Impossível manter-se indiferente à Suíça. O charme cosmopolita de Zurique, mesclando prédios seculares a uma arquitetura moderna e exuberante, atrai milhões de turistas todos os anos. Só os brasileiros foram responsáveis por 70 mil diárias na rede hoteleira em 2017, um incremento de 21% em relação ao ano anterior.
O encantamento fica ainda maior quando se percorre o interior do país. Das paisagens bucólicas dos pequenos vilarejos ao horizonte coberto de neve dos Alpes, tudo é belo neste pequeno pedaço da Europa. Passeie conosco pelas ruas estreitas do centro histórico da maior cidade suíça, suba as montanhas em busca de frio e aventura e pedale às margens de lagos cuja água mais parece uma lâmina esmeralda.
Se a Suíça tem fama de ser neutra em discussões internacionais, tenho certeza de que não há isenção capaz de impedir uma paixão instantânea pelo país.
Uma Zurique encantadora
Esqueça Paris, Londres, Roma. Ignore os inúmeros likes em uma foto à sombra da Torre Eiffel, a generosa vista do alto da London Eye ou o pedido miraculoso suplicado à Fontana di Trevi. Eu sei, não é fácil resistir aos apelos dos principais centros turísticos europeus. Mas dê uma chance a Zurique. Você não irá se arrepender.
Desembarquei na maior cidade da Suíça no início de maio. Os termômetros marcavam 16°C em um dia nublado de primavera. A eficácia do sistema de transportes, contato inaugural com a precisão suíça, impressiona. Em cerca de 15 minutos, você chega de trem a qualquer ponto.
Saindo do aeroporto, desci em Langstrasse, bairro boêmio e multicultural do 4º Distrito, outrora conhecido como Red Light Zone. Os bordéis, bares e cafés canábicos continuam lá, mas um progressivo processo de gentrificação atraiu novos investidores. Há empresas de finanças, tecnologia e design, restaurantes descolados e gente jovem reunida.
Fiquei hospedado no 25 Hours Hotel, uma rede internacional com origem na Alemanha e dedicada a capturar a atmosfera dos locais onde se instala. Em Langstrasse, não é diferente. Há máquinas de fliperama, minimuseu, lojinhas de suvenires, um bar e um restaurante onde a animação cresce à noite, estimulada pelo entorno efervescente. As acomodações seguem o mesmo padrão, tudo muito confortável, colorido e alto astral.
Caminhar pelo 4º Distrito é ir ao encontro da Zurique contemporânea, na qual prédios modernos convivem em harmonia arquitetônica com clássicos edifícios residenciais de telhado enxamel e charmosas sacadas repletas de flores multicoloridas. Por suas ruas estreitas, circulam em comunhão de espaço carros, bicicletas e patinetes. O curioso não é o número de ciclistas nas ruas, uma tradição europeia, mas sim o de pessoas andando de patinete, sobretudo quando são conduzidas por jovens executivos de terno e gravata.
O trânsito tranquilo colabora, mesmo quando as vielas confluem para largas avenidas, onde se cruzam bondes, ônibus, veículos de trabalho e passeio.
O policiamento é escasso não por desídia, mas por uma sensação de segurança quase plena em um dos países menos violentos do mundo. Com menos de 400 mil habitantes, população inferior à de Caxias do Sul, à primeira vista a maior cidade da Suíça é desprovida de problemas, uma cidade onde tudo funciona e não há salário mínimo, mas um atendente de feira recebe 19 francos por hora – algo em torno de R$ 73, ou R$ 585 por uma jornada de oito horas.
Bem perto de Langstrasse, cruzando uma galeria sob os trilhos do trem, chega-se à chamada Zurique West, a antiga zona industrial. É ali que fica o Viadukt, viaduto construído no século 19 transformado em centro comercial. São lojas de marcas locais, restaurantes e uma feirinha. Além do ambiente acolhedor, o espaço tem caráter social, com os comerciantes pagando aluguel mais baixo em troca da contratação de pessoas em situação de vulnerabilidade.
Mais adiante, surge Escher Wyss, quarteirão do 5º Distrito onde fábricas se tornaram casas de jazz, teatros, academias e sede de empresas de tecnologia ou startups. São ambientes mais abertos, com praças com muito concreto e pouco verde, ruas largas e menos charme. Um rápido passeio é suficiente.
Reserve mais tempo para conhecer o centro histórico, este sim, um convite à satisfação. Você irá circular por Niederdorf, onde as típicas ruelas apertadas repletas de bandeiras da Suíça nas sacadas indicam que estamos no distrito dos bares e restaurantes. O bairro fica do lado direito do Rio Limmat, enquanto no esquerdo está o centro financeiro e empresarial, motivando a piada segundo a qual “os suíços ganham dinheiro no lado esquerdo e gastam no direito”.
Não é à toa. E trata-se de dinheiro muito bem gasto. A região é deslumbrante. O raclette, de comer ajoelhado. O gin Turicum, com seus 41% de graduação alcóolica, uma tentação inescapável. Degustei o gim batizado com o antigo nome de Zurique numa tarde ensolarada, em plena Lindenhofplatz. Trata-se de uma praça situada num ponto elevado da cidade, onde idosos jogam xadrez gigante em um tabuleiro pintado no chão e é possível apreciar a cidade descortinada aos seus pés.
