A execução de um líder de facção na Penitenciária de Canoas, um presídio construído para ser modelo de ressocialização, é o ápice de um processo que há muito preocupa juízes, promotores, defensores públicos e policiais penais.
A saída da Brigada Militar da segurança externa dos presídios, demanda de muitos anos, não veio acompanhada da substituição pelo mesmo número de policiais penais, como queriam os funcionários da Susepe. Mas esse é apenas um dos problemas na gestão do sistema carcerário.
Se é verdade que o governo de Eduardo Leite cumpriu o que vários dos seus antecessores prometeram e pôs abaixo o velho Presídio Central, substituído por uma cadeia pública destinada a presos transitórios, também é verdade que os perigosos líderes de facções foram espalhados por outras penitenciárias.
A Pecan não deveria estar recebendo líderes de facções. Recebeu porque é a única que tem bloqueadores de celular, mas os telefones funcionam graças a roteadores e modens instalados nas proximidades. Tem bloqueadores de celular, mas está longe de ser um presídio de segurança máxima, como se exige para presos de alta periculosidade. Inexplicavelmente, a Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) tem pronto um módulo que poderia ser usado para presos de regime disciplinar diferenciado e ainda não foi ocupado.
Operadores do Direito e policiais penais alertam que há presos morrendo de calor na Penitenciária Estadual de Charqueadas (PEC 1 e 2), e a direção da Susepe ignora os alertas de que essas condições aumentam o risco de uma rebelião. Denunciam falta de medicamentos e são ignorados.
É verdade que a sociedade tem uma ideia equivocada sobre presídios, e qualquer melhoria nas instalações é criticada por uma parcela da população que defende o tratamento desumano aos presos, na ideia de que não basta a pena de privação da liberdade, o preso tem de ser humilhado. O senso comum esquece que um dia esse preso será libertado e, se não houver ressocialização, cometerá outros crimes contra essa mesma sociedade.
A Pecan era um modelo de ressocialização. Muitas empresas estavam lá, oferecendo trabalho aos apenados. Não havia facções. Hoje, dizem os funcionários da Susepe, está dominada pelo crime organizado. Três módulos são ocupados por presos de uma mesma facção. Isso afastou as empresas que ofereciam trabalho.
A reação do governo foi afastar a direção da Pecan, mas será que isso resolve? Nego Jackson, o preso assassinado, escreveu uma carta de próprio punho alertando sobre um plano para matá-lo dentro da Pecan. Seus advogados pediram e conseguiram um habeas corpus para tirá-lo de lá, mas o crime ocorreu antes da transferência.
Você pode achar, como muita gente acha, que enquanto os bandidos estiverem se matando entre eles está tudo bem. Não, não está. O crime organizado transcende a área geográfica onde os líderes se instalam e transformam os moradores em reféns. Além de exigir que as forças de segurança sejam deslocadas para essas áreas, desguarnecendo outras, a guerra de facções espalha a violência na forma de balas perdidas, assaltos, roubo de carros.