Léa Garcia morreu nesta terça-feira (15), aos 90 anos, deixando um legado imensurável para o teatro, o cinema e a televisão brasileira. Ela iniciou sua trajetória nas artes cênicas como integrante do emblemático Teatro Experimental do Negro (TEN), grupo criado pelo intelectual Abdias do Nascimento, com quem foi casada.
A atriz fez história na TV ao conquistar papéis que destoavam do que era comumente atribuído às atrizes negras na época. Já no cinema, deu vida a diversos personagens de destaque e chegou a ser indicada ao prêmio de Melhor Atriz pelo Festival de Cannes.
Na noite desta terça, ela seria homenageada ao lado de Laura Cardoso no Festival de Cinema de Gramado. As duas receberiam o Troféu Oscarito.
Léa Garcia soma mais de cem produções no currículo. Abaixo, GZH relembra suas principais personagens.
Rosa, de Escrava Isaura
Um dos papéis mais marcantes da extensa carreira de Léa Garcia na televisão foi a vilã Rosa, de Escrava Isaura, personagem que era antagonista da mocinha. Rosa foi responsável por tornar o rosto da atriz conhecido entre o público massivo da TV, em 1976. A interpretação de Léa Garcia foi tão contundente que, à época, ela chegou a sofrer ataques na rua.
— Apanhei muito. Uma vez, na feira, uma criatura pegou um peixe enorme e bateu com ele nas minhas costas porque eu "estava sendo perversa com a Isaura". Também levei um beliscão que me fez chorar quando esperava um táxi na Praia do Flamengo. Naquela época as pessoas confundiam o personagem com o ator — contou Léa em entrevista ao Conversa com Bial.
Serafina, de Orfeu Negro
No cinema, a personagem mais emblemática de Léa Garcia foi em Orfeu Negro, de 1959. O filme ítalo-franco-brasileiro foi dirigido por Marcel Camus e teve roteiro adaptado por Camus e Jacques Viot a partir da peça teatral Orfeu da Conceição, de Vinicius de Moraes, da qual Léa também fez parte. Na montagem, a atriz interpretou a vilã Mira. Já no filme, deu vida a Serafina, prima da protagonista Eurídice que ajuda no relacionamento dela com Orfeu.
O papel em Orfeu Negro rendeu a Léa uma indicação ao prêmio de Melhor Atriz no Festival de Cannes, em 1957.
Leila, de Marina
Léa Garcia foi pioneira na representação do negro em papéis ligados à classe média. Fugindo de personagens que costumavam ser destinados às atrizes negras na época, ela foi Leila na novela Marina, de Wilson Aguiar Filho, em 1980.
Trabalhando como professora de história de um colégio particular de alto padrão em São Paulo, Leila vê sua filha sofrer preconceito racial. Em um dos momentos mais marcantes da trama, a professora tem a chance de contar na televisão qual foi a verdadeira história de Zumbi dos Palmares.
Ju, de Filhas do Vento
Por seu papel no longa Filhas do Vento, Léa Garcia venceu o prêmio de Melhor Atriz no Festival de Gramado em 2004, ao lado de Ruth de Souza — Léa também recebeu kikitos por Hoje Tem Ragu (2008) e Acalanto (2013). A trama de Filhas do Vento acompanha a relação de duas irmãs que foram separadas na juventude e se reencontram 45 anos depois: Ju, interpretada por Thalma de Freitas na primeira fase e por Léa na segunda, e Cida, vivida por Taís Araújo na juventude e por Ruth de Souza na maturidade.
O longa foi o primeiro filme de ficção dirigido por Joel Zito Araújo e venceu oito kikitos em Gramado, incluindo o de melhor filme pelo júri da crítica.
Dona Antônia, de Mister Brau
Um dos trabalhos mais recentes de Léa Garcia na televisão foi na terceira temporada de Mister Brau, série protagonizada por Lázaro Ramos e Taís Araújo. A atriz interpretou Dona Antônia, mãe de Brau, e celebrou o reencontro com Taís, com quem já havia atuado também em Anjo Mau e Xica da Silva, além de Filhas do Vento.
— Eu me diverti muito com o Lázaro Ramos e estive outra vez junto da Taís. O Lázaro deu várias entrevistas dizendo que o sonho dele era contracenar comigo — disse ao Memória Globo. — Mister Brau é um produto que chega muito bem junto a todo o segmento negro e esse casal está muito bem, uma referência muito boa para todos nós.
Nesta terça, Lázaro lamentou a morte da atriz. "Sua vitalidade, sua força, sua jovialidade e seu talento sempre foram inspiradores. Poder trabalhar com a senhora foi um sonho alimentado por anos, e realizado com muita celebração. Obrigado por abrir caminhos para nós e por em cada aparição sua nos hipnotizar com esse olhar único e interpretações poderosas", escreveu ele em suas redes sociais.