Todo fim de ano é costume renovar os votos de otimismo, de esperança incondicional no futuro próximo e, ainda mais, no futuro distante. Chega-se até a olhar com olhos saudosos o que passou, quem sabe até com a "lágrima furtiva" da qual fala a ópera italiana. Mas não, não este ano, pois, pelo que se viu em 2016, poucas vezes a cultura esteve sob ameaça tão cerrada.
A extinção da Fundação Piratini, e com ela a FM Cultura e a TVE, é a ponta mais vistosa desse fenômeno terrível de governos medíocres a destruir o passado a facão, sem pensar no presente e pretendendo estar cuidando do futuro. Tudo vem embalado no mais perfeito raciocínio numérico, fazendo crer que as fundações são a origem de todos os males e, se extintas, a panaceia para todas as doenças.
Queria ser economista para lamentar a extinção da FEE mais do que lamento. Ou biólogo, para lamentar a extinção da Fundação Zoobotânica do Jardim Botânico e do Zoológico. Como não sou, me limito à FM Cultura e à TVE. Ou quem sabe à Oficina de Música de Curitiba, suspensa depois de décadas de visibilidade nacional e resultados inquestionáveis, na esteira de um raciocínio enternecedor pela perfeita imbecilidade: "Onde não há saúde, não pode haver música". Ou algo assim.
São orquestras Brasil afora em vias de extinção: a OSB no Rio de Janeiro, que entregou os pontos em 2016. Ou a Jazz Sinfônica em São Paulo que, depois de um concerto fascinante com a OSESP no Royal Albert Hall há poucos meses, está agora ameaçada de extinção. Aqui mesmo, perto de nós, há orquestras que tentam aparentar normalidade nas suas temporadas, mas que lutam pela sobrevivência concerto a concerto. A Ospa, quem diria, é uma ilha neste quadro pessimista: vai ganhar uma boa sala de ensaios e (ainda) não foi ameaçada de extinção. É pouco, mas neste final de ano já é muito.
Sobra pouco para torcer pela chegada de 2017. Para muitas orquestras, teatros e festivais no "Norte, Centro, Sul inteiro/ onde reinou o baião", como cantava Luiz Gonzaga, a hora de continuar a resistir já chegou e, com ela, a hora de pensar em reconstruir o que foi alvo tão fácil para as poucas luzes dos governos. Para a resistência e o para o embate, feliz 2017.