Sobraram 30 caracteres dos 280 permitidos pelo Twitter no recado inequívoco que o vice-presidente Hamilton Mourão mandou ao país às 14h do último dia de julho: “Desde 2018 tenho viajado pelo Brasil e muitas pessoas falam que votaram na chapa JB-Mourão por confiar em mim. Em respeito a essas pessoas a mim mesmo, pois nunca abandonei uma missão, não importam as intercorrências, sigo neste governo até o fim”.
Ali está dito, sem precisar de mais palavras, que Mourão seguirá no cargo até 31 de dezembro de 2022 e sairá do Palácio Jaburu pela porta da frente. Com o tuíte, o vice-presidente encerra as especulações sobre sua eventual candidatura a senador ou a governador. Embora não precise renunciar ao mandato até 2 de abril de 2022 para concorrer, o vice fica impedido de assumir o Planalto nos seis meses anteriores à eleição, se for candidato.
O tuíte tem força por si só, mas faz ainda mais sentido quando combinado com outros fatos e declarações, dele e do presidente Jair Bolsonaro. Há poucos dias, Bolsonaro disse que Mourão às vezes atrapalha um pouco, mas que vice é como cunhado: a gente precisa suportar. Foi deselegante, mas até aí não há novidade.
Antes desta manifestação, Mourão foi questionado sobre a suposta ameaça do general Braga Netto, ministro da Defesa, de que sem voto impresso não haveria eleição. Sem titubear, respondeu:
— É lógico que vai ter eleição. Quem é que vai proibir eleição no Brasil? Por favor, gente, isso aí... Nós não somos uma república de banana.
A afirmação do vice de que fica até o fim do governo foi feita na véspera das manifestações convocadas pelo presidente Jair Bolsonaro em defesa do voto impresso, também chamado de auditável. Mourão nunca pôs em dúvida o sistema eletrônico de votação, pelo qual ele e Bolsonaro foram eleitos em 2018, e essa é só mais uma das divergências com o presidente e seus filhos.
Antes teve a discordância explícita em relação às vacinas (Mourão se vacinou e publicou a foto, Bolsonaro diz que será o último a se vacinar), o uso de máscara (o vice nunca aparece em público sem o acessório e o presidente faz questão de desfilar com o rosto descoberto). Foi Mourão quem deu ao deputado Eduardo Bolsonaro o apelido nada generoso de “bananinha”, quando o zero três atacou a China e criou um incidente diplomático, e mais de uma vez criticou os arroubos do vereador Carlos Bolsonaro.
Ficando no governo até o fim, Mourão está dando ao país a garantia de que será fiador da democracia, se for preciso evitar um golpe, e que assume se Bolsonaro for impedido de continuar por alguma razão — impeachment, renúncia à moda Jânio Quadros ou qualquer outra “intercorrência”.