O esporte em alto rendimento é difícil. Não falo isso por motivos óbvios – a alta competitividade, o nível elevadíssimo de exigência nos treinos e a dificuldade de manter-se entre os melhores. Falo porque existe uma série de aspectos que não são convencionais ou pelo menos devidamente considerados quando falamos da performance de um atleta.
Sempre falo aqui que nós, atletas, não somos só atletas. Claro que passamos boa parte de nossa vida nos locais de treino e competição, então é natural para quem está de fora que nos veja dessa forma. O problema é que isso reduz demasiadamente o que é de fato ser um atleta.
Ser um atleta não é simplesmente ser uma pessoa que pratica um esporte de forma competitiva. Ser um atleta é também sobre práticas, atitudes e idealização. É dedicar uma vida em prol de um sonho, é não ter certeza nenhuma e apostar para que tudo dê certo. São pouquíssimas pessoas que aceitariam um trabalho de uma vida de dedicação, que trabalhe de segunda a sábado, incluindo feriados, sem direitos trabalhistas, que pode levar décadas para dar retorno e mesmo assim sem garantias.
Para nós, atletas, tão desafiador quanto uma Olimpíada é evitar as distrações que nos cercam ao longo do caminho. Treinar todos os dias é o básico, descansar e comer bem é crucial e o que se espera, mas as distrações muitas vezes são o que fazem os atletas ficarem pelo caminho. Quanto mais se sobe na escala, maiores e mais difíceis de escapar elas se tornam. Patrocinadores, redes sociais e até mesmo família são alguns exemplos de distrações comuns. Redobrar os cuidados para não se deixar levar por elas é extremamente importante, principalmente em ano olímpico. Geralmente, isso é o que impede determinado atleta de atingir seu potencial.
Todo ano olímpico é a mesma situação. As modalidades dos Jogos passam a receber mais atenção da mídia e o grande público começa a consumi-las e logo já se sentem com propriedade para avaliar, inclusive, o desempenho esportivo. Não estou querendo dizer que é proibido avaliar performances. Esse não é o meu ponto. O meu ponto é que o desempenho da Olimpíada não tem a ver só com o dia ou dias que o atleta compete naquela edição. Ela é a culminação de 4 anos de trabalho árduo e muita coisa acontece ao longo desses 4 anos. É extremamente injusto julgar um atleta por um dia apenas de competição.
Dizer que determinado atleta foi uma decepção ou que fez um "fiasco" quando não consegue uma medalha, mesmo sendo favorito, são coisas que não devem ser ditas.
Não podemos tratar os esportes olímpicos como o futebol é tratado. São mundos completamente diferentes. Dizer que determinado atleta foi uma decepção ou que fez um "fiasco" quando não consegue uma medalha, mesmo sendo favorito, são coisas que não devem ser ditas. 99% das pessoas que veem o atleta, mesmo este sendo favorito, não sabem como foi o ciclo olímpico dele. Pode ser que tenha tido problemas físicos, psicológicos, com comissão técnica, com família, filhos.
São diversos fatores que podem afetar a performance de um atleta durante um ciclo, por mais bem treinado que ele esteja e é isso que torna uma medalha olímpica tão especial. Por isso, esse ano peço mais empatia para com os atletas que forem competir em Paris, por mais que eles façam parecer fácil, nunca é.