A escassez de emprego na iniciativa privada tem levado cada vez mais gente a buscar o ganha-pão como pequeno empresário. E o caminho favorito é se tornar Microempreendedor Individual (MEI). Esta categoria de empresa, sob o guarda-chuva do Simples Nacional, dá acesso a baixa carga tributária e pode ser criada em poucos minutos, do computador de casa – um alívio na burocracia.
Neste ano, com aumento na fiscalização e criação de lei, os trabalhadores de salões de beleza, um dos setores mais informais da economia, passaram a enxergar esta como boa opção de formalização.
Para ajudar quem sonha em empreender ou se regularizar a entender como funciona o MEI, detalhar suas vantagens e regras, esta reportagem apresenta o relato de pessoas que trilharam este caminho e um guia para sanar as principais dúvidas sobre esta que já é a opção de formalização mais utilizada no Estado.
Porta de entrada no mercado
Os gaúchos descobriram o MEI como atalho para a formalização. De janeiro a junho deste ano, 65 mil profissionais no Estado se inscreveram como Microempreendedores Individuais, conforme a Junta Comercial, Industrial e Serviços do Rio Grande do Sul (Jucis-RS). Ou seja, das 81,1 mil novas empresas nascidas no Estado no primeiro semestre de 2018, a grande maioria é MEI.
– O MEI foi lançado em 2008 para tirar pequenos empreendedores da informalidade, com regime tributário simples e facilidade para abrir a empresa. Assim, se tornou a principal porta de entrada de prestadores de serviços no mundo do trabalho – explica Lucas Rodrigues Soveral, assistente técnico da Gerência de Relacionamento com Clientes do Sebrae-RS.
500 funções profissionais
No Estado, são mais de 433 mil MEIs, conforme o Portal do Empreendedor, site do governo federal que reúne informações e ferramentas para o pequeno empresário se formalizar – no país, o número chega a 7 milhões. Esta categoria contempla quase 500 funções profissionais, em geral atividades que costumam ser prestadas às margens da formalização nas áreas de serviços, comércio e indústria.
Os benefícios de se cadastrar como MEI passam por acessar a cobertura do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e pagar uma taxa fixa por mês independente de quanto fatura – R$ 48,70 a R$ 53,70.
Quem se formaliza recebe alvará de funcionamento e licença para emitir nota. Há também limitações: o MEI deve faturar no máximo R$ 81 mil por ano e pode contratar apenas um empregado pagando salário mínimo ou piso da categoria.
Fechamento tem taxa elevada
Em razão do teto na receita (R$ 81 mil por ano), para muito empreendedores, o MEI é transitório. É esta a intenção de Natan Pereira Dorneles, 23 anos, que se formalizou em junho para abrir uma loja de roupas estilizadas. Como projeta sua receita bruta (o que fatura antes de pagar fornecedores, distribuidores e eventualmente um empregado) alta, sabe que o lucro ficará espremido pelas regras do MEI.
– Criar um CNPJ foi o caminho para começar a costurar contratos permanentes com parceiros comerciais e ter acesso à consultoria do Sebrae para lançar a empresa. Conforme o negócio cresça, posso me enquadrar em outro perfil de empresa – projeta.
Para muitos, no entanto, mesmo as regras benévolas do MEI não garantem o sucesso do negócio nem o cumprimento das obrigações fiscais. Assim como a taxa de abertura é alta, a de fechamento dos MEIs também é elevada.
Impostos atrasados
Nos primeiros seis meses deste ano, 21,8 mil MEIs foram fechados no Estado. Entre os motivos, decisão do empreendedor de encerrar o negócio, cancelamento do CNPJ em razão de não pagamento de imposto por 24 meses seguidos e deixar de entregar duas declarações anuais seguidas à Receita Federal. Conforme a Receita, 51,4% dos MEIs têm impostos atrasados no Estado.
– Muitos dos trabalhos dos MEIs são prestados de forma esporádica, o empreendedor não consegue manter a regularidade no pagamento do imposto. Com isso, tem que encerrar o negócio – avalia Cleverton Signor, secretário-geral da Jucis-RS.
Mudança nos salões de beleza
O elevado número de novos MEIs é recheado com a chegada de profissionais que atuam no setor de beleza. Desde o início deste ano, uma nova lei reforçou o estímulo para que donos de salões e profissionais como cabeleireiros, manicures, maquiadores, depiladores e barbeiros regularizem sua parceria com contratos e emissão de nota fiscal. A nova regra possibilita aos salões enquadrados no Simples Nacional que abatam dos impostos o que pagam aos parceiros formais.
