Com sessões nos dias 23 e 24, no Cine Grand Café, O Apego (El Apego, 2021) integra uma cinematografia que tanto pela proximidade quanto pela qualidade costuma marcar presença no Festival de Cinema Fantástico de Porto Alegre. No Fantaspoa de 2020, a Argentina compareceu com quatro títulos, incluindo Pedra, Papel e Tesoura (ganhador dos prêmios de melhor filme, direção, atriz e roteiro na Mostra Ibero-Americana) e o premonitório Tóxico. Em 2021, foram oito, sendo que Noturna: A Noite do Velho Homem e História do Oculto receberam quatro dos cinco troféus em disputa.
No Fantaspoa de 2022, são sete argentinos no total. Entre eles, está o documentário Um Milhão de Zumbis: A História de "Praga Zumbi" (2022), de Nicanor Loreti e Camilo de Cabo, que reconstitui a trajetória de um filme de 1997 rodado com uma câmera VHS e orçamento praticamente zero por um grupo de amigos com 17 anos. A sessão, no dia 1º de maio, às 16h, será na Cinemateca Capitólio, com comentários dos diretores.
Outro destaque é Legions (2021), de Fabián Forte, sobre um feiticeiro preso em um asilo que tem um presságio: sua filha está para ser sacrificada por uma entidade maligna. As exibições serão no dia 30 de abril, às 20h30min, na Cinemateca Capitólio (com a presença do cineasta), e no dia 1º de maio, às 16h, na Sala Eduardo Hirtz. Completam a lista Bem-vindos ao Inferno, Céu Vermelho (Gigantes de Metal), Ponto Vermelho e PussyCake (veja informações sobre sinopses, datas de exibição, salas e ingressos em Fantaspoa.com).
O suspense O Apego é o quinto longa de ficção dirigido por Valentín Javier Diment, o mesmo de O Elo Podre (El Eslabón Podrido), eleito o melhor filme ibero-americano do Fantaspoa de 2015. Esse filme também levou o prêmio do público no tradicional Festival de Sitges, na Espanha, onde O Apego venceu a seleção Nuevas Visions, dedicada a obras mais experimentais. Seu trabalho anterior foi o documentário La Feliz: Continuidades da Violência (2019), em que entrelaça três incidentes políticos em Mar del Plata, ocorridos em 1971, 1977 e 2017. Diment estará em Porto Alegre para uma sessão comentada, no sábado (23), às 18h30min, no Cine Grand Café, na companhia da produtora Vanesa Pagani e do músico Gustavo Pomeranec. A outra exibição do filme será às 16h30min de domingo (24).
A trama se passa na Argentina dos anos 1970. Sob a elegante fotografia em preto e branco de Claudio Beiza, Carla (Jimena Anganuzzi) bate à porte de uma clínica para fazer um aborto clandestino. Ela sequer sabe quem é o pai, pois a gravidez foi consequência de um estupro coletivo. Como a gestação já está avançada, a médica Irina (Lola Berthet, de O Elo Podre) apresenta uma contraproposta: Carla ficará morando na clínica até nascer a criança, que então será vendida para um casal rico.
A partir daí, Diment, com a fundamental contribuição da trilha composta por Pomeranec, que evoca tanto Hitchcock quanto Almodóvar, explora as personalidades ambíguas e perturbadas das duas personagens, abordando as intersecções entre crime e sexo. Como é típico no Fantaspoa, pela frente haverá um bocado de surpresas sobre as quais não se deve falar. Há até uma reviravolta estilística.
E O Apego tem pelo menos um momento de duplo assombro. Logo após o susto que uma dessas mulheres toma quando, na iminência de uma chuvarada, vai recolher as roupas, Diment e Beiza mudam o enquadramento da cena. Agora, estamos a vendo de cima. O varal parece uma linha delimitando os espaços de cada personagem, até que uma cruza a fronteira, como que invadindo o território da outra e, assim, prenunciando uma virada de chave.