Este 14 de maio, infelizmente, é emblemático por vários motivos. O principal é que estamos assistindo, ao vivo, ao colapso de um sonho da comunidade internacional, gestado nos escombros da II Guerra Mundial e parido na fundação da Organização das Nações Unidas (ONU). A ideia de dois Estados, um israelense e outro palestino, acabou.
Resgatemos o projeto inicial: a resolução 181, aprovada em 29 novembro de 1947 pela Assembleia-Geral da ONU, estabelecia a partilha do que conhecemos como Palestina, uma área sob mandato britânico que deveria ser dividida entre os dois povos.
O que de fato ocorreu: os judeus, organizados, motorizados pelo sionismo e já presentes na região formaram imediatamente seu Estado. É verdade que muitos palestinos foram expulsos de casa e esse é um dos principais entraves a qualquer negociação. Houve protestos, os países árabes tentaram muitas vezes jogar Israel no Mar Mediterrâneo em sucessivas guerras, mas o fato é que nunca, por problemas internos e externos, os palestinos conseguiram organizar a criação de seu próprio Estado. Entraves internos, por culpa da corrupção da Autoridade Nacional Palestina (ANP) e de grupos terroristas e, externos, por uma estratégia arrasa-quarteirão israelense, minaram a criação de um país chamado palestina com o que sobrou do plano original da ONU.
A Faixa de Gaza representa a metade do território de Porto Alegre. E a Cisjordânia é uma colcha de retalhos, apinhada de colônias judaicas. Ora, dois dos princípios básicos de um Estado-nação é soberania e território. Na Cisjordânia, que deveria ser o coração do Estado palestino, não há nem um nem outro: os palestinos não mandam em sua área e tampouco há continuidade territorial.
O governo de Israel, com sua prática sistêmica de ampliar as colônias judaicas, vai anexando, dia após dia, territórios na Cisjordânia. Não há e não haverá Estado palestino. O que veremos em poucos anos, ainda que a comunidade internacional esperneie, será um Estado de Israel mais amplo do que em 1948, ganho a fórceps ao anexar o restante da Cisjordânia e, logo, a Faixa de Gaza.
O presidente dos EUA, Donald Trump, ao anunciar a transferência da embaixada de Tel Aviv para Jerusalém, já havia colocado a pá de cal em qualquer ideia de ressuscitar o processo de paz. A um primeiro olhar, pode significar apenas uma mudança simples de cidade. Não é. O que vemos hoje é apenas o epílogo da consolidação da ideia de implodir a geopolítica na região.
Ao levar para Jerusalém a sede da diplomacia americana, Trump está reconhecendo a cidade como capital de Israel (o Brasil e a maioria dos países mantêm sua embaixada em Tel Aviv). Abre-se a caixa de Pandora porque os palestinos sempre reivindicaram a área oriental (onde a maioria é árabe) como sua capital.
Território, volta dos refugiados palestinos a suas terras e Jerusalém. Dos três entraves a uma paz duradoura na região, o status da cidade sagrada para as três religiões monoteístas sempre foi o mais difícil de haver concórdia. Pelo simbolismo em uma região que vive de símbolos e manipulados politicamente.
É uma pena que o aniversário de 70 anos do Estado Israel, um país forjado a ferro e fogo, com um povo pacífico, perseguido ao longo da História e que transformou o deserto em uma das áreas mais prósperas do planeta, seja comemorado em meio à marca de mais de 40 mortos e 500 palestinos feridos.