Ao sancionar a lei que autoriza o retorno do público aos estádios, Sebastião Melo só vetou uma emenda: a que obrigaria as pessoas a apresentar, na entrada do jogo, a carteira de vacinação. Motivo do veto?
– É um tema que está em discussão na Câmara Municipal – disse o prefeito.
Não é a melhor das desculpas. Afinal, a emenda foi aprovada justamente pela Câmara Municipal, ou seja, os vereadores já discutiram o assunto. Mas Melo, não é de hoje, tem fugido como o diabo da cruz de qualquer coisa relacionada ao comprovante de vacinação. Não que ele seja um negacionista – a questão é que o apoio dos negacionistas se tornou vital para o governo dele.
No mês passado, o secretário municipal da Saúde, Mauro Sparta, e o diretor de Vigilância em Saúde, Fernando Ritter, chegaram a defender um passaporte vacinal para garantir a retomada dos eventos com segurança. Bastou duas vereadoras da base aliada, Fernanda Barth (PRTB) e Nádia Gerhard (DEM), reagirem contra a proposta para o prefeito desautorizar publicamente seus auxiliares.
Fernanda, aliás, subiu à tribuna dias atrás para dizer que, até agora, não tomou vacina nenhuma – ela prefere aguardar "o momento em que achar oportuno", como se houvesse momento mais oportuno para se vacinar do que uma pandemia. Junto com Nádia e outros três vereadores – todos apoiadores do governo Melo –, ela é autora de um projeto que proíbe a exigência de comprovação da vacina para entrar em qualquer lugar.
A justificativa é a mesma de sempre: não se vacinar seria um direito individual. Uma cambalhota retórica, claro, porque é justamente o contrário: vacinar-se é um dever cívico, uma obrigação cidadã, já que os direitos de uma comunidade, em qualquer regime democrático, se sobrepõem aos individuais. Não se vacinar é colocar em risco o direito à vida e à saúde de uma coletividade inteira – afinal, como se sabe, a estratégia de imunização só funciona se houver adesão em massa.
Em resumo, caso queira descumprir esse dever, tudo bem, ninguém vai levá-lo amarrado a um posto de vacinação, mas você precisa assumir as consequências dessa escolha. O passaporte vacinal, exigido em 21 países – e, mais recentemente, em cidades brasileiras como Rio e São Paulo –, faz exatamente isso: ele impõe consequências aos inconsequentes.
Nada mais justo. Uma pena que Porto Alegre, ao que tudo indica, não vá exigir comprovante de vacina para nada. Os negacionistas estão em peso no governo e na base aliada da Câmara. Melo optou por eles.
Vereadora responde
Após a publicação do texto acima, a vereadora Nádia Gerhard (DEM) escreveu para dizer que é "a favor da vacinação, para quem deseja se vacinar". Afirma Nádia na nota: "Conscientizar a população sim, mas nunca coagir ou obrigar. Não podemos criar subcategorias de cidadãos na nossa cidade".
Segundo ela, a vacina não previne a infecção, não previne a transmissão e não previne mortes – tudo isso, vale repetir, segundo ela. "Então, passaporte vacinal não é sobre saúde, mas sobre controle protocolar", conclui a vereadora, acrescentando que "a liberdade é preciosa e inegociável".