Resistência sempre foi uma palavra-chave para a Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz, fundada em 1978, em plena ditadura militar. Tornou-se um dos grupos teatrais mais representativos do país, tendo sido homenageado em 2017 no 20º Festival Palco Giratório, pelo qual circulou pelo país. No aniversário de 40 anos do coletivo, completados neste mês, uma outra palavra vem à mente de Paulo Flores, um dos fundadores da Tribo e ainda hoje integrante do grupo: desesperança.
– Quando o Ói Nóis surgiu, havia uma vitalidade muito grande daqueles jovens que formaram o grupo em combate à ditadura. Havia uma perspectiva de transformação social naquele momento, e o Ói Nóis fez parte daquelas lutas que redemocratizaram o país e trouxeram novos elementos para a discussão, como a preservação da natureza e a luta das minorias – lembra Flores. – Agora, quando vemos esse retrocesso total, começamos uma luta para conter a onda conservadora, as ideias fascistas, em defesa da democracia. Agora nossa vivência é essa.
Em sua trajetória marcada pela crítica política e social, o Ói Nóis desenvolveu um teatro que procura afetar o público pelos sentidos. Apenas em um segundo momento, a experiência passa a ser intelectual. São duas as vertentes de trabalho: o teatro de vivência e o teatro de rua. O primeiro é constituído por espetáculos apresentados na Terreira da Tribo, a sede do grupo, nos quais os espectadores acompanham os atuadores pelos diferentes espaços da ação. Já os espetáculos de teatro de rua são o momento de ir ao encontro da população, preservando a estética do grupo e seus temas.
"Atuador" é como o Ói Nóis designa cada integrante, uma combinação de ator e ativista. Não é por acaso que uma das ações mais importantes desenvolvidas pelo coletivo é chamada de Teatro como Instrumento de Ação Social, por meio da qual são realizadas oficinas de teatro gratuitas em bairros periféricos. O grupo também tem um selo, o Ói Nóis na Memória, pelo qual lança livros e DVDs que documentam sua trajetória – iniciativa fundamental em um país considerado sem memória.
Se resistência é a palavra de ordem, o grupo está realizando uma série de atividades, até domingo, para marcar os 40 anos, incluindo apresentações de seus trabalhos mais recentes, como Medeia Vozes (2013, leia reportagem da época e crítica) e Caliban – A Tempestade de Augusto Boal (2017, leia reportagem). O próximo espetáculo, Meierhold, lembrará a trajetória do teórico, diretor e ator russo que foi perseguido pelo stalinismo. Inspirado na peça Variações Meyerhold, do argentino Eduardo Pavlovsky, o projeto idealizado por Paulo Flores está aberto a doações em um financiamento coletivo. Para contribuir, acesse o site catarse.me/meierhold.
Tânia Farias, uma atuadora exemplar
Por Fábio Prikladnicki
Preparar um livro sobre a atuadora Tânia Farias para a coleção Gaúchos em Cena foi uma tarefa fácil de aceitar e difícil de executar. Aceitei prontamente porque acompanho seu trabalho no Ói Nóis Aqui Traveiz há mais de 10 anos. Difícil foi dar conta da multiplicidade de facetas da atuação e do pensamento de Tânia em um único volume. Mas assim saiu Tânia Farias – O Teatro É um Sacerdócio, que será lançado nesta quarta-feira (28/3), às 19h, no Centro Municipal de Cultura (Av. Erico Verissimo, 307), em Porto Alegre, com debate e distribuição gratuita de exemplares.
Foi praticamente uma criação coletiva, como os trabalhos do grupo. O cerne do volume é uma entrevista na qual Tânia fala sobre a criação de suas inesquecíveis personagens e expõe seu pensamento sobre arte e vida. Muitas pessoas que conhecem profundamente sua trajetória aceitaram generosamente escrever textos sobre ela. Paulo Flores, que foi seu mestre no Ói Nóis, assina o prefácio. Marta Haas, que foi aluna de Tânia, também escreve um artigo. Entre outras colaborações, há um ensaio crítico de Valmir Santos, crítico teatral de São Paulo que conhece o trabalho de Tânia e do grupo como ninguém. A esperança de todos nós é que o livro desperte nos leitores tanto amor pelo teatro quanto sentem as pessoas que participaram dele.
ÓI NÓIS AQUI TRAVEIZ – 40 ANOS
Veja a programação comemorativa do aniversário da Tribo de Atuadores em Porto Alegre:
NESTA QUARTA (28/3)
Lançamento do livro Tânia Farias – O Teatro É um Sacerdócio, de Fábio Prikladnicki, com debate com o autor e Tânia Farias mediado por Fernando Zugno, seguido de sessão de autógrafos. Às 19h, no Centro Municipal de Cultura (Av. Erico Verissimo, 307).
QUINTA (29/3) E SEXTA (30/3)
Espetáculo de teatro de vivência Medeia Vozes, às 19h30min, na Terreira da Tribo (Rua Santos Dumont, 1.186). Duração: 3h20min. Ingressos: R$ 60, à venda no local (fone 51 3028-1358), no Meme (Rua Lopo Gonçalves, 176, fone 51 3019-2595) e no StudioClio (Rua José do Patrocínio, 698, fone 51 3254-7200).
SÁBADO (31/3)
Performance de rua Onde? Ação nº2, às 11h, na Redenção, em frente ao Colégio Militar.
DOMINGO (1º/4)
Espetáculo de rua Caliban – A Tempestade de Augusto Boal, às 15h, na Redenção, no Monumento ao Expedicionário.