Algumas das principais empresas localizadas no Rio Grande do Sul vêm ganhando projeção nacional e internacional, nos últimos anos, por iniciativas relacionadas à sigla ESG, que expressa a busca de padrões de excelência em termos ambientais, sociais e de governança corporativa (do inglês Environmental, Social e Governance).
Além da conquista de posições de destaque em rankings empresariais, a crescente busca por padrões elevados de atuação garante melhores condições para disputar mercados cada vez mais exigentes em relação à procedência dos produtos e até acesso a financiamentos mais vantajosos. Além, é claro, da disposição em adotar medidas pelo simples fato de ser a coisa certa a fazer.
Uma das principais empresas do agronegócio nacional, por exemplo, a SLC Agrícola coleciona certificados de boas práticas na produção de soja, milho e algodão. No setor de varejo, a Lojas Renner figura em uma lista mundial em que mais de 23 mil companhias tentam marcar presença, mas apenas pouco mais de 300 conseguem. Já o Grupo CMPC, que tem uma unidade de produção de celulose em Guaíba, é líder de um ranking global de sustentabilidade no segmento florestal (veja detalhes nos textos de cada empresa).
Esse desempenho é motivado, entre outras razões, por uma crescente demanda da sociedade por práticas mais comprometidas com o bem comum — mas também reverte em benefício das próprias corporações.
— As empresas estão sendo demandadas, até por uma questão de amadurecimento da sociedade, para desenvolver projetos sustentáveis. Hoje não há mais espaço para projetos poluentes. Seria impensável, por exemplo, uma nova indústria movida a carvão. Nem se financiaria isso. Existe uma demanda por parte da sociedade, dos clientes, do agro, de que sejam ambientalmente sustentáveis — avalia o diretor de Planejamento do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE), Leonardo Busatto.
Busatto explica que, atualmente, grande parte do recurso de bancos públicos vem de repasses de outras instituições que, muitas vezes, impõem critérios de sustentabilidade para a concessão de crédito. A vantagem é que quem se enquadra pode contar com taxas de juros e prazos mais favoráveis.
— Grande parte do nosso recurso vem de repasses de outros bancos do país, como o BNDES, e de instituições multilaterais como Banco Mundial, BID, Agência Francesa de Desenvolvimento, Banco Europeu, Banco de Desenvolvimento da América Latina... Eles só financiam projetos que não causem prejuízo ao meio ambiente. Quase 25% dos financiamentos que temos hoje para esses projetos são de recursos desses bancos, que têm condições mais baratas e prazos mais longos. Estamos falando de até 25 anos, com uma taxa de juros que pode ficar em 8%, 9% ao ano contra taxas, incluindo Selic e o spread bancário, de até 15% — compara o diretor do BRDE, ressaltando que esse é apenas um exemplo, e que cada negociação é diferente de outra.
Apesar das vantagens práticas e mais recentes de se abraçar ações de ESG, o presidente da Randoncorp, Daniel Randon, observa que a preocupação com sustentabilidade já fazia parte do DNA de muitas grandes marcas gaúchas.
— No caso da Randon, que tem 75 anos de história, ESG é na verdade algo contínuo, que sempre esteve presente na preocupação com questões sociais. A pandemia apenas acelerou, no mundo todo, a necessidade de as empresas terem um propósito claro e de trabalharem governança, ambiente e a parte social com a comunidade, com clientes e acionistas — afirma Randon.
Veja, a seguir, como algumas das maiores empresas localizadas no Rio Grande do Sul vêm apostando em ações de ESG e como se beneficiam da implantação de práticas favoráveis a toda a sociedade.
CMPC aposta na modernização industrial
A unidade de produção de celulose da CMPC localizada em Guaíba, na Região Metropolitana, recebeu um investimento bilionário destinado a melhorar a eficiência e o cumprimento de metas de sustentabilidade ao longo dos últimos dois anos. Uma soma de R$ 2,75 bilhões foi destinada ao projeto chamado BioCMPC, que, segundo informações da direção da empresa, no momento se encontra "em fase de testes finais".
