A retomada das aulas presenciais no Rio Grande do Sul, anunciada pelo Palácio Piratini para ocorrer a partir da próxima terça-feira (8) e começando pela Educação Infantil, provoca reações de contrariedade e alertas sobre os riscos à saúde. O retorno não será obrigatório e só ocorrerá em regiões com bandeira amarela ou laranja no modelo de distanciamento controlado.
Um dos principais questionamentos é sobre a razão pela qual o calendário se inicia pelas crianças menores, que não compreendem as restrições impostas pela prevenção ao coronavírus. Entre administradores de creches e escolas infantis, a avaliação é de que é pouco provável que as instituições funcionem na próxima semana. Mas também há quem defenda a reabertura, como o grupo que protestou em ruas da Capital na terça-feira.
A explicação do governador Eduardo Leite é de que, com a abertura da economia, a liberação de algumas atividades e do comércio, surge a necessidade de os pais terem onde deixar seus filhos. Além disso, diz, nessa faixa etária o ensino remoto é muito difícil. Também seria uma forma de garantir que as crianças tenham onde ficar com protocolos de segurança adequados.
A medida é criticada por entidades de professores e também vista com ressalvas pelos prefeitos. Também é questionada por especialistas da área de educação. Marcia Andrea Schmidt da Silva, diretora do Colégio Leonardo Da Vinci e professora da Escola de Humanidades da PUCRS, critica a falta de planejamento para a adaptação de crianças abaixo de cinco anos ao ambiente escolar após ficarem cinco meses e meio com os pais. Além disso, vê dificuldades em se garantir o distanciamento e o uso de máscaras entre os pequenos.
— É meio sem sentido começar pela educação infantil. Como você faz o afastamento de crianças na escola? Elas se abraçam, tocam nas máscaras. Isso é arriscado não apenas para elas, mas para professores e familiares que convivem com os pequenos. Então mesmo as escolas estando com o aparato de proteção, não quer dizer que o retorno da educação infantil seja a melhor alternativa pedagógica, afetiva ou sanitária — afirma.
Para infectologistas, o Rio Grande do Sul não apresenta condições de voltar às aulas presenciais porque o vírus ainda está com alta circulação nas regiões. Alexandre Zavascki, chefe do Serviço de Infectologia do Hospital Moinhos de Vento e professor da Faculdade de Medicina da UFRGS, destaca que o retorno de crianças, adolescentes e jovens às salas de aula representaria uma situação epidemiológica sem equivalentes em outros países.
O infectologista Alexandre Vargas Schwarzbold, presidente da Sociedade Riograndense de Infectologia e professor da UFSM, avalia que um modelo que contemplasse as necessidades de populações mais vulneráveis poderia ser o mais adequado para que seus pais conseguissem retomar suas atividades profissionais, mas expressa temor quanto ao possível impacto em novas contaminações:
— Isso vai fazer também com que a população traduza isso como “bom, vou poder trabalhar, as crianças já estão na escola”. Podemos voltar a ter picos epidêmicos por conta desse movimento ao redor dos alunos.
Um estudo recente feito em hospitais afiliados da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, mostrou que as crianças, apesar de apresentarem poucos ou até mesmo nenhum sintoma de covid-19, têm alta carga viral, o que aumenta a transmissibilidade do coronavírus. Ou seja, o ambiente escolar poderia se transformar em agente de disseminação do vírus.
A volta às aulas em outros Estados
A maioria dos Estados ainda não definiu calendário para volta às aulas presenciais — apenas o Amazonas já está em atividade novamente, desde 10 de agosto.
Em São Paulo, o cronograma previsto pelo governo estadual prevê retorno a partir de 7 de outubro, para todos os níveis, da Educação Infantil ao Ensino Superior. No entanto, as escolas poderão reabrir para recuperação e atividades de acolhimento de alunos, de forma opcional, a partir da próxima terça-feira para auxiliar pais que tenham voltado a trabalhar presencialmente. Há algumas limitações, como receber até 35% da sua capacidade para alunos da Educação Infantil e Fundamental e nos anos iniciais e até 20% no Ensino Médio e anos finais.
Já em Santa Catarina, com retorno previsto para 13 de outubro se as condições sanitárias permitirem, a retomada começará pela ponta inversa em relação ao definido pelo Rio Grande do Sul: inicia-se pelos alunos do último ano do Ensino Médio. No Rio de Janeiro, a previsão é voltar em 5 de outubro a começar pelos estudantes do 9º ano do Ensino Fundamental e do 3º ano do Ensino Médio.