Por mais tensa que tenha sido a campanha na Argentina, com o presidente eleito Javier Milei insultando o presidente Lula, o Brasil não precisa entrar em pânico com a vitória do libertário. Uma coisa é o Milei da campanha, sem travas, insultando quem não reza pela sua cartilha e classificando de comunistas todos os que têm simpatia pelo Estado forte ou expressam preocupação com o social. Ofendeu o Papa, chamou Lula de ladrão, comunista furioso e ex-presidiário, disse que não quer negociar com comunistas e colocou China e Brasil no mesmo saco.
Eleito, Milei descobriu que não será com bravatas que tirará a Argentina da crise em que está atolada. Que os exportadores argentinos precisam do Brasil, da China e de todos os mercados conquistados. Que o país precisa importar produtos da China, do Brasil e de todos os vizinhos do Mercosul, sejam os governos de esquerda ou de direita.
Na noite de quarta-feira (22), Milei deu uma entrevista ao canal Todo Notícias e disse que Lula será bem-vindo se quiser comparecer a sua posse, “porque é o presidente do Brasil”. Reconheceu que houve “curto-circuitos na campanha”, mas que” o Brasil é um grande parceiro de negócios”. Sua provável chanceler, a deputada Diana Mondino, afirmou que Lula será convidado para a posse:
— O Brasil e a Argentina sempre estiveram juntos e sempre trabalharão juntos — disse a mesma Mondino que na campanha afirmava que Milei, se eleito, pararia de interagir com o governo brasileiro.
Não só pela mudança no tom das declarações, mas o que mais deve ser levado em conta é que o presidente da Argentina não tem poderes absolutos. Decisões polêmicas precisam passar pelo Congresso. O partido La Libertad Avanza, de Milei, tem apenas 37 deputados e oito senadores. Vai precisar dos parlamentares de centro-direita, sobretudo dos ligados ao ex-presidente Maurício Macri e de Patricia Bullrich, candidata que ficou em terceiro lugar no segundo turno. Ele até pode boicotar o Mercosul, mas para excluir a Argentina da aliança terá de obter consenso mínimo.
É improvável que Lula vá à posse no dia 10 de dezembro. Tudo indica que o Brasil será representado pelo vice, Geraldo Alckmin, repetindo o que fez Jair Bolsonaro em 2019, quando escalou o o vice-presidente Hamilton Mourão para a posse de Alberto Fernández.
ALIÁS
O apoio do presidente brasileiro não dá sorte nem votos aos candidatos. Em 2019, Bolsonaro apoiou Maurício Macri, dizendo que se Fernández vencesse, a Argentina se tornaria uma nova Venezuela. Macri perdeu. Agora, Lula apoiou Sergio Massa e o vencedor foi Javier Milei.