Setor que apoiou de forma maciça o presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), o campo ainda espera para saber quais serão as diretrizes do novo governo para a agricultura. Genérico, o plano de governo do então candidato aponta apenas linhas gerais. Dar mais segurança ao meio rural, solucionar questões agrárias, melhorar logística de transportes e armazenamento, consolidar e abrir mercados são alguns dos pontos do documento com as propostas, mas sem detalhá-las.
Bolsonaro mostrou receptividade para aceitar sugestões de líderes e entidades da área, mas em alguns pontos tem mostrado atitude polêmica, como o projeto de fusão dos ministérios da Agricultura e Meio Ambiente. Recuou da ideia devido à repercussão negativa e à falta de convicção da própria bancada ruralista, Na última terça-feira, retornou ao plano original. Um dia depois – quarta-feira – voltou atrás novamente.
O diretor-executivo da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), Luiz Cornacchioni, diz que, além das reformas necessárias para dar melhor estabilidade fiscal ao país, o setor espera avanços na área da logística, remodelamento do seguro agrícola, crédito rural e acordos comerciais.
– E um ministro da Agricultura que seja do setor e pró-setor – diz Cornacchioni.
Líderes se opõem ao tabelamento de frete
Na área de logística, as prioridades seriam resolver o problema do tabelamento do frete, que enfrenta oposição no campo, e terminar a pavimentação da BR-163, que liga o Centro-Oeste a portos do norte do país, via de escoamento de soja para exportação. No crédito, Cornacchioni defende a ampliação de fontes de recursos.
Uma das iniciativas é regulamentar melhor o mercado de capitais, como Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) em dólar, referenciados em commodities agrícolas negociadas em bolsas no Exterior. Os CRAs permitem ao produtor antecipar recursos que seriam recebidos após a entrega do produto.
A bancada ruralista, primeiro grande agrupamento multipartidário do Congresso que anunciou apoio a Bolsonaro, entregou documento com prioridades. As reivindicações tendem a ser respaldadas pelo presidente eleito, mas não há resposta formal. Os interesses da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) incluem licenciamento ambiental, questões fundiárias e indígenas, competitividade e revisão de legislação de agrotóxicos.
O presidente da Associação Brasileira da Proteína Animal (ABPA), Francisco Turra, reforça a necessidade de melhorar a logística, com exploração de ferrovias e hidrovias. O segmento também espera que não faltem recursos para defesa sanitária, o que ajudaria o país a recuperar a imagem após a Operação Carne Fraca.
Mas há outras questões que trazem inquietação e podem gerar transtornos nas vendas a outros países. Bolsonaro já referiu a vontade de transferir a embaixada brasileira em Israel para Jerusalém, o que pode irritar países islâmicos, responsáveis por cerca de um terço das exportações brasileiras de aves e suínos.
– A implementação de uma ideia como essa não passa apenas por uma decisão presidencial. Será discutido e haverá contraponto. Não podemos criar animosidade – alerta Turra.
Em meados do mês passado, Bolsonaro pediu à bancada ruralista que listasse possíveis indicações para ocupar a Agricultura.
– Mais importante do que nome é sugerir políticas públicas para o agronegócio – afirmou no meio da semana a coordenadora da bancada ruralista, a deputada federal Tereza Cristina (DEM/MS), ela própria cotada para o ministério.
Na última terça-feira (30), a bancada ruralista fez a primeira reunião de avaliação do resultado da eleição e debateu propostas que serão levadas à cúpula do governo, além de prioridades para o Congresso.
O que as entidades do campo pedem:*
- Fazer reformas necessárias, como a tributária e a previdenciária. A modernização do sistema tributário daria maior competitividade ao setor.
- Priorizar o seguro rural, como forma de garantir renda ao produtor e atrair novas fontes de financiamento para o setor.
- Firmar acordos comerciais com prioridade nos principais mercados importadores de alimentos, como Coreia do Sul, México, União Europeia, Japão, além de estabelecer parcerias estratégicas que favoreçam o fluxo comercial com China, Estados Unidos e Aliança do Pacífico.
- Assegurar segurança jurídica no campo em questões fundiárias, trabalhistas e que reduzam a criminalidade no campo.
- Criar ambiente regulatório mais transparente para impedir monopólios e promover a livre iniciativa, evitando tabelamentos no valor do frete rodoviário, e atrair investimentos privados destinados à integração dos modais de transportes e à melhoria da armazenagem.
- Fortalecer o sistema de defesa agropecuária, para que seja mais ágil e eficiente.
- Ampliar recursos para assistência técnica, de forma harmônica entre os diferentes perfis de produtores.
- Desenvolver políticas públicas focadas na ampliação da produção de biocombustíveis.
* Propostas elaboradas por entidades como CNA e OCB
O que a bancada ruralista quer:
- Votação de projeto de lei que dará maior celeridade nos processos de licenciamento ambiental para atividades no campo.
- Regulamentação de lei que trata da regularização fundiária.
- Maior celeridade na tramitação de projetos que criam hidrovias.
- Ampliação de recursos para a Agência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (Anater).
- Edição de medida provisória para permitir que cerealistas possam financiar a construção de armazéns com os juros subsidiados do Plano Safra, com uma linha de crédito específica para a atividade.
- Revisão de condicionantes para a demarcação de terras indígenas.
- Criação de mecanismo para reparar assimetrias do Mercosul nas áreas tributária, trabalhista, ambiental e cambial.
- Revisão de normas de avaliação de defensivos agrícolas pela Anvisa.
- Revogação de decretos de demarcação de terras indígenas, quilombolas e de reforma agrária do final do governo Dilma Rousseff.
- Suspensão de instrução normativa que aumenta exigências para obras que são próximas a reservas indígenas.