Espero que você já tenha feito seu cadastro na plataforma de streaming Wurlak para acompanhar o Fantaspoa, que começa nesta sexta-feira (9) e vai até o dia 18.
Se ainda não fez, eu elenco alguns motivos que tornam imperdível a 17ª edição do Festival de Cinema Fantástico de Porto Alegre, evento online organizado por João Pedro Fleck e Nicolas Tonsho, com recursos da Lei 14.017/2020, a Lei Aldir Blanc.
Pra começar, é tudo de graça! No atual cenário econômico, esse atrativo tem peso dobrado. Ainda mais que vem atrelado a quantidade — são 59 longas-metragens, sendo 52 inéditos no Brasil, e mais de cem curtas em exibição — e disponibilidade (os títulos podem ser vistos em casa e a qualquer horário do dia).
Outra boa razão é que se trata de uma oportunidade rara de dar a volta ao mundo durante a pandemia. Os 59 longas representam 29 países, de todos os continentes.
Mas a viagem também pode ser metafórica: além de nos apresentar paisagens pouco habituais no circuito comercial do cinema, tipo as estepes do Cazaquistão ou a noite tunisiana, os cineastas procuram expandir os horizontes do espectador. Procuram não: exigem. Trafegando por gêneros que vão da ficção científica ao terror, da fantasia ao thriller, passando pela animação, pela comédia e até pelo musical, lidando com ameaças sobrenaturais, mistérios policiais, abduções alienígenas, experimentos genéticos, mentes atormentadas e futuros distópicos, os filmes do Fantaspoa costumam ser um bem-vindo desafio. Instigam a descobrir caminhos e a propor interpretações, em vez de colocarem na mesa uma dieta convencional, pronta para consumo universal.
Como, por gentileza dos organizadores, eu já assisti a 15 filmes, vou sugerir aqui dois roteiros de viagem — um para quem tem tempo e outro para quem tem pressa (em ambos os casos, dá para saber mais sobre as obras citadas clicando nos links).
Para esses últimos, a dica é iniciar a jornada aqui do lado, com História do Oculto, da Argentina. Subindo a América, chegamos ao Canadá de A Risada. Atravessando o Atlântico, vá direto para o Leste Europeu: a Rússia nos brinda com Moscou Não Acontece, que começa como comédia, ganha contornos de policial e vira uma ficção científica. Já que você estará pertinho, desça para o Cazaquistão, na Ásia Central, cenário de A Dark, Dark Man, um policial com toques dos irmãos Coen. E já que a distância também é curta, não deixe de ir ao Irã para se jogar n'O Grande Salto, uma das quatro estreias mundiais no festival. A volta ao mundo termina com o delírio colorido da Austrália (Bloodshot Heart) e com a vingança em preto e branco pelas ruas de Túnis, na África (Black Medusa).
Se você tem mais tempo para gastar, deixe-se guiar pela curiosidade, como eu fiz ou vou fazer. Acrescente no roteiro paradas nos Estados Unidos (quero assistir a O Som da Violência, A Cabeleireira, muito elogiado pelos críticos norte-americanos, e o desenho animado Röckët Stähr's Death of a Rockstar), na Alemanha (o suspense psicológico Córtex, primeiro filme dirigido pelo ator Moritz Bleibtreu, com direito a Garota de Ipanema na trilha sonora), na Hungria (o terror Post-Mortem), na Turquia (o distópico Nas Sombras, que impressiona pela direção de arte e pela fotografia), na Índia (o surreal Rabo de Cavalo, que um amigo pretende "começar a entender lá por 2023"), em Taiwan (a comédia de zumbis Get the Hell Out) e no Japão (o fantasmagórico Dancing Mary).
Na América do Sul, faça um bis na Argentina (com o thriller criminal A Sombra do Galo, por exemplo, ou com Carroña, que o mesmo amigo disse ser "ame-o ou deixe-o") e veja um dos filmes brasileiros — a dica é Entrei em Pânico ao Saber o que Vocês Fizeram na Sexta-Feira 13 do Verão Passado (2001), paródia de horror sobre um grupo de jovens da serra gaúcha perseguidos por um psicopata mascarado. No aniversário de 20 anos, a cultuada obra foi reeditada, com a inclusão de cenas inéditas, pelo diretor Felipe M. Guerra.
Por último, mas não menos importante, a história indica que menos de 30% das atrações do Fantaspoa têm lançamento comercial no país depois. Para terem uma ideia, seis filmes da edição do ano passado entraram na minha lista dos melhores de 2021 — nenhum estreou nos cinemas ou está disponível em plataformas de streaming. Nem mesmo Butt Boy, da cinematografia hegemônica no nosso mercado, a dos Estados Unidos, tampouco os vizinhos argentinos Pedra, Papel e Tesoura e Zumbis no Canavial: O Documentário. Que dirá o finlandês Ausente, o kosovar Zana e o sul-africano Barry Fritado.
Ou seja, se vocês não assistirem agora, sabe-se lá quando poderão ver pérolas como O Grande Salto, A Risada e A Dark, Dark Man. Programe-se. O festival termina no dia 18.