No quarto trimestre de 2020, período mais recente com dados disponíveis, a massa salarial encolheu 11,8% no Rio Grande do Sul, em relação a igual intervalo de 2019. GZH consultou o dado, que leva em conta a inflação, na base do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Tecnicamente, o indicador é chamado de massa de rendimento real efetivamente recebido no mês.
Na prática, estima o total de salários que os profissionais ganham com o exercício de atividades formais ou informais. A segunda inclui os populares bicos.
No quarto trimestre de 2020, a massa salarial foi de R$ 13,485 bilhões no Estado. Em igual período de 2019, chegou a R$ 15,293 bilhões. A baixa de 11,8% vem dessa comparação. É como se, no intervalo de um ano, R$ 1,8 bilhão deixassem de ir para o bolso dos trabalhadores gaúchos. Confira alguns exemplos de quem perdeu renda e está na luta para retomar seus ganhos:
Paralisação e aposta em novos projetos
Os negócios da empreendedora Lídia Fraguas, 38 anos, caminhavam sem sobressaltos até março de 2020. Bastou a chegada do coronavírus ao Estado para o cenário mudar.
Com a crise sanitária, Lídia teve de paralisar o estabelecimento que ajudava a administrar na área gastronômica, o Estômago Café Vegano, no bairro Rio Branco, em Porto Alegre. Para complicar a situação, logo no começo da pandemia, parte das instalações elétricas do local foi alvo de furtos em duas ocasiões, relata a empreendedora.
– Estávamos em um ritmo muito acelerado, de domingo a domingo, lotados de suprimentos. O fechamento foi um baque. Não sabíamos bem o que fazer. Trabalhar com delivery não é a mesma coisa – recorda.
O período de crise encolheu o faturamento, e o imóvel teve de ser entregue. Agora, a empreendedora aposta em um novo projeto ao lado da irmã, Júlia, com quem já trabalhava no Estômago. Recentemente, a dupla lançou o Café Angélica, que substitui a primeira marca.
A nova unidade fica no bairro Bom Fim, também na Capital, e tem estrutura mais enxuta. Segundo Lídia, a primeira casa chegou a somar 15 vagas de trabalho diretas e indiretas.
– O Angélica não surgiu pela pandemia. Era um desejo antigo. Vinha sendo adiado, mas, com a queda brusca no Estômago, fizemos essa transição – conta.
Lídia também criou durante a pandemia uma loja online de roupas. A nova marca, chamada D'conchinha, comercializa peças como lingeries e pijamas.
No projeto, conta com o auxílio do marido, Roger, que trabalha com eventos, outra atividade fragilizada pelo coronavírus.
– O ano de pandemia foi muito difícil. Tem dias em que a gente acorda sem motivação, mas é preciso buscá-la, encontrar novos formatos – diz Lídia.
Dados recentes da Abrasel-RS, que representa bares e restaurantes no Estado, ilustram o impacto da covid-19 no setor de gastronomia. De acordo com a entidade, 52% dos negócios fecharam janeiro no vermelho, com pagamentos em atraso no Rio Grande do Sul. A Abrasel-RS afirma ainda que, apenas com o sistema de delivery, "muitos estabelecimentos" faturam entre 25% e 30% do que faturavam com o movimento presencial.
Adaptação e crença na esperança
Em meados de 2019, Jovelina Souza, mais conhecida como Joh Souza, resolveu abrir um negócio próprio. À época, usou anos de experiência como manicure para instalar um salão de beleza, o Sttudio Joh Souza, na Rua dos Andradas, um dos pontos mais movimentados do centro de Porto Alegre. O que ela não esperava era o início da pandemia meses depois.
A crise sanitária logo causou restrições à circulação de pessoas, e o número de clientes murchou. Pressionada pelas despesas, incluindo o aluguel, a manicure decidiu entregar a sala e vender parte dos equipamentos. Levou consigo o "mínimo" para montar um salão menor em um espaço do apartamento onde vive na Capital.
– Estava muito pesado, porque as clientes foram sumindo quando o medo da pandemia tomou conta – lembra Joh, 51 anos.