Com isso, tem sido desmanchada uma cultura de informalidade que data os anos 1960, em que autônomos faziam seu serviço nos salões e repartiam os ganhos com o dono do salão, informalmente.
A lei deste ano (Resolução 37 do Simples Nacional) se somou à outra (13.352/2016), que definiu que salões e parceiros devem formalizar contrato para estabelecer a parceria – caso contrário, a relação poderia ser vista como trabalhista, com multa ao salão pelo Ministério do Trabalho e risco de ser alvo de processo judicial.
– As novas leis trouxeram segurança jurídica ao parceiro e ao salão e têm levado os profissionais a buscar a formalização. O caminho mais rápido e barato é se tornando MEI –explica Fernanda Zannoni, contadora e consultora especialista em beleza e estética.
Direitos do trabalhador
Foi esta a opção de Andriele Siqueira Pereira, 29 anos, de Alvorada, que há dez trabalha como manicure. Há um mês, ela foi chamada para trabalhar como profissional parceira em um salão no shopping Iguatemi, com a condição de se formalizar.
– Pela primeira vez, me solicitaram ter uma empresa – relata.
Agora com a cobertura do INSS e contrato assinado com o salão, diz estar mais tranquila:
– Nunca tive cobertura de licença-maternidade ou auxílio-doença. Com o MEI, isto mudou.
Setor continua da informalidade
O caminho seguido por Andriele ainda é raro. A formalização nos salões é incipiente e é pequena a quantidade de profissionais da beleza que regularizaram sua atividade. O Sindicato dos Salões de Barbeiros, Cabeleireiros, Institutos de Beleza e Similares no Rio Grande do Sul (Sinca-RS) contabiliza aproximadamente 200 empreendimentos que já atuam da forma legal no Estado e estima que haja mais 9,8 mil não adequados à lei _ a maioria de pequeno porte. O Sinca projeta haver 60 mil profissionais da beleza no Estado, sendo que apenas 1,2 mil estão regulares.
– Quem trabalha há muito tempo no mesmo salão tem dificuldade de enxergar as vantagens da regularização. Mas a tendência é de que esta cultura da informalidade vá se revertendo, até porque a fiscalização do Ministério do Trabalho está cada vez mais atuante no setor da beleza – afirma Fernando Luiz Guimarães, vice-presidente do Sinca-RS.
Guia para quem quer se tornar microempreendedor
Quem pode
- Dezenas de atividades profissionais são autorizadas, como agente de viagens, artesão, borracheiro, comerciante, cabeleireiro, caminhoneiro, diarista, eletricista, jardineiro, mecânico, pedreiro e taxista. A lista completa está neste link.
- Empreendedor que toque um negócio com faturamento limitado a R$ 81 mil por ano (proporcional a R$ 6.750 por mês).
- Profissionais a partir de 18 anos (16, se emancipados legalmente).
- Não participar como sócio, administrador ou titular de outra empresa.
- Pessoa com auxílio-doença perde o benefício no mês que se formaliza como MEI.
- Quem recebe o seguro-desemprego poderá ter a suspensão do benefício. Neste caso, deverá recorrer nos postos de atendimento do Ministério do Trabalho.
- Quem trabalha na iniciativa privada no regime CLT pode se tornar MEI, mas, em caso de demissão, não terá direito ao seguro-desemprego.
Benefícios
- Não precisa contador para pagar os impostos e emitir notas.
- Pagará as menores alíquotas de impostos entre as categorias de empresas no país.
- Tem a cobertura do INSS. Todos os benefícios são calculados sobre um salário mínimo.
- O MEI poderá se aposentar por idade (sendo mulher aos 60 anos e homem aos 65 anos, com tempo mínimo de contribuição de 15 anos) ou por invalidez, receber auxílio-doença (caso tenha contribuído para a Previdência por, no mínimo, 12 meses) e salário-maternidade (mínimo de dez meses de contribuição).
Limitações
- Pode contratar no máximo um empregado pelo regime CLT que receba um salário mínimo ou o piso da categoria.
- Não pode contratar o próprio cônjuge como empregado.
- Não tem contrato social e não pode ter sócio.
- Se ultrapassar o teto do faturamento anual, deve informar à Receita Federal e sairá da categoria, caindo em faixas tributárias mais elevadas do Simples Nacional, conforme seu faturamento real.
Como fazer o cadastro
- A formalização é gratuita e deve ser feita pelo Portal do Empreendedor, neste endereço.
