Confesso que eu tinha uma certa bronca com Cristiano Ronaldo. Aquela coisa de ficar se olhando no telão me parecia o cúmulo da futilidade. Até dava o desconto de que um cara bonito como ele, tantas vezes escolhido o melhor do mundo, tinha o direito de ser vaidoso, mas não gostava do narcisismo exagerado do craque português. Pois a Copa da Rússia está servindo para mostrar coisas que ignorava por não ter o futebol entre as minhas áreas de interesse. Uma delas é esse lado humano da máquina de fazer gols conhecida como CR7.
Achava que era pela vaidade que Cristiano Ronaldo mantinha o corpo sem tatuagens, coisa rara entre os jogadores de futebol. Eis que num desses intervalos ouvi a explicação que não é novidade para os colegas do Esporte nem para os fãs do gajo: ele é doador regular de sangue e está cadastrado no banco de doadores de medula. Quem faz tatuagem fica temporariamente impedido de doar sangue. E CR7, reza a história oficial, não quer enfrentar essa quarentena. Como não virar fã de uma pessoa com esse tipo de preocupação?
Os céticos dirão que é puro marketing. Se for, que bom ver um ídolo com milhões de fãs pelo mundo fazendo propaganda (gratuita) de uma coisa tão essencial quanto a doação de sangue e de medula. Eis que o moço que eu achava apenas talentoso e narcisista é bonito por dentro e por fora. Neste momento é o goleador da Copa, carrega a seleção de Portugal nas costas e, que eu tenha visto, não fez nenhuma tentativa malandra de enganar a arbitragem do Mundial.
Da minha lista de melhores deste início de Copa da Rússia constam, também, as torcidas do Japão e do Senegal limpando o estádio depois do jogo, a garra do goleiro Ochoa na vitória do México sobre a Alemanha, os mexicanos vibrando a ponto de fazer a terra tremer, depois do resultado improvável, e a Islândia, claro. O mundo está conhecendo a Islândia, com sua seleção de profissionais que não vivem do futebol. Do goleiro cineasta ao jogador que trabalha numa indústria de sal, é um time formado por atletas singulares.
Claro que administrar a Islândia, com uma população pouco maior do que acee Caxias do Sul, não é como gerir um país de 200 milhões de almas. O que encanta na Islândia é o investimento em educação, cultura e esporte. Isso faz a diferença.
Na mesma Copa em que aprendemos a admirar a Islândia, vimos o Brasil virar notícia pelo comportamento primitivo de um grupo de torcedores que se divertia fazendo uma russa que não fala português repetir uma palavra chula usada como sinônimo de genitália feminina. Cruzaram o oceano para passar vergonha e envergonhar seu país. Talvez a Copa da Rússia ensine a esses sem-noção que passou o tempo do "não dá nada" e que não se brinca com a dignidade alheia.