O Echperrrrto
Odeia os políticos e posta enormes tratados no Face endeusando Sergio Moro e a Lava-Jato. Deputados, senadores, presidente? Corruptos, todos. Passava pela Assis Brasil e não hesitou em aproveitar "o vacilo do otário que comeu mosca" para furar a fila.
Ele precisa, ele merece, ele é mais rápido.
Casal DR
Algumas horas na fila era tudo o que eles precisavam para discutir a relação. Harmonizar as energias, desmanchar as contraturas. Quem passava por eles via, através dos vidros da SUV, a emoção nos gestos, as veias salientes da garganta, os dedos em riste e, às vezes, um beijo reconciliador. Dependendo do tamanho da fila, o ciclo se repetia entre duas e seis vezes.
O estressadinho
Jogar o farol alto no carro da frente quando a fila se mexia cem metros adiante era um dever cívico.
A distância entre o para-choque dianteiro dele e o traseiro do próximo carro era 0,2 milímetro. Se submetida ao Google Translator, a buzinadinha disparada a cada espasmo de movimento da fila lá na frente significaria, em Português: "Vai mané, que tá andando".
O social
Entrou na fila sempre que conseguiu, para fazer amigos. Era encontrar um posto, parar e desembarcar do carro para iniciar longas teses sobre a greve, fora Temer, aquecimento global e aquele pênalti que não foi. Ofereceu e aceitou biscoitos, Trident e Halls de todos os que se juntaram a ele.
O emburrado
Vidros escuros, enquanto "essa bosta dessa fila não anda", derrubava mentalmente governos, brigava com o marido ou com a mulher, dava bronca nos filhos e xingava o frentista lerdo. Sabe o quê? Decidiu votar mesmo no Bolsonaro, mas tem medo de contar para amigos das humanas da UFRGS.
O executivo
A gasolina é só um detalhe. Ele é movido a trabalho. Aproveitou as horas na fila para responder a e-mails, mensagens de whats, atualizar o Linkedin, compartilhar no Face aquele texto inspirador sobre liderança e ligar para alguns clientes. No fundo, curtiu a experiência. "Adorei dedicar algumas horas para mim mesmo", disse um deles ao VP da empresa onde trabalha há 16 anos. Não vai votar em presidente. Vai votar em ministro da Economia.
Los da siesta
Parar. Deitar o banco. Trilha sonífera no Spotify...
O nostálgico
Reencontrou o amigo dos tempos de fumaceira do DCE na fila. Um longo abraço seguido da frase, cochichada no ouvido. "Se o Lula não estivesse preso..."
Na despedida, tomados pela emoção, disseram baixinho, ao mesmo tempo, punhos cerrados: "Foi golpe". "E lute como uma menina", emendou um deles. Enquanto voltava para o carro, o outro olhou o próprio vidro traseiro e achou que o adesivo "Verano Punta 2011" estava amarelado demais. "Vou tirar", pensou. Mas depois esqueceu.
O gaudério
Antes do sol raiar
Entrou na fila
E decidiu esperar
Seis litros de chimarrão
E nada do caminhão