A iniciativa tem como objetivo aumentar a performance da unidade industrial em 18%, o que representa um acréscimo de cerca de 350 mil toneladas de celulose ao ano, de acordo com padrões mais rigorosos de sustentabilidade. O aporte vai garantir nove ações relacionadas à implantação de novos equipamentos de controle ambiental e ajuste de potência de sistemas já existentes, oito novas intervenções voltadas à gestão ambiental e 14 de modernização operacional.
Isso significa, por exemplo, que o sistema de coleta de gases ficará mais eficaz, e uma caldeira a carvão (material considerado mais poluente) deixará de funcionar. Atualmente, a empresa já recicla todos os resíduos sólidos produzidos na operação industrial, e utiliza barcaças para transportar madeira e celulose - o que evita 100 mil viagens de caminhão ao ano, reduzindo a emissão de gases do efeito estufa.
Líder do ranking de Sustentabilidade Corporativa da S&P Global Sustainability de 2024 no segmento florestal, o grupo chileno CMPC tem ainda como meta reduzir em 50% as emissões de gases nocivos até 2030, além de diminuir em 25% o uso de água nos processos industriais e ser uma companhia com zero resíduo em aterros sanitários até o ano que vem.
SLC Agrícola adota "desmatamento zero"
Uma das maiores produtoras de soja, milho e algodão do país, a SLC Agrícola vem assumindo compromissos públicos, nos últimos anos, destinados a garantir a preservação ambiental - um dos pilares do conceito de ESG.
Um desses compromissos, anunciado em 2020 e em vigor desde então, é a decisão de não expandir as áreas de plantio sobre zonas de vegetação nativa - mesmo quando há possibilidade legal. Em vez disso, a empresa gaúcha responsável por propriedades que somam 674 mil hectares aposta no uso das chamadas áreas "maduras", ou já utilizadas previamente para produção.
— Com isso, estamos alinhados ao combate ao aquecimento global e à política europeia de redução das emissões (de carbono) e de zero desmatamento nos sete Estados onde produzimos (o Rio Grande do Sul não está entre eles, embora a sede esteja localizada em solo gaúcho) — afirma o diretor de RH e Sustentabilidade, Álvaro Dilli.
Para formalizar essa postura, a SLC vem acumulando certificados de boas práticas. Entre eles, está o da Associação Internacional de Soja Responsável (conhecido pela sigla RTRS), que abrange cerca de 70% desse tipo de cultivo. As safras de milho e de algodão, mais recentemente, também receberam homologações equivalentes.
— Somos a maior empresa das Américas implementando o conceito de agricultura regenerativa, com quase 36 mil hectares aplicando melhores práticas com foco em saúde do solo e bem-estar das pessoas — complementa Dilli.
A empresa definiu publicamente metas de neutralizar as emissões de carbono até 2030 nos setores de operações e energia.
Randoncorp mantém cinco compromissos públicos
Gigante gaúcha do setor de transportes, a Randoncorp (responsável por marcas como Randon, Frasle e Suspensys) selecionou um conjunto de metas prioritárias a serem adotadas a fim de garantir, na prática, a adequação aos critérios ambientais, sociais e de governança.
Chamada de Ambições ESG, a lista adotada em 2021 envolve desde a busca de maior equilíbrio entre homens e mulheres em cargos de liderança ao esforço para zerar a ocorrência de acidentes graves de trabalho. Veja os itens:
- Duplicar o número de mulheres em cargos de liderança até 2025;
- Zerar acidentes graves;
- Reduzir 40% da emissão de gases de efeito estufa até 2030;
- Zerar a disposição de resíduos em aterro industrial e reutilizar 100% do efluente tratado até 2025;
- Ampliar a receita líquida anual gerada por novos produtos.
Para alcançar esses objetivos, a companhia realiza uma série de ações - que incluem a adesão ao Pacto Global da ONU (iniciativa que procura mobilizar a comunidade empresarial para o desenvolvimento sustentável).
