O Senado aprovou na terça-feira (25) a emenda constitucional 108/2020, que torna o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) permanente. O economista Caio Callegari, mestre em Administração Pública e Governo, atua como coordenador de Produção Técnica do movimento Todos pela Educação, uma das organizações mais prestigiadas na defesa do tema no país. Confira respostas do especialista para esclarecer algumas das principais dúvidas sobre a emenda do Fundeb, promulgada nesta quarta-feira (26).
O que é o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb)?
O Fundeb é o principal instrumento de financiamento das escolas públicas de Educação Básica (que compreende da Educação Infantil até o Ensino Médio) do Brasil. É composto por 27 fundos estaduais, que recebem impostos já vinculados à educação nos Estados e nos municípios e os distribuem pela soma de matrículas que cada rede (municipal e estadual) tem. No Rio Grande do Sul, por exemplo, o Fundeb reparte, por ano, cerca de R$ 10 bilhões entre todas as matrículas da Educação Básica pública.
Ou seja, trata-se de um fundo redistributivo. Cada Estado recebe recursos de acordo com a possibilidade de financiamento e a capacidade econômica de cada localidade. O governo estadual reúne o dinheiro dos municípios e o distribui conforme a necessidade das redes de ensino, que repassam o dinheiro para as escolas.
Ao prever recursos de acordo com o número de matrículas, o Fundeb tem o objetivo de reduzir as desigualdades nos Estados e no país. Também contribui para a melhoria da gestão educacional — o município sabe que, mantendo as matrículas que tem agora, terá o mesmo montante no ano seguinte, e isso ajuda os gestores públicos a melhorar sua atuação.
É um fundo de natureza contábil. Não é um fundo existente, não é uma conta bancária, mas, sim, um fluxo. Trata-se de um sistema que redistribui recursos. O dinheiro não fica parado em uma conta.
Para que a verba é usada?
No mínimo, 60% do dinheiro tem que ser utilizado para remunerar os professores na ativa (não aposentados), melhorando o piso ou avançando nas progressões da carreira. O Fundeb deve ser empregado em ações típicas de manutenção e desenvolvimento do ensino (MDE) — são gastos com professores, salários de outros profissionais, reformas na escola, transporte escolar. O que não está incluído em MDE: aposentadorias, obras na frente da escola (uma restauração no calçamento, por exemplo). Também não estão previstos gastos para serviços odontológicos e hospitalares.
O que muda com a nova emenda à Constituição?
O Fundeb passa a ser permanente, sem prazo para acabar (até então, a vigência estipulada era até 31 de dezembro de 2020). Isso garante uma previsibilidade de recursos. A complementação por parte da União passa dos atuais 10% (cerca de R$ 15 bilhões ou R$ 16 bilhões) para 23% até 2026 (quando chegará a R$ 36 bilhões). Está mudando a forma como esse dinheiro será distribuído. Hoje, os recursos da União vão para os Estados mais pobres do país. Com o novo desenho, a partir de 2021, os recursos passarão a ser destinados para os municípios mais pobres do Brasil como um todo, independentemente do Estado onde estejam. A complementação atualmente considera os recursos do Fundeb — os Estados que têm menos recursos ganham mais da União.
Além das regras atuais, as matrículas que são consideradas para a distribuição dos recursos começarão a ser observadas com uma ponderação, de acordo com o nível socioeconômico. A matrícula da criança mais pobre significará mais verba para os municípios. Esta é uma grande inovação, existente em pouquíssimos países, e funciona como um mecanismo de incentivo.
Outro ponto diz respeito à regra de uso. Hoje são, no mínimo, 60% dos recursos para professores na ativa. Essa porção passa a ser de 70% para profissionais da educação (vigilante, bibliotecário, secretária, porteiro).
Por que o aumento do aporte de dinheiro por parte do governo é importante para a educação brasileira?
No Brasil, 46% dos municípios estão em uma faixa de subfinanciamento crítico — é uma situação na qual, mesmo que se tenha boa gestão dos recursos, é raro alcançar resultados educacionais satisfatórios por haver poucos recursos. O aumento da complementação, somado à nova regra de distribuição, possibilitará que todos saiam dessa zona de subfinanciamento crítico.
Fonte: Caio Callegari, economista, mestre em Administração Pública e Governo, coordenador de Produção Técnica do Todos pela Educação