Entre as inúmeras coisas que a chegada da pandemia de coronavírus atrapalhou, em março do ano passado, estava o plano de Andressa de Souza Foltz, hoje com 40 anos, de ser mãe. Na época, ela estava prestes a completar quatro anos na fila da adoção, ao lado do marido, o empresário Sherlon Foltz, 43 anos. Além disso, a quarta tentativa de fertilização, marcada para abril, teve de ser adiada.
– Nós estávamos desmotivados. Com as tentativas frustradas, o tempo de espera. Eu estava borocoxô. No final de março (de 2020), meu médico me disse para ligar pra ele novamente em maio, para ver se a situação tinha melhorado. Quando maio chegou, a pandemia estava forte em Sapucaia (onde o casal mora), e eu nem cheguei a ligar – conta a publicitária.
Na tarde do dia 5 de junho, uma sexta-feira – Andressa lembra com detalhes até em qual cômodo da casa ela e Sherlon estavam naquele momento, um no quarto e o outro na sala – o telefone dele tocou. Era uma assistente social. Antes de mais nada, perguntou se o casal estava mantendo o distanciamento social, necessário para evitar a contaminação pelo coronavírus. Diante da resposta positiva, a segunda pergunta foi: estariam dispostos a reforçar ainda mais os cuidados?
– Ela nos contou que havia uma criança, internada em uma cidade próxima. Nos deu algumas informações, e perguntou se tínhamos alguma dúvida. Só consegui dizer: “É nosso?”. E ela respondeu: “Se vocês quiserem, sim” – relata a mãe.
Passada a emoção inicial, o casal teve que tomar algumas atitudes práticas. Além de enviar documentos solicitados pela assistente social, era preciso providenciar o básico para o bebê. A ficha de adoção de Andressa e Sherlon indicava que eles estavam dispostos a receber crianças de zero a seis anos. Logo, não tinham feito um enxoval com antecedência.
– Eu tinha apenas o quarto dele, com um guarda-roupas. Fora isso, nem sabia se precisaria de uma cama ou um berço. Fomos comprar algumas coisas, acionamos os padrinhos, minhas irmãs (Adriana, Andrea e Alessandra). Recebemos muita ajuda – diz.
Emoção
A ansiedade para conhecer o filho durou até a tarde de segunda-feira, quando o casal foi chamado ao hospital onde o bebê estava internado na UTI neonatal, por ter nascido prematuro e com baixo peso.
– Foi muito emocionante. Estar ali, ver o meu filho, que eu esperava há tanto tempo – relata a mãe, emocionada.
Andressa passou aquela noite no hospital com o menino, batizado Isaac Miguel Foltz e, no dia seguinte, a família foi para a casa. De lá pra cá, a rotina, que já estava diferente por conta da pandemia, mudou ainda mais. Os encontros presenciais, mesmo com a família, ficaram ainda mais restritos. As necessidades – e a saúde – do pequeno passaram a ser prioridade. Mas nada que atrapalhe a realização da, agora oficialmente, mamãe.
– O Miguel já vai fazer um ano, e gente ainda não acredita em tudo o que aconteceu. Ele é uma criança maravilhosa. Tranquilo, risonho. Desde que nos habilitamos para a adoção, todos os anos fazíamos um ensaio fotográfico registrando essa espera. Esse ano, repetimos o ensaio, agora com ele. Estamos muito felizes – conta.
Em família, mesmo a distância
A mãe de Andressa já faleceu. Porém, ela tem três irmãs que, mesmo distantes fisicamente (uma vive em São Leopoldo, uma em Canoas e a terceira no Rio de Janeiro), são muito próximas. Adriana, Andrea e Alessandra não perdem nenhum momento da vida do sobrinho Miguel pelo grupo do WhatsApp.
– Minhas irmãs têm sido fundamentais. Às vezes, fico até brava, porque elas se metem (risos). Mas esse auxílio é muito importante, assim como o meu marido. A gente fala por vídeo toda hora – relata Andressa.
Os planos para depois que a pandemia acabar incluem levar o filho para passear e visitar amigos e familiares.
– Digo para o meu marido que minha vontade é “exibir” ele em todos os lugares! Sair na rua, ir a uma praça, um parque, fazer um piquenique... A família do meu marido é enorme, mas só conhece o Miguel por vídeos e fotos. É complicado, mas temos que nos preservar.
No primeiro Dia das Mães da família Foltz. Andressa, Sherlon e Miguel vão celebrar com um churrasco em casa, e o parabéns será por chamada de vídeo com as irmãs. Nada que atrapalhe a emoção do momento, tão esperado:
– Vai ser meu primeiro Dia das Mães, né? Eu estou bem ansiosa. É uma coisa que eu sempre quis. Passei a semana emocionada com tudo. Eu já chorava com os comerciais desta data antes. Agora então... choro por qualquer coisa!
Depois dos sustos, a felicidade
Poucos dias antes do Dia das Mães de 2020, Janaína Thiesen de Souza, 36 anos, moradora do bairro Jardim Algarve, em Alvorada, descobriu que realizaria um sonho: ser mãe. A novidade, porém, trouxe sentimentos conflitantes. Junto com a enorme felicidade – ela e o marido, o técnico instalador Ezequiel, tentavam engravidar havia dois anos –, veio o medo, em função da pandemia de coronavírus.
Afinal, se hoje nem todos os detalhes sobre o coronavírus são conhecidos pelos especialistas, naquela época, há um ano, se sabia menos ainda. Como seria sua rotina? E o pré-natal? Quanto tempo seria necessário ficar em casa para evitar a transmissão? Eram muitas dúvidas e quase nenhuma resposta.