— A Randon tem usado o ESG como uma oportunidade de engajar os nossos 16 mil protagonistas (colaboradores) e de pensar em projetos disruptivos. Quando falamos em melhorar o ambiente, conseguimos lançar vários projetos como o nosso eixo regenerativo elétrico, que garante uma economia de até 25% de combustível na rota — afirma o presidente da Randoncorp, Daniel Randon.
Foco da Marcopolo é a descarbonização veicular
Uma das principais empresas do país vinculada à área de mobilidade, a Marcopolo estabeleceu como foco a busca por emissões cada vez menores de carbono na fabricação e no uso dos ônibus. Um dos resultados desse esforço é o desenvolvimento do chamado Attivi Integral, veículo com chassi e carroceria próprios destinado a atender a demanda por ônibus elétricos.
— O Attivi foi desenvolvido no Brasil e conta, predominantemente, com fornecedores nacionais, inclusive componentes eletroeletrônicos, o que valoriza e contribui com o desenvolvimento da indústria brasileira — afirma o CEO da Marcopolo, André Armaganijan.
A população de Porto Alegre deverá conhecer de perto o resultado desse trabalho, já que a Capital é uma das cidades que adquiriram unidades do ônibus elétrico previsto para circular a partir de abril.
— A chegada desse modelo à capital gaúcha é um marco na história da companhia — celebra Armaganijan.
Outras iniciativas envolvem projetos inovadores como o desenvolvimento de veículos movidos a células de hidrogênio, com um veículo já em circulação na USP, em São Paulo, e outras unidades que vão entrar em operação na Austrália. O uso do grafeno, mais resistente que o aço, mais fino e flexível, é outra frente de pesquisa. O uso de energia renovável já garantiu, segundo a empresa, uma redução na emissão de gases do efeito estufa equivalente ao plantio de 1,8 milhão de árvores entre 2013 e 2023.
Renner investe em modelo inovador de loja
Pelo terceiro ano seguido, em 2023 a Lojas Renner foi a empresa de moda com a melhor posição mundial no Dow Jones Sustainability Index (DJSI), um índice que procura avaliar a sustentabilidade corporativa e é considerado referência global nessa área.
Além disso, foi a única varejista do Brasil a fazer parte da chamada "A-List" elaborada pelo Carbon Disclosure Project (CDP), lista que configura uma espécie de "Oscar" da sustentabilidade e reúne bons exemplos de todos os lugares do planeta.
Em 2023, mais de 23 mil empresas tentaram marcar presença nesse tapete vermelho do ESG, mas apenas 336 conseguiram - entre as quais 11 são brasileiras. Uma das ações que garantiram essa colocação à empresa gaúcha é o investimento em um novo modelo de loja.
— Hoje temos um modelo inovador de loja, projetado pensando na sustentabilidade. Com foco na ecoeficiência e na máxima redução dos impactos ambientais da obra à operação, o modelo aplica conceitos como reutilização de materiais ao fim da vida útil, diminuindo a geração de resíduos, manutenção de espaços verdes com plantas e elementos naturais, menor consumo de energia, economia de água e redução de emissões de CO² — afirma a diretora de Gente e Sustentabilidade da Renner S.A, Regina Durante.
Desde 2023, todas as lojas inauguradas e reformadas pela Renner seguem esse padrão. No Estado, o modelo está presente nas unidades do shopping Iguatemi, em Porto Alegre, e nas cidades de Taquara, Canela e Montenegro.
O que é ESG na prática
- Sigla em inglês para Environmental, Social and Governance (Governança Corporativa, Ambiental e Social), o termo ganhou o mundo corporativo nos últimos anos.
- Na prática, representa um conjunto de diretrizes utilizadas para orientar empresas e investimentos em ações de impacto na sociedade e no meio ambiente.
- A adoção de práticas ESG se tornou um diferencial para as companhias. Elas demonstram o compromisso das empresas com a sustentabilidade, com o desenvolvimento responsável e a transparência das suas ações.
- Além das diretrizes relacionadas à questão ambiental, o conceito inclui ações de governança das empresas, como os compromissos com a diversidade nas equipes e a geração de valor na sociedade.