O discurso da concessão, quando o candidato derrotado vai a público admitir a derrota, é o pontapé na transição nos Estados Unidos.
Esse gesto costuma definir a temperatura dos dias até 20 de janeiro, quando ocorre a posse do sucessor. De 2004 para cá, John Kerry, John McCain, Mitt Romney e, com alguma demora, Hillary Clinton seguiram a tradição de conceder a vitória de forma respeitosa ao adversário (George W. Bush, Barack Obama e Donald Trump, respectivamente). Até este momento, é difícil imaginar não apenas o atual presidente indo à TV, admitindo sua derrota e desejando boa sorte a Joe Biden. Muito menos imaginar uma transição pacífica de poder.
O discurso da concessão é também parte do legado de um presidente. Como disse o ministro das Relações Exteriores da Alemanha, Heiko Maas, "perdedores decentes são mais importantes para o funcionamento de uma democracia do que vencedores brilhantes".
Trump pode sair derrotado da eleição, mas o trumpismo seguirá vivo. O presidente é o segundo candidato da história dos EUA a receber mais votos (69,8 milhões) - o primeiro é Biden (73,9 milhões). O conservadorismo e o nacionalismo sofrerão um golpe, mas o movimento não acaba com a eleição. A polarização política, o negacionismo, elementos típicos desse de governos autoritários, com fervor religioso, estão muito presentes.
Trump não será algo passageiro - o que deixa lições ao mundo em geral (Brasil inclusive) e aos partidos políticos. Mesmo derrotado, a se confirmar o resultado nas próximas horas ou dias, ele pode voltar a concorrer em uma eleição daqui a quatro anos.
A solidez e a história do Partido Republicano não podem depender de líderes populistas, como Trump, para exercer o poder. As manifestações dos caciques da legenda foram suaves demais diante do festival de inverdades que o presidente afirmou durante pronunciamento na noite de quinta-feira na Casa Branca.