O rigor dos homens do apito no Campeonato Brasileiro tem deixado jogadores, clubes e torcedores descontentes. Nas rodadas pós-Copa, três atletas foram advertidos com cartão amarelo após a comemoração de gols. A polêmica que envolve a baixa tolerância dos árbitros é alimentada pela falta de critério e de bom senso nas decisões de inibir a celebração do momento máximo do futebol.
O meia palmeirense Lucas Lima foi punido no clássico contra o Santos, na 13ª rodada, porque, segundo o árbitro, provocou a torcida adversária no Pacaembu ao apontar para o seu nome estampado na parte de trás do camisa. No último domingo, novamente em um jogo do Palmeiras, desta vez contra o Atlético-MG, o meia Moisés levou o amarelo após marcar o primeiro gol da partida. Na comemoração, o jogador pegou a câmera do fotógrafo oficial do clube, Cesar Greco, e simulou um cajado — como o personagem bíblico do qual é homônimo. Quando retornou ao gramado, foi repreendido. O mesmo aconteceu com o atacante Luan, do Atlético-MG.
O motivo das duas últimas advertências não foi uma provocação, como no caso de Lucas Lima, mas sim por "perda de tempo excessivo na comemoração de um gol", conforme indicou em súmula o árbitro Péricles Bassols Cortez.
Os atletas se queixam da falta de comunicação da CBF. Segundo os clubes, a entidade em nenhum momento informou que comemorações teriam limite de tempo e que coreografias seriam passíveis de sanção. Os critérios utilizados pelos juízes são de interpretação de uma regra específica. O manual da entidade diz que "as comemorações não podem ser excessivas; as coreografias não devem ser estimuladas e não podem causar perda de tempo excessivo".
Porém, no gol do são-paulino Reinaldo, por exemplo, na partida diante do Corinthians no sábado passado, não houve advertência do árbitro Marcelo de Lima Henrique. Na comemoração, ele e alguns jogadores simularam gestos como se estivessem empinando uma pipa.
— A explicação desse cartão amarelo é subjetiva em alguns casos e objetiva em outros. Ela é objetiva quando fala que não pode tirar a camisa, colocar na cabeça e subir no alambrado, por exemplo. Agora, a questão do retardamento é muito subjetiva porque ela não tem um tempo pré-determinado. O que o jogador não pode é se exceder na comemoração a ponto de retardar o início do jogo. É aí que eu acho que os árbitros estão dando uma exagerada — analisou Leonardo Gaciba, comentarista de arbitragem da Rede Globo.
A posição da CBF é de que o clube e os atletas devem ter conhecimento da regra. Para o presidente da Comissão Nacional de Arbitragem da entidade, Marcos Marinho, os árbitros precisam fazer valer a lei do jogo dentro de um bom senso.
— Não podemos estimular certas coisas. É tudo muito bonito, mas leva 20 segundos. Daí o outro time faz gol e leva 30 segundos. E por aí vai. Vai chegar uma hora que vai levar um minuto comemorando. Isso trabalha contra o espetáculo e pode gerar confusões no campo. O árbitro sente o clima do jogo e a partir disso toma uma decisão. Então, se tá no texto é por que tem uma razão — ressaltou.
Com a parada para a realização da Copa do Mundo, o torcedor brasileiro deparou com uma discrepância na maneira com que os árbitros conduzem as comemorações de gols. As invasões de jogadores reservas para abraçarem os colegas no gramado, por exemplo, é relevada pela Fifa. Mas pela CBF, não. Na Rússia, danças e tempo excessivo também não foram motivos para a aplicação do cartão.
— Eu não vi tanta perda de tempo na Copa, em relação a comemoração. Aqui nós orientamos a respeito da invasão de campo pelo excesso que estava tendo. Isso prejudica o jogo, pode criar situações diferentes na partida — explicou Marinho.
— Uma das cenas marcantes da Copa foi a do Tite rolando fora da área técnica porque saiu correndo para comemorar. Eu não entendo por que essa decisão da CBF (da invasão dos reservas). O único problema é a questão do excesso, e aí os árbitros têm de criar um critério — ressaltou Gaciba.
A CBF negou que tenha orientado os árbitros do Brasileirão a agirem com mais rigor, mas não condenou as atitudes dos juízes nos casos relatados. Segundo Marinho, certas medidas são adotadas para o futebol não virar "bagunça".
— Algumas coisas a gente tem que colocar regramento, senão vira bagunça. Queremos preservar o espetáculo, colocar uma certa ordem nas coisas. Porque quando você começa a abrir muitas exceções pode dar problema — afirmou.
Nas redes sociais, a hashtag #deixacomemorar começou a ganhar força. Jornalistas, torcedores e até mesmo atletas clamam para que o futebol volte a sua "essência". O próprio Moisés a utilizou para falar de seu gol em publicação no Twitter no dia seguinte à partida. Nele, o jogador brinca e diz que, se a torcida abrir o mar verde, ele toma outro amarelo sem problemas.
— Nunca vai se conseguir escrever em uma regra do jogo todas as situações que acontecem. Mas acredito que, diante dessa repercussão, o árbitros vão pegar mais leve — concluiu Gaciba.