o banco de dados do canal de esportes, valoriza a afinidade entre os defensores. Houve uma pequena variação de nomes desde 2016, o ano do pentacampeonato da Copa do Brasil. Saíram da equipe os laterais Edilson, negociado com o Cruzeiro, e Marcelo Oliveira, que foi para a reserva, e entraram Léo Moura e Bruno Cortez.
— É preciso levar em conta o tempo de trabalho. Com esse período e as peças à disposição, Renato Portaluppi conseguiu montar um sistema de marcação mais alta e mais agressiva —destaca Rodrigues. — Pode ver: quando o Grêmio está com a bola, Geromel e Kannemann já procuram os possíveis escapes do adversário, antecipam e tentam evitar o contra-ataque. É o que chamamos de atacar marcando.
Ele também aponta características individuais para o êxito defensivo. Com uma referência especial a Kannemann, convocado na última semana para a seleção argentina.
— Se ele levar um drible ainda no campo de ataque, tem força e velocidade para se recuperar e tentar um novo desarme antes de o adversário terminar a jogada — observa.
Por fim, o analista aponta a mudança de cultura do Grêmio, que trocou o jogo mais reativo e combativo para a troca de passes e organização:
— E isso tudo veio acompanhado de resultados, o que aqui no Brasil é importante para dar respaldo ao trabalho.
Por trás da eficiência, há um conceito de jogo, interpreta o ex-zagueiro Mauro Galvão, campeão brasileiro pelo Grêmio em 1996 e da Copa do Brasil de 2001. Além de salientar o entrosamento de Geromel e Kannemann e a qualidade de Marcelo Grohe, ele destaca a postura tática como fator de segurança defensiva,
— O estilo de jogo do Grêmio não permite que o adversário crie tantas chances. Isso é facilitado por ter mais posse de bola. O jogo fica mais no meio-campo. O time só é ameaçado nos contra-ataques — avalia.
Para Galvão, a entrada de Jailson, a quem considera eficiente na bola aérea, além de ser bom marcador, ajuda a consolidar todo o bom desempenho da defesa.
Ao longo dos anos, o bom desempenho da defesa do Grêmio em Brasileirão tem sido uma rotina. Até mesmo nas edições em que a equipe não finaliza o campeonato nas primeiras posições. Em 2014, por exemplo, o time foi o sétimo colocado e, mesmo assim, sofreu somente 24 gols. Foi o primeiro ano de Geromel, que formou dupla com Rhodolfo na maior parte dos jogos.
No ano anterior, em que foi vice-campeão, sob o comando de Renato Portaluppi, o time foi vazado apenas 35 vezes. Naquele ano, o técnico usou basicamente um modelo com três zagueiros, composto por Bressan, Rhodolfo e Werley. Em 2012, tendo Werley, Gilberto Silva e, por vezes, Naldo como zagueiros, o Grêmio terminou na terceira posição e sofreu os mesmos 33 gols do campeão Fluminense.
Ainda que tivesse sua trajetória atrapalhada por uma lesão no ombro esquerdo, Paulo Miranda também contribuiu, quando chamado, para manter em alto nível o desempenho da defesa. Foram seis jogos no Brasileirão, quatro deles ao lado de Bressan. Na sexta-feira, o reforço trazido no início do ano do Red Bull Salzburg, da Áustria, deixou claro a importância de receber chances atuando na mesma posição das unanimidades Geromel e Kannemann:
1 O segredo é cada jogador ter a consciência de que estamos tendo oportunidade. Temos que manter no jogo o mesmo foco dos treinamentos.
Zagueiro mais utilizado por Renato durante a ausência de Geromel, Bressan conseguiu, em 2018, superar a desconfiança dos torcedores. Muito em consequência das atuações seguras contra Cruzeiro, no jogo de volta da semifinal da Copa do Brasil, e Lanús-ARG, na decisão da Libertadores, ambas em 2017. No Grêmio desde o final de 2012, Bressan, 25 anos, amadureceu em passagens por Flamengo e Peñarol. Pode ser incluído na lista de jogadores de confiança de Renato Portaluppi, que o havia convertido em titular em sua passagem pelo Grêmio em 2013.
— Por tudo o que passou, ele merece viver este momento. Bressan é perseverante, tem humildade, foco, algo raro. O sucesso tem alguns degraus que se chamam fracasso. As dificuldades o fizeram dar a volta por cima — analisa seu empresário, Marcelo Lipatin, agradecido a Renato.
O passaporte comunitário poderá ser um facilitador para a entrada de Bressan no mercado europeu, acredita Lipatin, confiante em que o zagueiro saberá aproveitar a oportunidade quando ela sugerir.
— Grandes coisas ainda vão acontecer na vida dele — aposta.
Neste sábado (25), contra o Atlético-PR, em Curitiba, cabe a Miranda e Bressan a tarefa de manter erguida a barreira defensiva e conservar o Grêmio como candidato ao título.
Duplas de zaga mais utilizadas
Bressan e Kannemann - 6
Geromel e Kannemann - 5
Bressan e Paulo Miranda - 4
Geromel e Bressan - 3
Paulo Miranda e Kannemann - 1
Paulo Miranda e Marcelo Oliveira - 1
Zagueiro que mais jogou
Bressan - 13