Com mais de duas dezenas de livros lançados, o psicanalista e escritor Celso Gutfreind acaba de publicar sua primeira narrativa longa. A Menina que Morava no Sino é a estreia do autor no gênero novela. Trata-se de uma experiência de linguagem criativa e reflexiva, em que pulsam também as facetas de poeta e ensaísta de Gutfreind.
Voltado para o público infantojuvenil, o enredo trata de uma garotinha em situação de vulnerabilidade social. Sem ter onde se abrigar, mora dentro do sino de uma igreja e perambula pela rua durante o dia, em busca de aventuras e de afeto.
Como a mente de qualquer criança, a da protagonista também é repleta de imaginação e curiosidade, projetando nas situações que encontra fantasia e encantamento. Embora o texto tenha um tom universal, quem mora em Porto Alegre poderá descobrir referências – às vezes sutis; em outras, explícitas – ao Parque da Redenção e seus entornos.
– Esse livro nasceu de uma caminhada. Moro no bairro Rio Branco e todo domingo costumava ir até a Redenção. Um dia, olhei para o alto e vi o sino da igreja, e aquela menina veio surgindo na minha mente. Percebi que precisava conversar com ela – conta Gutfreind, citando a igreja Santa Teresinha.
A narrativa tem um fio condutor, que desemboca na adoção da protagonista por uma nova família, mas cada capítulo vaga com liberdade por reflexões e histórias paralelas, ao estilo de clássicos infantis como O Pequeno Príncipe e Alice no País das Maravilhas, citados diretamente no texto. Compositores populares e eruditos também aparecem, como Chico Buarque, Tom Jobim e Debussy, além de escritores como Pablo Neruda, Mario Quintana e Victor Hugo.
– Parto do ponto de vista que todos nós somos adotados pela cultura. A arte nos acolhe e nos salva dos buracos e lacunas do nosso desamparo – avalia Gutfreind.
A Menina que Morava no Sino pode guardar boas surpresas para leitores jovens, mas também para adultos. Trata-se de uma prosa imaginativa e poética, mas também leve e acessível ao leitor – além de bem-humorada. É um livro que celebra as artes e a literatura ao mesmo tempo que resgata a carga afetiva do espaço público.
– O espaço público é muito importante, ele nos contém, nos acolhe. Quando não podemos usá-lo fora da pandemia, por questões de violência urbana, por exemplo, também nos comprometemos como pessoas. É um espaço que nos oferece referências poéticas e narrativas. Eu não escreveria essa história caso a cidade não a tivesse me oferecido – afirma Gutfreind.
A Menina Que Morava no Sino
Celso Gutfreind
(Physalis Editora, 136 páginas, R$ 50 - disponível no site da editora)