Pelo terceiro ciclo seguido, a condição climática já altera a produção de milho no Rio Grande do Sul. As dimensões das perdas ainda são preliminares e difíceis de mensurar enquanto a cultura está em desenvolvimento, mas já dão indícios de uma nova safra com estragos.
A combinação de tempo seco, chuvas irregulares e temperaturas altas em período crucial para etapas como a floração e o enchimento de grãos das espigas é a maior preocupação no setor. O nível do alerta é "de amarelo para vermelho", define o diretor-técnico da Emater, Alencar Rugeri. Perdas esparsas já são registradas em áreas na metade Oeste do Estado.
— É um ano de distribuição bem desuniforme de chuvas. No que afeta a produção, temos bolsões de chuva e outros bolsões com falta dela. É difícil dizer uma região específica. Mas, com o passar dos dias, a tendência é esses bolsões irem se ampliando — diz Rugeri.
Presidente da Associação dos Produtores de Milho do Rio Grande do Sul (Apromilho-RS) e produtor do grão em Chiapetta, na região de Ijuí, Ricardo Meneghetti diz que há relatos de agricultores já acionando o Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro).
— Quando chega ao ponto de requisitar o seguro, é porque deu uma perda grande. Mas é um mosaico bem interessante. Tem regiões com bastante prejuízo, outras com alguns e outras ilesas — relata Meneghetti.
Especificamente para o milho, o problema é o avanço das áreas com dificuldade hídrica, que começam em pequenos pontos e vão se expandindo. Nesse sentido, o grão se difere da soja porque tem um período curto e crucial em que necessita de chuva, enquanto na soja esse intervalo é mais alongado, conforme o diretor-técnico da Emater.
— O agricultor vem usando estratégias de produção, mas o milho tem tido dificuldade nas três últimas safras, pelo menos, e num período-chave do desenvolvimento da planta — completa Rugeri.
A condição da cultura daqui para frente depende dos próximos dias. Se voltar a chover e a temperatura ficar amena até a próxima semana, algumas lavouras prejudicadas ainda podem produzir alguma quantidade do grão. Do contrário, o estrago pode ser grande.
Outra preocupação é em relação à qualidade do grão colhido. As lavouras de milho já vêm com produtividade menor por causa dos ciclos anteriores. O impacto disso se repetirá mais à frente, com menor oferta para a indústria. O milho é o principal componente da ração animal e a sua falta no mercado tem reflexos no preço do frango e do leite, por exemplo.
— Infelizmente, acho que vamos ficar devendo para a indústria o nosso milho gaúcho em quantidade suficiente para abastecer — projeta o presidente da Apromilho-RS.
O acompanhamento meteorológico da Secretaria da Agricultura, feito pelo Sistema de Monitoramento e Alertas Agroclimáticos (Simagro-RS), indica que a chuva está abaixo dos níveis esperados nos três últimos meses do ano, confirmando a persistência do La Niña.
Na avaliação do meteorologista e coordenador do Simagro-RS, Flávio Varone, o quadro alerta para as chamadas estiagens isoladas, principalmente onde os problemas de escassez hídrica são velhos conhecidos, como a Metade Sul, a Fronteira Oeste e a Campanha.
Dezembro de atenção
De acordo com o sistema de meteorologia da Secretaria da Agricultura, a expectativa é de que o período mais crítico da falta de chuvas no Rio Grande do Sul seja o mês de dezembro. A partir do fim do ano, deve haver um alívio com maior distribuição das precipitações em janeiro.
— O nosso verão sempre é preocupante. Acredito que o maior problema que vamos enfrentar seja em dezembro, um mês para termos bastante cuidado. Já as projeções para janeiro mostram alguma condição de chuva — diz Varone, do Simagro-RS.
Quanto aos calorões, que no campo tem o efeito de dificultar a absorção da água pelo solo, já que a chuva evapora rapidamente, o meteorologista diz que a sequência prolongada de dias tórridos enfrentada no verão de 2022 não deve se repetir.
— Não temos, por enquanto, previsão parecida ao que tivemos em janeiro passado, com a condição de calor intenso e extenso como tivemos – tranquiliza Varone.
A previsão é de que o La Niña comece a perder força no início do ano. O fenômeno climático de resfriamento das águas do Oceano Pacífico tem efeito mundial e está diretamente relacionado a episódios de secas e de inundações em diversas regiões.
Até que a atmosfera se estabilize novamente, a condição de normalidade deve voltar somente a partir do outono de 2023. Isso não quer dizer, ainda, que haverá um novo quadro de estiagem prolongada no Estado, como a que ocorreu este ano e que levou a perdas históricas na agricultura gaúcha.