O ritmo da vacinação contra a covid-19 já foi muito mais lento em nível global - com exceções como Israel, Emirados Árabes Unidos, Chile e Reino Unido. A realidade também já mostrou que decisões políticas são decisivas para acelerar a imunização em lugares como Estados Unidos e União Europeia (UE). Atrasos na África ou nos grotões da Ásia são explicados pela pobreza, dificuldades de acesso aos grandes laboratórios, corrupção e desinteresse de governos, resistências de populações e até ignorância - não que isso não ocorra também por aqui, no Ocidente. Mas o fato é que, olhando-se o mapa da vacinação no mundo, a partir do monitor da Universidade de Oxford, há situações difíceis de explicar.
Uma das incógnitas que a coluna vem levantando é a demora de nações produtoras de vacinas em imunizar suas próprias populações, casos de Índia, China e Rússia. A China, diante do caos indiano e da situação que começa a se complicar em outros territórios vizinhos, como Taiwan e Singapura, começou a priorizar o público doméstico. Outra é por que, nações desenvolvidas da Ásia e Oceania, que foram eficientes no controle e rastreio de casos de coronavírus no ano passado patinam na imunização - casos de Japão, Coreia do Sul, Nova Zelândia e Austrália
Para cada país do mundo há uma explicação para a vacinação lenta. Mas o caso do Japão é praticamente incompreensível. O país está a dois meses do começou da Olimpíada e vacinou apenas 4,37% da população. Para efeitos de comparação, utilizemos a métrica de doses para cada cem habitantes. O Japão aplicou 6,32 injeções para cada cem moradores, ou seja ocupa o último lugar dos países mais ricos do mundo, o G-7, está atrás de toda a UE (Espanha, por exemplo, aplica 51,25 doses para cem habitantes) e de praticamente toda a América do Sul - o Brasil, por exemplo, registrava neste domingo 27,1 doses para cem habitantes, mas o país asiático perdia também para nações pobres como a Bolívia, com 11,63 doses para cem habitantes.
Assim fica difícil convencer a população culta, disciplinada, que já viveu tragédias de guerras e pandemias anteriormente de que um evento como uma Olimpíada é possível de se realizada em seu território daqui a 60 dias. Uma pesquisa publicada na semana passada pelo jornal Asahi Shimbun mostrou que 83% dos japoneses desejam que os Jogos sejam cancelados ou adiados pela segunda vez - em 2020 isso já ocorreu. Apenas 14% acreditam que eles devem ocorrer.
Dentro do percentual otimista está o governo Yoshihide Suga, que garante ser possível realizar as competições com segurança. Nem a totalidade de seu partido, o Liberal Democrático, acredita nisso. Hoje, das 47 províncias do país, 20 vivem aumento explosivo de casos de covid-19. Dez estão em estado de emergência - entre elas, Tóquio, Kyoto e Osaka. Em 13 de maio, o país registrou a maior média móvel de novos casos desde o início da pandemia: 6.460 em 24 horas. Cinco dias depois, a maior média de mortos: 108,29.
E por que não vacinam em um ritmo acelerado? Parte da explicação se deve à demora do governo em negociar com os laboratórios. A campanha de imunização só começou em 14 de fevereiro, quando o Reino Unido vacinava desde 8 de dezembro. Há muita desconfiança por parte da população. E, como em um primeiro momento a pandemia foi controlada, há uma sensação de que o perigo não é tão iminente.
Não duvido da resiliência, do poder de renascer das cinzas e da disciplina dos japoneses, capazes de, em dois meses, darem a volta por cima. Mas, neste momento, a situação é bem complicada.