Apesar das dificuldades, a manicure não abandona o discurso em tom de esperança. Relata aguardar o avanço da vacinação para que as restrições diminuam – a bandeira preta impediu a operação de salões, no Estado, nas últimas semanas. O plano da profissional é seguir atuando no ramo de beleza. De preferência, como funcionária de um estabelecimento.
– Vejo muitas pessoas fechando seus negócios. Sei que a situação está bem complicada para nossa economia. Mas quero ter esperança. Se você não tiver um pensamento bom, vai pirar – afirma. – Acredito que vou continuar na profissão, mas não como empresária. Está sendo muito doloroso. Talvez volte a ser colaboradora de algum salão – acrescenta Joh.
Em Porto Alegre, representantes do setor estimam que um quinto dos estabelecimentos tenha fechado as portas na pandemia, conforme mostrou reportagem de GZH no início deste mês. Em meio aos impactos da covid-19, Joh também aposta em outra habilidade para recompor parte da renda: a de artesã.
Em casa, ela produz peças de amigurumi – técnica japonesa para criação de bonecos de crochê ou tricô. As encomendas são feitas por meio de ferramentas como WhatsApp e Instagram.
– Era algo que fazia esporadicamente, não explorava muito. Quando começou a pandemia, vi que daria para fazer mais – pontua a manicure.
Demissão e busca de oportunidades
Joice Ribeiro da Rosa, 45 anos, enfrenta o desemprego na pandemia. Sua busca por novas oportunidades profissionais começou depois da demissão em maio de 2020. Formada em Pedagogia, a moradora de Porto Alegre trabalhava como assistente comercial, no Centro, até a fase inicial da crise sanitária.
– O trabalho era maravilhoso. Fui demitida durante a pandemia. Pensei: "O que faço agora?". Chorei muito. Pessoas que eram minhas colegas de trabalho sentiram minha falta – relata.
No segundo semestre do ano passado, Joice passou a viver com o namorado. Dentro de casa, busca cortar despesas para encarar o período de dificuldades na economia. Na reta final de 2020, ela até chegou a ocupar uma vaga temporária no ramo farmacêutico. Mas, com o fim do contrato, segue à procura de novas oportunidades.
Na segunda-feira, quando conversou com GZH, Joice havia participado antes de uma entrevista de emprego. Em seu currículo, acumula experiências diversas nas áreas comercial e administrativa. É para algum desses ramos que ela deseja voltar.
– Busco uma empresa em que me sinta bem à vontade.
Comecei a trabalhar com 15 anos. Sempre corri atrás de oportunidades – frisa. – Esperamos que a economia volte a girar. Graças a Deus, tenho um teto sobre a minha cabeça, mas tem muita gente precisando disso – completa.
Rodrigo Attel, 34 anos, também está em busca de emprego na pandemia. Morador de Canoas, na Região Metropolitana, ele já atuou no setor de atacados e supermercados. No final do ano passado, após meses de procura durante a crise sanitária, encontrou uma vaga de operador de caixa, mas o contrato de experiência se encerrou em fevereiro.
Agora, pretende retornar ao trabalho dentro do setor. Mira em vagas disponíveis em Canoas e em municípios vizinhos da Grande Porto Alegre.
Dicas para reagir
Durante o período de dificuldades na economia e na saúde, encontrar opções para preservar as finanças de empresas e o orçamento familiar não é uma tarefa simples.
O educador financeiro Adriano Severo, da Severo Educação Financeira, dá algumas dicas.
- Consumidores e empresas devem ficar atentos aos gastos. É recomendável analisar as despesas com o intuito de cortar aquelas que não são necessárias neste momento
- Cuidado com financiamentos. A sugestão é evitar parcelamentos de médio e longo prazos sem a certeza de que os débitos poderão ser quitados
- Revise contratos. Por exemplo: é possível que inquilinos consigam renegociar o aluguel de imóveis residenciais e comerciais durante a crise
Para quem está em busca de trabalho, a velha dica de buscar qualificação segue em vigor. Atualmente, há opções de cursos gratuitos que podem ser feitos de maneira online. O estudo pode resultar em diferencial na hora de disputar oportunidades