Tudo isso reunido num local rodeado de prédios seculares, todos preservados com a dedicação do povo escolhido para fazer a guarda pessoal do Papa, encanta os turistas. E eles surgem aos borbotões, atraídos pela beleza de uma cidade dotada de 54 museus e 1.225 fontes – todas de água potável, cristalina e refrescante. Nenhuma fonte é mais procurada do que Munsterhof, de cuja bica toda segunda segunda-feira de abril brota vinho tinto, numa festa organizada por cooperativas para marcar a chegada da primavera. Definitivamente, vive-se bem na Suíça.
Um passeio pelos Alpes
A duas horas de trem de Zurique fica uma das mais encantadoras cidades suíças. É Interlaken, pacato município com pouco mais de 5 mil habitantes e rodeado por montanhas de topos nevados.
No imaginário coletivo, Interlaken seria aquela cidadezinha na qual os carros param para uma família de patos cruzar tranquilamente sobre a faixa de segurança. Não tive o privilégio de testemunhar cena parecida, mas foi onde desfrutei das paisagens mais deslumbrantes do meu périplo pela Suíça.
Interlaken, como o próprio nome indica, fica entre dois lagos, o Thun e o Brienz. Fiquei hospedado no Lindner Grand Hotel Beau Rivage, um cinco estrelas construído em 1874 e quase aos pés do Harder Kulm, um dos mais aprazíveis passeios do local. Trata-se de um mirante construído a 1.322 metros de altitude, onde se chega de bondinho. Lá de cima, é possível observar a cidade espremida pelos lagos e saborear um tradicionalíssimo fondeau de queijo enquanto os nativos entoam cantos típicos da região. Se possível, não deixe de conhecer.
Interlaken atrai milhares de turistas no verão por ser uma das portas de entrada para o Jungfraujoch, a mais alta estação de trem da Europa, 3.454 metros acima do nível do mar. É um passeio inesquecível, percorrido por 1 milhão de visitantes todo ano.
A viagem de trem já emociona, com os vagões circundando vales entrecortados por vilarejos bucólicos e banhados por 72 cachoeiras. Lá em cima, após o último trecho passando por túneis que cortam o interior da montanha, há lojinhas de suvenires, restaurantes, um bar todo feito de gelo e museu, entre outras atrações. Mas o momento sublime está reservado aos dois mirantes, nos quais o horizonte é ocupado pela imensidão glacial, com o verde das florestas alpinas cedendo lugar à branquidão infinita da neve.
Na descida de Jungfraujoch, pode-se pegar outro trem até Wengen, outra cidade encantadora. Com 1,2 mil habitantes e sem acesso rodoviário, o pequeno município tem apenas carros elétricos, que nunca saem de lá. O maior atrativo da região, contudo, é Grindelwald, uma cidade que mais parece locação de propaganda de Natal. É dali que sai o teleférico para a montanha First. São 25 minutos morro acima, passando pelas típicas fazendas suíças com suas vacas de sino no pescoço, lhamas e cabras espalhadas pelo campo.
Lá em cima, para além da vista espetacular, há diversas atividades de tirar o fôlego. Logo na chegada, é possível caminhar no First Cliff Walk. Venci o medo de altura e me aventurei pela passarela rente à parede de pedra da montanha. No horizonte, as nuvens passando. Lá embaixo, um abismo com 2.167 metros de profundidade. E, mais na frente, o último pedaço do caminho tem 45 metros sobre o vazio. Algo tão lindo como assustador.
Um restaurante dotado de lojinha de suvenir serve para rápido descanso antes das brincadeiras de maior adrenalina, como deslizar por 800 metros no ar, suspenso por cabos a 84 quilômetros por hora no First Flyer. Na versão First Glider, o passeio é para quatro pessoas, lado a lado e com o corpo esticado sob uma cobertura em formato de águia.
Há ainda passeios de trottibike, um híbrido de bicicleta com patinete, e de mountain cart, um carrinho feito especialmente para as montanhas. Desci por três quilômetros morro abaixo, numa estrada cheia de curvas onde cada freada é uma emoção e qualquer derrapada pode ser fatal.
De volta à Interlaken, faça um favor a si mesmo. Alugue uma bicicleta e saia a pedalar pela cidade. A recompensa é garantida.
Enquanto passear pelas margens do Lago Thun, delicie-se com água tão limpa que parece tingida de verde esmeralda, escute a delicadeza do chacoalhar dos sinos das vaquinhas que pastam mansamente pelos gramados, encante-se com os jardins multicoloridos das típicas residências suíças, passe por baixo da estrada de ferro na qual o trem cruza sempre no horário exato e chegue à praça principal onde os turistas aterrissam após saltar de paraglider dos morros nevados que emolduram a paisagem.
Daí, belisque-se para ter certeza de que não é um sonho. E volte, sempre que possível.
*O repórter viajou a convite do Consulado-Geral da Suíça no Brasil