– Minha filha (Betina, hoje com quatro meses) foi muito esperada. Mas, pelo momento que estávamos vivendo, tive medo. Ninguém sabia o que a covid-19 podia afetar nas gestantes, se fosse infectada – conta Janaína.
Para evitar a doença, a auxiliar de operações, que já estava trabalhando de casa, passou os meses seguintes “praticamente trancada”, como ela mesma define. Porém, mesmo com todos os cuidados, no início de dezembro, Janaína e Ezequiel testaram positivo para a covid-19. Os sintomas foram leves, parecidos com uma gripe – coriza, dor no corpo –, além da perda de olfato e paladar. Mas o receio de uma piora que interferisse na gestação fez com que os ponteiros do relógio se arrastassem:
– A gente via na televisão casos de gestantes que tiveram complicações, que precisaram antecipar o parto. Casos em que a mãe conhecia o filho 20 dias depois do nascimento, que não podia pegar o bebê por estar doente. Temi precisar antecipar o parto, ou não poder estar com a Betina.
Planos
Apesar do susto, o casal se recuperou bem. Betina nasceu no dia 30 de dezembro, alguns dias antes do programado inicialmente, pois Janaína teve pré-eclâmpsia (doença específica da gravidez relacionada à pressão arterial elevada), mas muito saudável.
Alguns momentos idealizados pelo casal durante o planejamento da família, como o chá revelação, o chá de fraldas e os passeios com a pequena tiveram que ser modificados ou adiados. Mas a alegria de ter a filha nos braços supera qualquer coisa.
– Raramente a gente sai de casa. Só para ir ao pediatra. Aqui no pátio, sentamos embaixo da árvore, para pegar um ar, e só. Seguimos tentando nos cuidar. Esse Dia das Mães vai ser emocionante, com a Betina com saúde, e por poder passar com a minha mãe (Maria) – finaliza Janaína.
Internação
Quem também vai passar o Dia das Mães com a filha nos braços pela primeira vez é Vitória dos Santos Paulo, 18 anos, moradora do bairro Fátima, em Canoas. A pequena Ivana nasceu na última segunda-feira, dia 3 de maio, no Hospital Universitário.
No caso de Vitória, o desafio da gravidez durante a pandemia foi ainda maior. Ela e o marido, Édrio, não planejaram a gestação. Com sete meses, Vitória teve a chamada bolsa rota, quando a bolsa da gestante se rompe antes do trabalho de parto. Por isso, a jovem mãe ficou internada por mais de um mês. Em função da pandemia, não eram permitidos acompanhantes.
– Foi muito difícil. Não podia ter ninguém (da família) por perto, fiquei com os nervos à flor da pele. Conseguia falar com o meu marido pelo telefone, mas só às vezes, pois meu celular estragou. Me senti sozinha – conta.
O conforto veio da certeza de que mãe e filha estavam sendo bem cuidadas. Até a alta, ocorrida na quinta-feira passada, a equipe do hospital ofereceu, além do tratamento, apoio psicológico e companhia para Vitória:
– As enfermeiras, médicas e a psicóloga me acolheram. Nossa, foram tipo uma segunda família. Se não fosse pela pandemia, teria sido menos difícil, poderia ter alguém comigo. Mas fui muito bem tratada. Agora, é comemorar o Dia das Mães em casa.
Da insegurança à gratidão
– Eu só me perguntava: “E agora?”.
Esta foi a reação de Bruna Castro de Souza, 31 anos, moradora do bairro Mario Quintana, em Porto Alegre, em maio de 2020, ao descobrir que estava grávida pela segunda vez. Não é que ela não quisesse. Pelo contrário. Ela e o marido, o cobrador Alexsandro, que já eram pais de Rafaela, hoje com oito anos, desejavam o segundo filho havia dois anos.
– Mas ainda não tinha acontecido (a gestação), e fomos deixando passar. A escola da Rafaela parou no dia 18 de março, quando passamos a ficar mais em casa. No dia 9 de maio, descobri que estava grávida – conta Bruna.
Viver a gestação durante uma pandemia gerou todo o tipo de sentimento. Entre eles, o medo diante do desconhecido.
– Foi uma gravidez cercada de insegurança. Eu não podia deixar de fazer o pré-natal, é claro, ia ao médico, fazia os exames, mas tinha muito cuidado. Nenhum de nós pegou covid-19, graças a Deus, mas nos cuidamos muito – relata a mãe.
Diferenças
A pequena Cecília nasceu em janeiro, no Hospital de Clínicas, na Capital. Antes do parto, Bruna precisou fazer um teste de covid-19. E as diferenças entre o nascimento da caçula e de Rafaela não param por aí.
– Na primeira gestação, a gente saiu do hospital e tinha uma festa na minha casa. Tinha um monte de gente me esperando. Agora, não. Cheguei e minha mãe estava esperando, mas nem toquei nela. Larguei o bebê e fui direto para o banho, trocar de roupa. Nesse início, só vi as pessoas que convivem todos os dias comigo, minha mãe, minha irmã e meu marido – diz Bruna.
Depois de algumas semanas, a família até recebeu visitas, mas todas usando máscara e como devido distanciamento:
– As pessoas conhecem minha filha pelo WhatsApp.
Apesar dos inúmeros desafios do período, a família segue saudável e Cecília está crescendo bem. Neste domingo, além da saúde das duas filhas, Bruna vai celebrar a chance de ter sua mãe, Izaura, por perto.
– Essa data é importante pra mim, significa muito. Foi num Dia das Mães que a minha mais velha conseguiu caminhar. Ela é autista. Com três anos e meio, largou a minha mão e foi ao encontro da avó. Neste ano, a Cecília vai fazer quatro meses também no Dia das Mães. Ela é saudável, que é o mais importante, e tenho minha mãe e irmãs para celebrar – finaliza.