A série DNArquibancada apresenta 12 matérias, uma para cada equipe que disputa Gauchão 2024, e a relação visceral de pessoas com os clubes do coração. Nelas, aparecerão personagens do passado e do presente. Gente muito conhecida e outros que são anônimos para muitos, mas que resumem em sua personalidade a identificação máxima com o seu time de coração. A segunda reportagem da série conta a história de Clóvis Koppe, homem que vive seu amor intensamente pelo Avenida.
Capuleto e Montéquio, em Romeo e Julieta, Mezenga e Berdinazzi, em o Rei do Gado, é este nível de aversão que Clóvis Koppe, o ilustre Chico, nutre pelo maior rival do seu clube de coração. Ele faz parte da família avenidense de relacionamento arisco com os santa-cruzenses. O sentimento de repulsa está em sua quarta geração.
O pai de Chico participou da fundação do Avenida, em 1944. Ele e seus amigos tinham a intenção de batizar o novo clube como Independência, mas uma equipe de bolão da cidade chegou antes. A razão era singela. A reunião que decretou o nascimento da nova agremiação ocorreu na confluência da Avenida Independência com as Ruas Carlos Trein Filho e Coronel Jost. Se Independência não podia ser, optou-se pela outra parte do endereço.
Logo aos dois anos, Koppe foi iniciado nas cores verde e branco. Quatro Ave-Cruz haviam sido disputados para definir o campeão citadino de 1952. Um quinto jogo foi marcado em campo neutro, em Cachoeira do Sul. Os pais de Chico o levaram para a arquibancada. Apesar da derrota, o DNA do Nida estava introjetado em seu corpo. Não havia mais saída a não ser dedicar sua vida ao clube. Ele passou pelas categorias de base, trabalhou como funcionário e no começo do século chegou à presidência. Foi múltiplo em sua única devoção.
— Em 1962, quando reabriu o futebol profissional, depois de um ano parado, não tinha roupeiro e me candidatei. Fui roupeiro durante todo aquele ano, eu tinha 13 anos de idade. Depois, em 1964, fui goleiro do juvenil, não cheguei a me profissionalizar porque fui estudar em outra cidade — relata.
Nesse período em que esteve fora de Santa Cruz do Sul aconteceu a maior tragédia, do seu ponto de vista. Era época de bolas murchas e cofres raspados tanto para o Avenida quanto para o Santa Cruz. A alternativa encontrada para fortalecer o futebol da cidade foi fazer uma fusão entre os rivais. Longe de casa, Chico nada pôde fazer. Quando voltou, desfez o enlace.
Entre 1972 e 1978, os oponentes foram um time só. Chico foi um dos responsáveis que desfez a parceria que pouco prosperou sob a alcunha de Associação Santa Cruz de Santa Cruz do Sul.
— Me orgulho de ter sido uma das três pessoas que acabaram com a fusão. No primeiro ano (de retorno), fomos campeões do acesso e subimos para a Primeira Divisão. O Avenida estava prejudicado naquela fusão. Jornais da Capital falavam em Santa Cruz, não aparecia o nome do Avenida em nada — argumenta.
A linhagem segue com o seu filho, que teve cargo diretivo no clube. Se prolonga até seu neto, gandula do Avenida. As ramificações foram para outras partes da família. O tio também foi presidente e primos trabalham no clube. Tudo começou com o velho Koppe.
— O velho (pai de Chicho) sempre tinha carro verde, casa verde. Preto e branco nada. A minha vida foi praticamente dedicada a esse clube, a essa arquibancada. Não há quem tenha visto tanto jogo da Avenida quanto eu — assegura.
Tendo vivido na alma todas as facetas de ser torcedor do Avenida, Chico desenvolveu uma tese única sobre onde gosta de ver o seu clube jogar. Nada contra as emoções do Gauchão, mas os nucleotídeos que formam o seu DNA avenidense se agitam mais durante a Divisão de Acesso.
— É o melhor campeonato que existe. Sempre se quer sair dele. Quando se está na Primeira Divisão, luta sempre para não cair — analisa.
Quem irá dizer que não existe razão nas coisas feitas pelo coração.