Morto nesta quarta-feira (15) aos 94 anos, Rubem Fonseca foi um dos nomes mais celebrados de sua geração na literatura brasileira. Mas o alcance de sua obra extrapolou as páginas e encontrou grande sucesso também nas telas. Fonseca emprestou seus livros a diversas adaptações para o cinema e a televisão, e ainda atuou ele próprio como roteirista.
Sua primeira ligação com o audiovisual foi em 1971, quando tomou seu livro de contos Lúcia McCartney, escrito quatro anos antes, como base para o longa-metragem Lúcia McCartney, Uma Garota de Programa. Adriana Prieto fazia a personagem-título, uma prostituta fascinada pelos Beatles. Em 2016, o título também virou minissérie, exibida pela GNT e dirigida por seu filho, José Henrique Fonseca. Envolta em sensualidade, a trama causou furor ao trazer uma cena de nu frontal de Eduardo Moscovis, como o personagem que quer tirar a protagonista dos bordéis.
Em 1974, Fonseca roteirizou Relatório de um Homem Casado, trama passional sobre um advogado que trai a mulher com uma cliente. O longa venceu dois prêmios da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA), incluindo o de melhor filme.
A carreira cinematográfica seguiu com A Extorsão, de 1975, fruto de parceria com o cineasta Flávio Tambellini, que também assinou Relatório de um Homem Casado. O cartaz do filme anunciava o tom policialesco e luxuriante que marcaria a produção do autor mineiro: "Violência e sexo numa fascinante história de emoção e mistério".
Mandrake: A Bíblia e a Bengala foi adaptado, alguns anos depois, em um telefilme exibido em 1983. A obra ganhou mais uma releitura para a TV em 2005, com Marcos Palmeira no papel de um advogado acostumado a lidar com casos de extorsão e chantagem. O seriado teve uma segunda temporada exibida em 2007, pela HBO. Bem-sucedida, foi vendida para outros países e concorreu duas vezes ao Emmy Internacional de série dramática.
Anos antes, Palmeira já havia entrado em contato com a obra de Fonseca, no longa Stelinha, dirigido por Miguel Faria Jr. em 1990. Ester Góes vivia uma cantora decadente, afundada no álcool e nas drogas. O filme venceu dois prêmios APCA, incluindo o de melhor roteiro, além de 12 troféus no Festival de Gramado — Fonseca foi mais uma vez consagrado por seu script, conquistando um Kikito.
Também aclamado foi A Grande Arte, baseado no romance homônimo, adaptado para o cinema em 1991 por Walter Salles. Nele, Peter Coyote vivia um fotógrafo americano que parte em busca do assassino de um de seus modelos. Raul Cortez, Cássia Kis e Tony Tornado também apareciam em cena. O longa levou os prêmios de melhor filme do público e da crítica no Festival Sesc Melhores Filmes.
Os anos 2000 continuaram prolíficos para a carreira de Fonseca no cinema. Em 2001, Bufo & Spallanzani, também de Flávio Tambellini, trilhou caminho de sucesso em festivais. Em 2003, O Homem do Ano rendeu uma indicação ao roteiro de Fonseca no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro.
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Em 2006, o mexicano Paul Leduc adaptou o conto O Cobrador, censurado na ditadura militar, para o cinema e exibiu a história criada pelo escritor mineiro no Festival de Veneza. No mesmo ano, o primeiro romance de Fonseca, O Caso Morel, também virou filme. Sua obra ainda serviu de base para vários curtas-metragens, além do filme português Axilas, de 2016.
Na televisão, Fonseca foi aclamado pela minissérie Agosto, exibida em 1993 e inspirada em romance publicado três anos antes. José Mayer, Letícia Sabatella, José Wilker, Lima Duarte e Paulo Gracindo interpretavam as peças de uma investigação criminal em meio à crise do governo Vargas.
Seu último crédito no audiovisual foi na novela Tempo de Amar, transmitida pela Globo entre 2017 e 2018, e baseada na história dos avós de Fonseca. A filha do autor, Bia Corrêa do Lago, integrou a equipe de roteiristas. Em entrevista à Folha, ela disse, à época, que o pai, não muito adepto das telenovelas, acompanharia o folhetim, uma história de amor no estilo Romeu e Julieta. Algo bem distante do mistério e da brutalidade que marcaram sua obra na literatura, no cinema, na televisão e também no teatro.