Não é acaso as entradas para a única apresentação de Jorge Drexler em Porto Alegre neste sábado, no Auditório Araújo Vianna, terem se esgotado no ano passado, quando o show foi anunciado. Tem sido assim em quase toda a turnê de Salvavidas de Hielo - que começou em Montevidéu e passou por Estados Unidos, México, Espanha e ainda vai para o Reino Unido.
Toda vez que Drexler lança um novo trabalho, penso: "esse é o melhor". E toda vez que assisto ao uruguaio no palco – tive a sorte de vê-lo aqui na Capital em todas as apresentações da última década – penso: esse cara é genial. Com Salvavidas de Hielo tive ainda mais sorte: assisti ao primeiro show de Drexler no Gran Teatre del Liceu, um dos maiores e mais bonitos de Barcelona. E é de lá que trago as impressões e os desejos para Porto Alegre.
Na capital catalã, Drexler abriu o show com Movimiento, seu "candombe contaminado", como ele mesmo definiu em uma entrevista, e que nos faz pensar em nosso lugar no mundo com o belíssimo refrão "yo no soy de aquí, pero tú tampoco".
Foi aí que eu separei o Jorge do Drexler. Drexler é mais formal, é o cara que, em 2005 pediu silêncio ao público em show aqui na capital gaúcha. Jorge agora se movimenta e movimenta todo o público. O Drexler de Eco - quando o uruguaio ficou mais conhecido _ era ele e um violão no palco. A cada apresentação, um novo músico e um novo som. A fronteira, para mim, foi ultrapassada dez anos depois, quando o músico tirou o banquinho do palco e escolheu um dos lugares mais dançantes de Porto Alegre para a turnê de Bailar en la Cueva. Ali Drexler virou Jorge.
O antagonismo entre o violão e o eletrônico e o ápice do show chegam com Silencio. Jorge não pede mais por um público inaudível, mas ainda assim faz todo mundo ouvir o som do teatro cheio por alguns segundos. Segundos esses que são preenchidos pela nossa respiração e emoção. Três ou quatro segundos depois, ele, seis músicos e a luz voltam. É um dos momentos mais sensacionais do show.
Ainda que bailante, o show de Salvavidas de Hielo é político. No show de Barcelona, o uruguaio deixou isso claro quando chega em Bolivia, gravado em Bailar en La Cueva, em uma incrível parceria com Caetano Veloso. A música é vibrante. Impossível passar por ela sem rever nossa própria história, nosso lugar no mundo. Bolivia é eterna.
No final de semana passada, em passagem pelo Rio de Janeiro, Drexler participou de uma "junção" na casa do músico brasileiro e deu uma palhinha com a cantora Silvia Perez Cruz _ nascida em Palafrugell, uma cidadezinha na beira do Mediterrâneo, no norte da Catalunha. Em Barcelona, Silvia dividiu com Drexler duas canções arrepiantes, Soledad, dele; e Cucurrucucú Paloma, dela. Eu chorei. Chorei em Barcelona, chorei ao assistir ao trio no Instagram dando uma palhinha na casa de Caetano. Quem sabe teremos a sorte de ver Drexler compartilhar seu palco com alguém genial no sábado. Oxalá!