- Ao preencher os dados, é preciso informar número do CPF, data de nascimento, número do título de eleitor e do último recibo de entrega da Declaração Anual de Imposto de Renda Pessoa Física. Não há a necessidade de assinaturas ou envio de documentos e cópias.
- O CNPJ, as inscrições na Junta Comercial e no INSS e o Alvará Provisório de Funcionamento são obtidos imediatamente, em um documento único chamado Certificado da Condição de Microempreendedor Individual (CCMEI).
- Antes de se formalizar, é importante comparecer à prefeitura de sua cidade para confirmar se o endereço desejado para estabelecer o negócio é passível de instalação de atividade da empresa. Para negócios abertos em Porto Alegre, esta consulta deve ser feita no site da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, neste link.
- Dependendo do tipo de atividade, podem ser necessários documentos adicionais como alvará sanitário e Plano de Prevenção e Proteção Contra Incêndio (PPCI). Estas informações são dadas pela prefeitura após a consulta prévia.
- Ficou com dúvidas? Busque ajuda com o Sebrae, que oferece orientação gratuita sobre a formalização dos MEIs. Para saber qual a unidade do Sebrae mais próxima à sua cidade, acesse este site. As empresas e escritórios contábeis espalhados pelo Brasil, optantes pelo Simples Nacional, também poderão realizar a formalização do MEI gratuitamente.
Compromissos legais
- O empreendedor deve recolher mensalmente as contribuições de R$ 47,70 ao INSS, acrescido de R$ 5 para prestadores de serviço, R$ 6 para comércio e serviços e R$ 1 para comércio e indústria.
- O pagamento é feito por débito automático, pagamento on-line ou um carnê emitido no Portal do Empreendedor.
- Também é preciso declarar anualmente à Receita Federal o faturamento e se houve contratação de empregado. O período para esta declaração vai de janeiro a maio. O formulário está disponível no Portal do Empreendedor.
- O MEI não precisa emitir nota fiscal para o cliente pessoa física, porém, estará obrigado a fazer a emissão quando prestar serviço a outras empresas.
- O MEI que exerce uma atividade de serviço (como doceiros, maquiadores e encanadores) pode trabalhar com notas físicas ou eletrônicas. Para utilização da nota fiscal eletrônica, é importante verificar mais detalhes diretamente com a prefeitura do município. Para ter acesso ao bloco de notas, o empreendedor deve comparecer à prefeitura de sua cidade e fazer a solicitação. O processo todo é gratuito (exceto o custo da gráfica, caso utilize notas físicas).
- No caso de um MEI que atua na área comercial ou industrial, a exigência é diferente: ele acessa a nota fiscal avulsa eletrônica diretamente pelo portal da Secretaria Estadual da Fazenda (Sefaz-RS). Este processo pode ser feito neste site. Há também a possibilidade de adquirir em papelarias o bloco de Nota Fiscal Avulsa. Caso utilize este modelo físico, deverá anexar a esta nota o documento chamado Consulta Optantes (acessado neste site).
- Pode receber fiscalizações trabalhistas, sanitárias, ambientais, metrológicas e de segurança contra incêndio.
Cancelar inscrição
- Para cancelar a inscrição, é preciso acessar o Portal do Empreendedor e clicar no botão "Baixa do registro".
- Após cumprir esta etapa, o MEI deverá preencher a Declaração Anual para o MEI de Extinção – Encerramento, no mesmo site.
- Mesmo estando com débitos, o contribuinte pode dar baixa e pagar a dívida em nome da pessoa física. Poderá ser cobrado de impostos e contribuições atrasados.
Salões de beleza
- Uma nova lei, em 2018, possibilitou que os salões abatam dos impostos o que pagam ao prestador de serviços com contrato de parceria formalizado, desde que este apresente nota fiscal das comissões recebidas.
- Para os profissionais que trabalhavam na informalidade, a formalização traz benefícios fiscais e previdenciários.
- Muitos salões vêm exigindo que os prestadores se formalizem, e o caminho mais rápido e barato é a criação de um MEI.
- Esta relação precisa ser homologada via contrato (que estabelecerá qual será o percentual do pagamento pelos serviços repassados ao salão e ao parceiro e também esclarecerá qual a responsabilidade de cada um na manutenção e higiene dos materiais) e reconhecida pelo sindicato da categoria ou delegacia regional do Ministério do Trabalho.
- O profissional parceiro não terá relação de emprego ou sociedade com o salão.
- O empreendedor deve recolher mensalmente contribuição de R$ 52,70.
Fontes: Portal do Empreendedor, Sebrae-RS, Junta Comercial do Estado, Sinca-RS e consultora Fernanda Zannoni