O governo corre contra o tempo para atenuar a tensão que tomou conta do Senado após a aprovação, em primeiro turno, da reforma da Previdência. Integrantes da equipe econômica não temem a rejeição do texto em segundo turno, mas, sim, o preço que será exigido pelo apoio. Parlamentares criticam a articulação do Executivo e cobram acordos. Nesse ambiente, cresce a tendência de atraso na conclusão da análise da matéria, provocando desgaste político ao Palácio do Planalto e ambiente de dúvida no mercado financeiro.
Nos corredores do Congresso, senadores apontam abertamente a segunda quinzena como o período mais provável para a votação, mesmo que o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), ainda sustente ser possível fechar a questão no próximo dia 8. Haveria a possibilidade de apreciação no dia 15. Mas como uma comitiva irá até o Vaticano para a cerimônia de canonização de irmã Dulce pelo papa Francisco, no dia 13, a data ficaria prejudicada.
Vice-líder do governo no Senado, Chico Rodrigues (DEM-RR) minimiza o possível atraso em relação ao cronograma inicial do governo, que apontava a promulgação das novas regras ainda na primeira quinzena do mês:
— Vota no dia 22, 23. Tem que se compreender que não foi possível atender a previsão, mas o governo tem margem de segurança. Tudo tem seu tempo.
Para evitar novas surpresas em plenário — como a aprovação do destaque que manteve as regras atuais para o pagamento do abono salarial, reduzindo a projeção de economia em R$ 76,4 bilhões em 10 anos —, o Planalto vai intensificar a articulação com os senadores. O secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, será o responsável por levantar as demandas e passar para as áreas técnicas e políticas do governo.
O principal ponto de tensão é sobre as regras de divisão dos recursos do megaleilão de petróleo marcado para novembro. O Senado aprovou, em setembro, proposta de emenda à Constituição (PEC) definindo a distribuição dos valores a Estados e municípios. Ao voltar à Câmara, deputados sinalizaram a intenção de alterar critérios da partilha. Para evitar a alteração, senadores pedem que o governo edite medida provisória (MP) fixando as regras definidas por eles.
Nesta quinta-feira (3), após se reunir com o ministro da Economia, Paulo Guedes, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), rechaçou a possibilidade de MP, definida como eventual interferência no Legislativo. Ele afirma que uma saída será construída pelo Congresso, o que reduziria a pressão sobre o Planalto.
— Falei com Davi (Alcolumbre) mais cedo. Vamos fazer uma construção conjunta, sob a liderança dele, para que a gente possa aprovar o texto na Câmara e encaminhar para promulgação — afirmou Maia.
A demora no envio do pacote que revê o pacto federativo — que irá garantir maior distribuição de recursos a governos estaduais e municipais — também está no radar de exigências do Senado. Causou mal-estar entre parlamentares a informação de que a equipe econômica prevê reduzir os repasses frente à desidratação da reforma em plenário.
— Não acredito que o ministro tenha dito isso. Se isso aconteceu, se ficasse quieto ajudaria mais. O ambiente da política é de diálogo, entendimento. Articulação é parte do processo —comenta o senador Marcos Rogério (DEM-RO).
Apesar das reclamações, que ainda incluem espera de até três meses a pedido de reuniões com ministros e a liberação de emendas parlamentares, senadores não veem clima para esticar a corda da Previdência além do mês de outubro.
Nos bastidores, há quem lembre que a falta de articulação poderá prejudicar propostas de interesse do governo, como a indicação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-RJ) para a embaixada brasileira em Washington, que precisará do aval do Senado.