O relatório mundial de 643 páginas, divulgado nesta quinta-feira em nível mundial, a organização Human Rights Watch põe o populismo como o grande desafio na luta pelos direitos humanos este ano. Em seu ensaio introdutório, o diretor executivo, Kenneth Roth, escreve que os líderes políticos dispostos a defender os princípios de direitos humanos mostraram que é possível frear as agendas populistas e autoritárias.
— Quando contaram com o apoio de um público mobilizado e atores multilaterais efetivos, esses líderes demonstraram que a ascensão de governos com uma plataforma contra direitos não é inevitável — afirma.
O Brasil voltou a ser criticado por conta das execuções extrajudiciais cometidas pela polícia. "O Congresso agravou a situação ao aprovar em outubro uma lei que afastou da jurisdição civil membros das forças armadas acusados de homicídio contra civis em operações de segurança pública, atribuindo essa competência a tribunais militares", afirma o documento. No país, a representante da ONG, Maria Laura Canineu, afirma que a polícia precisa "desesperadamente" da cooperação da comunidade para combater os índices de criminalidade.
— Mas enquanto alguns policiais agredirem e executarem pessoas impunemente, as comunidades não confiarão na polícia — destaca Maria Laura.
A seguir, os principais tópicos abordados pelo relatório, que faz uma análise de 90 países:
Isolacionismo e populismo
A ONG aponta preocupação com posições isolacionistas dos EUA e do Reino Unido, em especial com o Brexit. Também cita a China e a Rússia, cujos governos estão "focados em suprimir qualquer possibilidade de protestos maciços contra a retração de suas economias e a corrupção generalizada". A Turquia do presidente Recep Tayyip Erdogan aparece como nação onde "populistas e outras forças contrárias a direitos prosperam". O reforço do autoritarismo após o anunciado golpe de Estado, em 2016, é destacado.
Tragédia humanitária
A crise envolvendo os rohingyas, etnia que está sendo expulsa por Mianmar, é citada no relatório em crítica a Aung San Suu Kyi, líder laureada com o Nobel da Paz em 1991, mas que tem se mostrado ineficiente no controle de uma limpeza étnica em curso. Desde 1982, os rohingyas não são reconhecidos como cidadãos de Mianmar.
Bangladesh registrou mais de 1 milhão de refugiados rohingyas em campos na fronteira com Mianmar. O levantamento foi feito com base em dados biométricos e é superior ao estimado pelas Nações Unidas _ 962 mil. Trata-se de uma das maiores catástrofes humanitárias do século.
Autoritarismo nas Filipinas
A política do presidente filipino, Rodrigo Duterte, contra as drogas é classificada pela Human Right Watch como exemplo "cínico e letal de um desafio populista aos direitos humanso". Embora pouco conhecido por aqui, Duterte tem contornos de ditador: no passado, chegou a se comparar ao líder nazista Adolf Hitler e comparou a política antidrogas à política sistemática de extermínio de judeus.
— Hitler massacrou três milhões de judeus. Há três milhões de viciados em drogas (nas Filipinas). Eu ficaria feliz em matá-los — disse Duterte, em 2016.
Violência policial no Brasil
O documento afirma que execuções extrajudiciais cometidas por alguns policiais no Brasil colocam em risco a vida de outros policiais que ficam sujeitos à retaliação pelos violentos abusos dos colegas, e acabam por aumentar a violência durante confrontos com suspeitos. A Human Rights Watch destaca que, em 2016, 437 policiais foram mortos no Brasil, a grande maioria deles fora de serviço.
No mesmo ano, policiais mataram pelo menos 4.224 pessoas, cerca de 26% mais do que em 2015. Após dois anos de queda no número de mortes causadas por policiais em serviço em São Paulo, as 494 mortes entre janeiro e setembro de 2017 representaram um aumento de 19% em relação ao mesmo período de 2016. Os policiais em serviço no Rio de Janeiro mataram 1.035 pessoas entre janeiro e novembro, um aumento de 27% em relação ao mesmo período de 2016.
O texto também critica a violência doméstica. "A implementação da Lei Maria da Penha de 2006, para coibir a violència doméstica, ainda está incompleta". As delegacias especializadas da mulher contam com recursos humanos insuficientes, geralmente fecham durante a noite e aos finais de semana, e permanecem concentradas nas grandes cidades. De acordo com os dados disponíveis, milhares de casos por ano não são devidamente investigados.
Em 2016, 4.657 mulheres foram mortas no Brasil. Naquele ano, o Ministério Público apresentou denúncia em ao menos 2.904 casos _ alguns estados não disponibilizaram ou forneceram dados parciais _ de suposto feminicídio, definido por uma lei de 2015 como o homicídio contra a mulher "por razões da condição de sexo feminino".
O capítulo sobre o Brasil no relatório também aborda questões de direitos humanos relativas ao público LGBT, migrantes, pessoas com deficiência, entre outros.