Em cartaz a partir desta quarta-feira (6) no Star+, Os Olhos de Tammy Faye (2021) reúne vários elementos que costumam render um Oscar de interpretação — como aconteceu com Jessica Chastain, ganhadora do prêmio de melhor atriz concedido pela Academia de Hollywood em 27 de março. (A californiana de 45 anos também recebeu o troféu do Sindicato dos Atores dos EUA, o SAG Awards, e o da associação de críticos estadunidenses de rádio, TV e internet, o Critic's Choice.)
O filme dirigido por Michael Showalter, realizador das comédias Doentes de Amor (2017) e Um Crime para Dois (2020) e de quatro episódios da série The Dropout (2022), é uma cinebiografia — de 2000 para cá, 25 personagens reais foram oscarizados. Entre eles, estão o Richard Williams interpretado por Will Smith em King Richard: Criando Campeãs (2021), a Judy Garland encarnada por Renée Zellweger em Judy (2019), o Freddie Mercury de Rami Malek em Bohemian Rhapsody (2018), a rainha Ana de Olivia Colman em A Favorita (2018), o Winston Churchill de Gary Oldman em O Destino de uma Nação (2017) e a Margaret Thatcher de Meryl Streep em A Dama de Ferro (2011).
Os Olhos de Tammy Faye também é o típico filme calcado em origem, ascensão, declínio e ressurgimento, fases que permitem ao intérpretes explorarem diferentes registros dramáticos. O Oscar adora histórias assim, sejam verdadeiras ou fictícias. Baseada no documentário homônimo lançado em 2000 por Fenton Bailey e Randy Barbato, a trama acompanha a trajetória de um famoso casal de televangelistas: a excêntrica Tammy Faye Messner (1942-2007) e o ganancioso Jim Bakker (hoje com 82 anos), papel de Andrew Garfield. De origens humildes, eles se tornaram os criadores de um império religioso e midiático que incluía uma rede de TV e um parque temático. Mas acabaram caindo por causa de escândalos financeiros e sexuais.
A imagem pública de Tammy foi reabilitada graças a sua atuação junto à comunidade LGBTQIA+. Apesar de sua ligação com o fundamentalismo cristão, ela participou de marchas do Orgulho Gay e, em um episódio reconstituído no filme, em 1985 entrevistou ao vivo na televisão um pastor homossexual com aids, Steve Pieters — naquela época, tanto a doença quanto a homossexualidade ainda eram tabus.
Uma cena de Os Olhos de Tammy Faye resume a ousadia de sua protagonista. Ocorre em uma festa na mansão do reverendo Jerry Falwell (1933-2007), outro célebre televangelista, interpretado por Vincent D'Onofrio. Primeiro, Tammy atreve-se a se sentar na mesa dos homens. Depois de desafiar o machismo, ela rebate o discurso homofóbico de Falwell: "A América também é para eles (os homossexuais)".
E Os Olhos de Tammy Faye também é o típico filme de transformação física, a exemplo daquelas que contribuíram para as premiações de Robert De Niro como o Jake LaMotta de Touro Indomável (1980), Nicole Kidman como a Virginia Woolf de As Horas (2002), Charlize Theron como a Aileen Wuornos de Monster: Desejo Assassino (2004) e Matthew McConaughey como o Ron Woodroof de Clube de Compras Dallas (2013). Para viver a personagem, Jessica Chastain submeteu-se a uma metamorfose. Laureado com o Oscar de maquiagem, o trabalho inclui próteses para imitar a estrutura facial de Tammy, afinamento dos lábios, olhos e sobrancelhas extremamente pintados, cílios-aranha, perucas e rugas postiças. Quase chama mais atenção do que a interpretação de Chastain, que antes concorrera à estatueta dourada de coadjuvante por Histórias Cruzadas (2011) e de melhor atriz por A Hora Mais Escura (2012). (E que provavelmente disputará o Emmy pela minissérie Scenes from a Marriage, de 2021.)
O pecado maior do filme é querer condensar toda uma vida em duas horas. Vai desde a infância de Tammy, quando a menina, filha de um casamento prévio da pianista da igreja (Cherry Jones), descobre que a performance será sua arma, até a década de 1990, às vésperas do diagnóstico de câncer, passando por sua dependência de remédios. Por querer cobrir tantos momentos, Os Olhos de Tammy Faye soa apressado e artificial em um bocado de cenas. Seu tom oscila demais entre o satírico e o trágico. O filme torna-se esquemático e protocolar, o que, por um lado, dilui seus esboços de visão crítica sobre a biografada e o universo retratado; por outro, anula suas tentativas de comover a audiência.