A casa da professora aposentada Eunice da Silva Pereira Nicolau, de 53 anos, no município de Xangri-lá, no Litoral Norte, é ponto de encontro para muitas reuniões familiares. Algumas delas poderiam até ser confundidas com um conselho de classe. Isso porque a família Silva Pereira tem nada menos do que 10 professoras, todas vivendo no Litoral — o número aumenta para 11, com uma prima que mora no Vale do Sinos. Elas atuam nos anos iniciais e na Educação Infantil da região.
A história da família das “profes” tem início justamente com Eunice, que começou a dar aulas em uma escola municipal de Xangri-lá em 1991. Atuando como alfabetizadora, ela foi a responsável por ensinar os primeiros passos da escrita e da leitura a centenas de crianças. Entre os estudantes, estavam os irmãos, as irmãs, os sobrinhos e até os filhos. Os alunos da família relatam que ela era rigorosa — versão confirmada pela própria Eunice.
— Quando tem um familiar na sala de aula, cobramos um pouco mais dele ou dela, justamente para evitar que os demais pensem que estamos facilitando. Meus filhos odiavam, mas foi bem tranquilo — explica ela, que está aposentada desde o ano passado.
O rigor maior com os alunos da família resultou em admiração. Foi a partir das aulas de Eunice que suas irmãs gêmeas Elisandra Silva Pereira Vieira e Elisângela Silva Pereira, de 35 anos, também decidiram pela carreira no magistério. As duas se formaram em 2008 e, desde então, também atuam na rede municipal de ensino.
Para Elisandra, a profissão trouxe um presente. Atuando na Escola Municipal de Ensino Fundamental Iglesias Minosso Ribeiro, em Capão da Canoa, a professora conheceu uma aluna especial, que veio a ser, neste ano, sua filha. Elisandra e o marido estavam na fila para adoção e o destino trouxe a pequena Ana, de nove anos, para o casal.
— Eu conheci a Ana quando entrei na escola. Ela estava na Casa Lar e logo de cara ficou muito apegada a mim. Nossa relação foi ficando mais próxima e, então, eu e o meu marido decidimos trocar o perfil que tínhamos estabelecido para adoção para que pudéssemos adotá-la — relata Elisandra.
Mais professoras foram chegando
Atuando em profissões diferentes, dois irmãos de Eunice, Elisandra e Elisângela encontram uma forma de contribuir para aumento da categoria na família. Gilberto da Silva Pereira, de 47, e Jair da Silva Pereira, de 52, casaram, respectivamente, com as professoras Marilene Borges Pereira, 46 anos, e Cristiane Réus Pereira, também com 46.
Marilene conta que escolheu a profissão motivada pelo trabalho feito por sua irmã e pela cunhada Eunice. Ela deixou de atuar como técnica em contabilidade e encontrou no ato de ensinar os pequenos o seu verdadeiro dom.
Já Cristiane afirma que escolha pelo magistério foi inicialmente para ajudar o filho, que é autista, e enfrentava dificuldades na escola. Porém, o amor pela profissão falou mais alto e ela seguiu na carreira.
O grupo das professoras conta ainda com as primas Luciana Machado da Silva de Azevedo, 42 anos, Ana Carolina da Silva, 30, Ivana da Silva Caciano, 29, Thainá Alves Magnus, 27 – que lecionam nos municípios de Capão da Canoa e Xangri-lá – e Viviane da Silva Cristiano Martins, 43, que trabalha em Novo Hamburgo, no Vale do Sinos.
A família das “profes” conta ainda com a tia das irmãs Eunice, Elisandra e Elisângela. Aos 60 anos e com os filhos já fora de casa, Clemencia Matos da Silva Serra decidiu que era hora de se juntar ao grupo. Junto com as sobrinhas Ivana e Ana Carolina, celebrou sua formatura em 2017.
De acordo com Clemencia, a experiência como mãe ajuda bastante para fazer a conexão com os alunos.
— Antes de me formar, eu ficava em casa, cuidando dos filhos. Com eles, aprendi a perceber as vontades e as manhas. Agora, por exemplo, quando servimos a merenda, alguns ficam um pouco mais dengosos para comer determinado alimento e eu tento ajudar, trazer uma comidinha que eles gostam — revela ela, aos risos.
Grupo de apoio
Para dividir as dúvidas e a rotina das aulas, as professoras criaram um grupo no WhatsApp e, antes da pandemia, realizavam reuniões para conversar sobre a profissão. De forma unânime, elas afirmam que a união é um diferencial para o crescimento de cada uma.
— A nossa relação ajuda muito no dia a dia. Tem um problema com um aluno, pedimos a opinião das outras sobre como fazer. Uma aula que não despertou o interesse da turma, vemos como as outras fizeram. É muito importante ter elas — avalia Cristiane.
Como uma das professoras “caçulas” da família, Clemencia revela que também não cansa de pedir ajuda quando precisa.
— Eu procuro muito elas. Na pandemia então, coitadas! Com necessidade de fazer os vídeos, eu pedia socorro e elas me ajudavam, e ajudam, muito — afirma.
— Nós fazíamos os materiais e mandávamos para as demais, para testar se funcionava ou se tinha ficado bom — completa a sobrinha Elisângela.
As 11 professoras atuam em escolas da rede pública e privada. E, mesmo já em grande número, elas aguardam por mais membros da família que queriam seguir o legado da educação.