Após o governo federal recuar da decisão de taxar as compras internacionais entre pessoas físicas de até US$ 50, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou na quarta-feira (19) que o Executivo pretende solucionar a questão da taxação do e-commerce seguindo o exemplo de países desenvolvidos, com a implantação de um “digital tax” (imposto digital).
O ministro também disse que a alternativa atende à sinalização do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que pediu uma solução administrativa negociada com o comércio eletrônico.
— Quando o consumidor comprar, ele estará desonerado de qualquer recolhimento de tributo. Será feito pela empresa sem repassar nenhum custo adicional — declarou Haddad.
Ele não deu mais detalhes sobre a proposta. A ideia não seria criar um novo tributo, mas intensificar a cobrança “na fonte”, ou seja, antes do despacho das mercadorias. Questionado sobre garantias de que não haverá repasse de custo ao consumidor, Haddad afirmou que é “compromisso deles”, em referência às empresas que aderiram ao plano de conformidade da Receita Federal.
A declaração foi dada após reunião do ministro com representantes da varejista chinesa Shein, em São Paulo. Na ocasião, a marca de e-commerce divulgou que fará investimentos de cerca de R$ 750 milhões para gerar até 100 mil empregos diretos e indiretos no Brasil nos próximos três anos. A intenção é estabelecer uma parceria com fabricantes nacionais para nacionalizar parte da produção.
Haddad chegou a dizer em entrevista, antes do anúncio oficial da Shein, que a empresa pode nacionalizar 85% de suas vendas em quatro anos.
A Shein ainda afirmou que passará a hospedar vendedores locais em sua plataforma, transformando o site em um marketplace no país, algo que vinha, segundo a empresa, sendo testado desde 2022. Em nota, a varejista afirmou que o onshoring (produção no mercado onde o bem será consumido) da manufatura “também contribuirá para a competitividade geral da indústria têxtil com o potencial de aumentar as exportações”.
Segundo Haddad, a Shopee já havia endereçado uma carta ao governo afirmando que também irá aderir ao plano de conformidade. A mesma sinalização foi dada pela AliExpress, que se reuniu com o secretário-executivo da Fazenda, Gabriel Galípolo.
Haddad ponderou que ainda há etapas a cumprir e que, se necessário, podem ocorrer gradações das medidas para incorporar essas transações para dentro da ordem legal tributária brasileira, mas que o princípio do plano é garantir justiça:
— Nós queremos investimentos estrangeiros, nós apreciamos o comércio eletrônico, nada contra, mas queremos condições competitivas para que nós não prejudiquemos empregos no Brasil, as lojas do varejo brasileiro, nós queremos que as pessoas tenham as mesmas condições.
Críticas
O recuo do governo em relação à taxação das encomendas internacionais gerou críticas de entidades do setor varejista. Segundo elas, a decisão manterá uma situação de concorrência desleal entre as empresas brasileiras e estrangeiras, em especial as chinesas.
Para Mauro Francis, presidente da Associação Brasileira dos Lojistas Satélites (Ablos), a decisão do governo é “lamentável” e pode gerar uma onda de desemprego no setor. Isso porque o impacto que as vendas de produtos internacionais sem taxação têm é expressivo e envolve desde pequenas empresas até grandes varejistas.
— Na hora que o governo recua, o que eu espero é que ele cumpra com a legislação em vigor, onde produtos que são adquiridos, que não sejam de pessoas físicas, sejam tributados. Como eles vão fazer isso, eu não sei — afirmou Francis.
Para o diretor-executivo da Associação Brasileira do Varejo Têxtil (Abvtex), Edmundo Lima, a entidade sempre buscou a aplicação da legislação já vigente no país.
— A gente está colocando em risco todo o parque industrial brasileiro de produção de vestuário e calçado – alegou, citando que a situação pode aumentar o nível de desemprego.