Ouça a coluna de Rodrigo Lopes:
Vladimir Putin não bate-boca pelo Twitter. Ardiloso espião de carreira gestado na KGB e animal político, o presidente russo não manda recados. Calculista, espera a poeira baixar para só então se manifestar. Nesta quarta-feira, ao falar pela primeira vez sobre a ação militar americana na Síria, foi cirúrgico: "As relações com os EUA pioraram com Donald Trump", disse à emissora MIR.
Que fique claro: todo otimismo de uma lua-de-mel russo-americana com a eleição de novembro sempre partiu de Trump. Nunca de Putin, pelo menos às claras. Inclusive o presidente russo pode ter escolhido esta quarta-feira para a entrevista como forma de neutralizar o impacto do encontro entre o seu ministro de Relações Exteriores, Sergei Lavrov, e o colega americano, secretário de Estado Rex Tillerson, em Moscou, a primeira de um alto funcionário da Casa Branca de Trump. Ganhou manchete internacional duas vezes: com a declaração e, depois, quando decidiu ele próprio ir ao encontro com Tillerson, algo que não estava nos planos.
Não foi a reunião dos sonhos. Foi dia de discutir a relação, de lavar a roupa suja. Os russos disseram que desejam compreender as "verdadeiras intenções" dos EUA na política internacional. Os americanos afirmaram que desejam um diálogo "aberto, franco e sincero". Nas entrelinhas, desconfiança. Uma intenção de reunião futura entre Trump e Putin já seria uma vitória.
Antes da ação de Trump na Síria, esperava-se que a viagem de Tillerson a Moscou fosse o início de uma relação harmônica. Agora, o máximo que se pode aguardar é por uma "estabilização em um nível baixe", no jargão diplomático. Em outras palavras, uma relação fria, capaz, ao menos, de evitar que as coisas piorem.