O Brasil fez concessões concretas aos Estados Unidos no encontro entre os dois presidentes em Washington. Em troca, recebeu de Donald Trump expressões como "apoiamos", "prometemos", "temos a intenção". Não muito diferentes de uma carta de boas intenções.
Uma das medidas anunciadas pelo presidente Jair Bolsonaro em Washington sem o famoso toma lá dá cá que costuma reger as relações internacionais é a decisão de dispensar os americanos da exigência de vistos, sem reciprocidade. Nem entrou na pauta — e dificilmente entrará em algum momento — o Brasil integrar a lista de nações cujos cidadãos estão dispensados do documento nas aduanas dos EUA.
Outra entrega concreta foi a permissão de uso da base de Alcântara com salvaguardas tecnológicas, ou seja com a garantia de que o conhecimento técnico e os equipamentos americanos usados no lançamento de foguetes — e potencialmente mísseis — não serão conhecidos pelas autoridades brasileiras.
Cedemos também na área comercial, campo em que sucessivos governos no Planalto levantaram bandeiras. Resultado: o Brasil, segundo a declaração conjunta publicada pela Casa Branca, "implementará uma quota tarifária, permitindo importação anual de 750 mil toneladas de trigo americano com tarifa zero". Em troca: nenhum comprometimento por parte do governo Trump em diminuir subsídios aos produtores americanos.
Graças a essa e outras concessões, Bolsonaro conseguiu o APOIO do presidente americano para o ingresso do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Apoio, vale lembrar, não significa autorização ou adesão automática. Não cabe a Trump decidir quem entra e sai do órgão. O ingresso de qualquer país precisa de aprovação de governos europeus, que, aliás, preferem alguma nação de seu próprio continente.
Para entrarmos pela porta da frente da OCDE, cedemos mais uma vez: abrimos mão da condição de país em desenvolvimento na Organização Mundial do Comércio (OMC).
Aliás, também ficou explícito, durante o encontro entre Trump e Bolsonaro, o desprezo pelo sistema das Nações Unidas (ONU), que rege as relações globais desde a II Guerra Mundial. Do comércio à crise na Venezuela, a ordem multilateral que deu alguma lógica ao mundo foi ignorada. Quando se falou sobre planos militares para mudança de regime no país de Nicolás Maduro, por exemplo, em nenhum momento foi aventada a possibilidade de discussão — mesmo de um intervenção militar — via Nações Unidas, único organismo, pelo direito internacional, com caneta para autorizar um ataque a outro país soberano.
Ainda na área militar, Trump PROMETEU ao Brasil o status de "major non-NATO ally" (grande aliado extra-Otan), designação que cabe a países que não são membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte, mas considerados aliados estratégicos dos EUA. O que isso significa na prática? O país passa a ter acesso a diferentes tipos de cooperação militar e a transferências de tecnologia — como Afeganistão, Argentina, Egito, Israel, Paquistão, entre outros. É positivo. Mas também é uma INTENÇÃO. Não um aceite.
— Alguém tem de ceder o braço, ou melhor, a mão. Primeiro fomos nós — justificou Bolsonaro.
Política internacional é como xadrez: às vezes, é necessário recuar para que sejam dados dois passos à frente no futuro. O tamanho dos ganhos ou das perdas da conversa de 20 minutos entre Trump e Bolsonaro no Salão Oval só será medido a partir da ação do tempo.