A venda de consórcios no Brasil tem batido recordes. De janeiro a maio de 2022, as adesões a novos contratos avançaram 11,1% na comparação com o mesmo período do ano passado, conforme dados da Associação Brasileira de Administradoras de Consórcios (Abac). O resultado, que já supera 8,62 milhões de participantes ativos, é superior à marca de 2021, quando já havia sido registrado o maior número da série histórica.
Consórcio é a modalidade de compra baseada na união de pessoas – físicas ou jurídicas – em grupos, para formar poupança com objetivo de comprar bens, imóveis ou serviços. Neste ano, ele completa 60 anos no Brasil. A formação desses grupos é feita por uma administradora de consórcios, autorizada e fiscalizada pelo Banco Central do Brasil. Conforme a Abac, nesse sistema o valor do bem ou serviço é diluído em um prazo predeterminado e todos os integrantes do grupo contribuem ao longo desse período. Todos os meses (ou conforme o prazo determinado no contrato), a administradora contempla, por sorteio ou lance, um dos participantes com o crédito no valor do bem ou do serviço contratado até que todos sejam atendidos.
O crescimento dos números no país mostra que o modelo caiu no gosto dos brasileiros, mas especialistas alertam para cuidados na hora de aderir ao consórcio. O primeiro ponto importante é entender que não se trata de um investimento:
— Consórcio é uma modalidade de crédito, em que pagamos juro, neste caso em forma de taxa de administração e fundo reserva, para ter acesso a um bem. O investimento é quando recebemos juro por um valor aplicado — explica a orientadora financeira pessoal Ingrid Roth, da consultoria Ih! Gastei.
De acordo com ela, é sempre importante comparar as opções entre as modalidades de financiamento em bancos e consórcio e fazer cotações em instituições financeiras diferentes, porque há variações na análise de crédito de acordo com o histórico e a relação de cada consumidor com o banco. Para isso, vale a pena simular opções de financiamento e de grupos de consórcio para avaliar os números antes de tomar uma decisão.
Outro aspecto importante é que o consórcio não é poupança. Para Annalisa Blando, líder do comitê de educação financeira e conselheira consultiva do grupo Mulheres do Brasil, o mais recomendável é que o consumidor se organize para guardar o dinheiro antes da aquisição.
— O ideal é que a pessoa tenha disciplina financeira para guardar o dinheiro e então comprar o automóvel ou o imóvel — afirma Annalisa.
No entanto, para a maioria, é difícil ter o controle para reservar uma fatia dos rendimentos todos os meses até somar na conta o valor total para fazer a compra. Para Gustavo Kurmann, economista e consultor de investimentos da Spar Financial, outra variável muito importante nesse cálculo é o tempo.
Afinal, no consórcio não há garantia do momento em que o cotista será contemplado. Com o financiamento, o consumidor pode ter acesso imediato ao automóvel ou imóvel:
— Quando não é possível esperar durante todo o tempo necessário para acumular o capital, o consórcio pode ser uma boa alternativa, visto que o consorciado pode dar lances e antecipar o recebimento da carta de crédito. O consórcio também é uma boa alternativa para aqueles que têm menos disciplina para investir os recursos e podem esperar pela carta de crédito. Contudo, se a necessidade for muito imediata, resta a alternativa do financiamento.
Inflação como novo cenário
No consórcio, a oscilação de preços dos bens e serviços influencia na composição das parcelas ao longo do tempo – elas são reajustadas por índice de inflação ou pela tabela Fipe, assim como o saldo devedor. Em um cenário de retomada da inflação, essa é uma variável que preocupa. Com a pandemia, houve um descompasso na demanda e na produção de diversos itens, como os semicondutores, importantes para a indústria automobilística, e insumos como o ferro e o alumínio, relevantes para a composição de preços da construção civil.
— No caso dos automóveis, durante a pandemia, houve um problema de oferta e demanda. Então, os carros usados se valorizaram muito por conta da dificuldade da indústria de produzir — comenta Annalisa.
Ela aposta, no entanto, que com o controle da pandemia e o fim da guerra da Ucrânia, que também está prejudicando a logística mundial, os preços devem se acomodar.
— Não faz sentido os carros usados se valorizarem, porque eles vão se depreciando ao longo do caminho — completa.
Observação: no consórcio, os valores de referência não são constantes como no exemplo acima. O bem pode sofrer reajuste ao longo do tempo, o que resultará em uma conta mais alta no final. Supondo que o valor do bem aumentou 10% em um ano, o crédito do consorciado também sofrerá ajuste. Consequentemente, a parcela do consorciado aumenta. Na compra de um veículo de R$ 90 mil, por exemplo, com grupo de duração de 60 meses, ao final do primeiro ano, se o automóvel passou a valer R$ 99 mil pela tabela FIPE e, no último ano, já chegava a R$ 131.769,00 mil pela mesma tabela, as parcelas começam em R$ 1.755 e terminam em R$ 2.243,74, totalizando um desembolso de R$ 121.468,32.