De todos os números da crise da CEEE, um é especialmente revelador da situação caótica da empresa: nos últimos 10 anos, a companhia desembolsou R$ 1,4 bilhão com ações trabalhistas movidas por empregados e ex-funcionários. O balanço de 2017 registra a provisão de mais R$ 800 milhões para quitar débitos decorrentes de ações movidas na Justiça do Trabalho. A sangria é produto de uma combinação de descumprimento da legislação trabalhista com negligência de advogados na defesa da estatal. Não são poucos os casos em que a CEEE foi condenada à revelia porque perdeu prazos para apresentar defesa.
A secretária de Minas e Energia, Susana Kakuta, decidiu dar transparência total aos números da CEEE para mostrar aos deputados e à sociedade por que o governo de José Ivo Sartori está tentando obter o aval da população, em plebiscito, para vender ou federalizar a CEEE. A secretária confirma que a dívida de R$ 800 milhões em ICMS, citada pela coluna na edição de sexta-feira, é apenas um dos problemas da empresa:
— Além de não conseguir fazer os investimentos necessários, a CEEE está atrasando até o pagamento de fornecedores.
A dívida com o fundo de pensão EletroCEEE, que complementa o salário dos aposentados, é de R$ 1 bilhão. Quando fala em situação caótica da empresa, a secretária está se referindo à CEEE Distribuição, que está ameaçada de perder a concessão no final do ano, se não conseguir cumprir as metas estabelecidas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). A CEEE GT (Geração e Transmissão) vai bem, mas o temor é de que a crise de uma acabe arrastando a outra para o pântano. Em caso de aprovação da privatização em plebiscito, a ideia do governo é vender o pacote inteiro. Em linguagem popular, vender o filé para se livrar da carne de pescoço.
Sabedora da resistência dos deputados em aprovar a autorização para que o plebiscito seja realizado junto com a eleição, Susana está disposta a ir de gabinete em gabinete para mostrar os números e responder às perguntas dos parlamentares. A secretária vai mostrar que, se perder a concessão, o Estado vai herdar o passivo da CEEE e não terá o que vender, porque seu valor não está nos terrenos, nos prédios ou nos equipamentos. O que realmente vale é a concessão para explorar um serviço cuja demanda tende a aumentar com a retomada do crescimento econômico, o que exige investimentos pesados das operadoras.
Enquanto a CEEE patina sem conseguir sequer pagar as contas, a RGE, comprada recentemente pela CPFL, vai investir R$ 750 milhões na construção de subestações, substituição de postes e adoção de sistemas inteligentes para evitar perda de energia.
Os empregados da CEEE se recusam a acreditar que a empresa está à beira da falência e resistem como podem à tentativa de privatização. Temem pelo emprego e pela perda de benefícios, já que nenhuma empresa privada oferece vantagens semelhantes.