O judoca de Porto Alegre Daniel Cargnin, 24 anos, e a psicóloga de Xangri-lá Daniela Boff Machado, 34, desconhecidos entre si, por coincidência foram colocados à prova ao mesmo tempo. Em maio, a menos de dois meses da Olimpíada de Tóquio, o atleta descobriu que estava com coronavírus, e Daniela, com seis meses de gestação, testou positivo para covid. Como milhões de pessoas ao longo do ano, os gaúchos foram desafiados e conseguiram superar seus obstáculos particulares.
O judoca derrotou o vírus, o prejuízo aos treinamentos, os adversários e deixou o Oriente com uma medalha de bronze no peito. Daniela saiu do Hospital Conceição, na Capital, após mais de dois meses de internação, com a filha recém-nascida nos braços. Até o começo de dezembro, mais de 21 milhões de brasileiros, entre os quais quase 1,5 milhão de gaúchos, haviam se recuperado da doença.
Adiadas em um ano por conta da pandemia, as Olimpíadas serviram como palco à parte para histórias de determinação de brasileiros como Daniel Cargnin. O país conquistou sete ouros, seis pratas e oito bronzes no melhor desempenho já registrado. Três das medalhas foram garantidas por gaúchos: a judoca Mayra Aguiar e o nadador Fernando Scheffer buscaram mais dois bronzes. O país também registrou seu melhor resultado nas paralimpíadas com 22 ouros e 72 medalhas no total.
A jornada de Cargnin foi especialmente dura por conta do impacto da contaminação sobre sua preparação para a disputa.
— Testei positivo antes do embarque para o Mundial, que poderia me deixar como cabeça de chave na Olimpíada e, teoricamente, sem adversários mais fortes nas primeiras lutas. Fui para a casa do meu pai, que também havia se contaminado com covid, e treinei sozinho. Eu precisava sentir que estava dando o meu máximo — revela.
O judoca apresentou sintomas leves, situação diferente da psicóloga de Xangri-lá. Daniela começou a tossir dia 14 de maio, uma sexta-feira. No sábado, teve febre e, menos de uma semana depois, foi levada às pressas a um posto de saúde com dificuldade para respirar. Acabou internada na UTI do Hospital Conceição, onde foi entubada e chegou a ficar com 90% dos pulmões comprometidos.
— Lutei não só por mim, mas pelas minhas filhas. A que eu trazia comigo e a que me esperava em casa. Só pensava em voltar para casa e ficar com a minha família — conta a psicóloga.
O diagnóstico veio poucos dias antes da consulta que ela havia marcado para obter um laudo médico e se vacinar. Os relatos de complicações envolvendo gestantes já lhe preocupavam, mas o impacto do vírus superou suas piores expectativas. Depois da retirada do tubo, apresentou sintomas de transtorno pós-traumático, com dificuldade para dormir e medo de ficar sozinha.
A melhor notícia veio dia 22 de julho: uma cesárea, ainda em meio à internação pela covid, trouxe ao mundo a pequena Elisa. A menina passou cinco dias na UTI neonatal e, finalmente, mãe e filha puderam voltar para casa.
A partir de agora, Daniel e Daniela miram em novos desafios. Ele pretende subir de categoria e disputar outra medalha nas Olimpíadas de Paris, em 2024. Daniela passou por dois meses de fisioterapia, ainda se cansa com alguma facilidade, mas vai entrar em 2022 ao lado da família.