Que punição merece alguém que mata o próprio filho? E digo filho criança, sem condições de defesa. Aliás, que punição merece alguém que, antes de matar, passa anos torturando esse mesmo filho?
Na semana passada, o corpo de Kerollyn Souza Ferreira, nove anos, foi encontrado em uma lixeira no bairro Cohab Santa Rita, em Guaíba. Segundo o chefe da Polícia Civil, delegado Fernando Sodré, a menina "sofria todo tipo de maus-tratos" por parte da mãe, Carla Carolina Abreu Souza, 29 anos, presa como suspeita do assassinato.
Não quero me estender em detalhes, mas você lembra do Miguel? Aquele menino de sete anos que, até ser morto pela mãe e pela madrasta, em Imbé, era espancado, acorrentado, preso dentro de um armário, impedido de comer, impedido de brincar e impedido de ir à escola pelas duas. Em abril, elas foram condenadas à prisão por 57 anos (a mãe) e 51 anos (a madrasta). Daqui a 20 anos, um pouco mais, devem progredir para o regime semiaberto. É uma punição justa?
Acho impossível, em casos assim, não pensar em pena de morte. E olha que sempre fui contra, embora entenda quem seja a favor — há argumentos razoáveis para defendê-la. A questão é que, para mim, argumento algum jamais superou uma obviedade: matar é errado. E, se matar é errado, não pode o Estado matar.
— QUERIA VER SE FOSSE COM A TUA FAMÍLIA, SE TU NÃO IA QUERER QUE MORRESSE!!!!!!!!!
Claro que ia. Só que eu não sou o Estado. Ou seja: eu posso, sim, ser passional, irracional e vingativo. Até porque não tenho como não ser — o ser humano é. E é justamente para isso, para deter os ímpetos humanos, que existe o Estado. É ele que impõe as leis e as regras que viabilizam o nosso convívio em sociedade.
Se alguém infringe essas regras, deve ser punido, claro. Mas com punições que, da mesma forma, não descumpram essas regras. Nunca admiti que o Estado, responsável por dizer o que é errado, praticasse uma conduta que ele próprio considera errada. Mas aí deparo com Kerollyns, Miguéis e Bernardos e quero, quero muito, quero com todas as minhas forças, o sangue dos seus algozes.
É estranho desejar que uma pessoa morra e, ao mesmo tempo, entender que ninguém — nem o Estado — tem o direito de matá-la. Mas é uma contradição que me parece adequada.