Depois de enfrentar um ano repleto de fatores de estresse no mercado (inflação mundial, covid-19, guerra da Ucrânia e eleições nacionais) o dólar encerrou 2022 cotado a R$ 5,28 – uma redução de 5,20% na comparação com o dia 31 de dezembro de 2021: R$ 5,57. O período demarcou também o maior saldo de entrada da moeda norte-americana no país, desde 2015, com ingressos que superaram em US$ 9,5 bilhões as retiradas e equivalem a um crescimento de 55,7% sobre os US$ 6,1 bilhões registrados no exercício anterior.
Para 2023, os atos antidemocráticos em Brasília no domingo (8) acrescentam componente extra às incertezas, mas, na avaliação de analistas consultados por GZH, não devem comprometer uma série de expectativas que já pairam no horizonte dos investidores. Alison Correia, CEO da Top Gain anota que volumes elevados de dólares na economia ajudam a valorizar o real e a reduzir a precificação local da moeda estrangeira.
Trata-se, portanto, de um movimento positivo, por exemplo: para quem pretende viajar ao exterior, para o preço e a inflação interna dos alimentos (transacionados com o referencial do dinheiro dos Estados Unidos) e também para os investidores. Nesse aspecto, Correia lembra que o governo de Jair Bolsonaro trouxe “enorme ruptura” com grandes gestores estrangeiros, associações e fundos soberanos internacionais da área socioambiental, que contam com recursos carimbados para mercados emergentes, caso do Brasil, em especial aqueles com potencial socioambiental.
É a chamada economia verde, catapultada recentemente pela onda “ESG”. Na sopa de letrinhas O "E" é o meio ambiente (environment, na sigla em inglês), o "S" representa a preocupação social e o "G", as diretrizes de governança coorporativa. Para se ter uma ideia, a iniciativa Asset Zero, lançada em 2020, reúne cerca de 70 dos maiores fundo de investimentos globais com US$ 32 trilhões em mãos, destinados a financiar a transição energética até 2050.
Esses valores – que andaram afastados do mercado nacional por opções do governo Bolsonaro, diz Correia – agora, na nova gestão de Lula encontram os caminhos sinalizados para tornarem a brotar na bolsa brasileira. No momento, sem critérios mínimos de ESG, é impossível atraí-los.
— São gestores gringos que têm metas ESG, ou seja, precisam colocar essa grana, que vem de doações e iniciativas específicas em ativos com essas características, caso contrário não vão alocar em outro local. Existe um "quase desespero" por esse tipo de investimento e o Brasil volta de vez ao jogo — comenta o CEO da Top Gain, ao projetar um dólar abaixo de R$ 4,90 na virada do primeiro trimestre, abaixo da chamada barreira psicológica de R$ 5.
Potencial na bolsa
Moisés dos Santos Jardim, sócio da Fundamenta Investimentos, coloca em números o potencial. Explica que a B3 (bolsa de valores) tem um índice que consolida as empresas negociadas com essas características. É o chamado ISE (Índice de Sustentabilidade Empresarial) e boa parte delas, no momento, com preços bastante atrativos, comenta.
Na comparação: em 2022, eram 46 ações de companhias nacionais de 27 setores registradas. Juntas, correspondiam a R$ 1,74 trilhão, valor equivalente a 38,26% do total de mercado atingido pelas empresas listadas na B3. Neste ano já são 70 ações (alta superior a 52%), que respondem por R$ 2,28 trilhões (um terço de elevação), o que significa 54,2% (ou seja, mais da metade) do total da B3, com perspectivas reais de incremento nesses indicadores.
Juro deve ditar as regras cambiais em 2023
Eduardo Tellechea Cairoli, CEO da Privatto, acrescenta que o fundamento que deverá ditar as regras cambiais daqui para frente é o juro. Atualmente, fixada em 13,75% ao ano, a taxa Selic deverá permanecer no patamar de dois dígitos até o final do ano, para controlar a inflação, associada ao ambiente externo, mas também a elevação de gastos públicos promovida no início do mandato presidencial, argumenta.
No contexto, Cairoli lembra que o real obteve em 2022 o melhor despenho na variação ante o dólar em ranking que considera países de economia similar à nacional, com 7,39% ao ano. Ficou mais de dois pontos percentuais acima do segundo colocado: o peso mexicano (5,34%). Nesse aspecto, a inflação e a consequente alteração dos níveis de juros nos Estados Unidos e na Europa serão os balizadores extremos:
— Ainda somos, entre os emergentes, o melhor investimento. O país saiu de uma taxa de juro, que deverá permanecer elevada por mais um tempo, muito baixa em 2020 para 13,75%. Nos Estados Unidos a estimativa é de que também siga alta com um terço do mundo entrando em processo de recessão. Pela primeira vez, desde que exerço a atividade, a inflação brasileira foi menor do que a norte-americana. Significa que fizemos a lição de casa e, na medida em que as principais economias desaceleram, deverá abrir-se o espaço para uma redução de juro em algum momento.