O esforço do governo Lula em regulamentar o transporte de passageiros por aplicativos é louvável, mas a apresentação de um projeto de lei (PL) ao Congresso é apenas o passo inicial de uma discussão que ainda deve ser longa e desgastante. As mesas de discussão coordenadas pelo Ministério do Trabalho avançaram, mas ainda há pontos de resistência entre as plataformas e os motoristas.
A negociação é difícil por vários motivos. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), coletados em 2022, o país tem ao menos 778 mil pessoas trabalhando em aplicativos de transporte de passageiros. Além de numerosa, a categoria é diversa e tem pouca representatividade. Isso cria empecilhos para estabelecer unidade nas negociações, e dificulta até mesmo a percepção sobre a concordância ou não dos motoristas sobre o projeto apresentado pelo governo.
Do outro lado, sempre houve resistência das empresas a qualquer medida que gere obrigações. O governo garante que conseguiu avançar neste convencimento, mas as divergências devem vir à tona durante a tramitação no Congresso. Os motoristas se queixam de que o retorno financeiro é cada vez menor e que as plataformas não garantem direitos mínimos, como a cota de contribuição previdenciária.
O avanço de propostas de regulamentação de aplicativos tem sido difícil em vários países. No Brasil, o projeto do governo envolve apenas o transporte de passageiros, ainda não houve acordo para uma proposta envolvendo motoboys e ciclistas parceiros de plataformas como Ifood e Rappi.
Em funcionamento no Brasil há 10 anos, o serviço executado hoje por Uber, 99 e outras plataformas semelhantes não tem qualquer regulamentação. Por isso, há méritos na iniciativa do governo em tentar formalizar os motoristas como autônomos, com acesso à Previdência Social e exigência de compromisso das plataformas em dar o mínimo de conforto aos trabalhadores.
No Congresso, já há parlamentares debruçados sobre o tema e discutindo outras propostas há bastante tempo. O texto enviado pelo governo certamente receberá sugestões de mudanças. Em ano eleitoral e com diversos projetos na fila, é fundamental que os parlamentares priorizem o tema, até mesmo para evitar a insegurança jurídica que nos últimos anos deixou margem para decisões em vários sentidos.
Neste momento, aliás, o Supremo Tribunal Federal (STF) analisa se há vínculo empregatício entre motorista e plataforma, em um caso que terá repercussão geral.
O assunto, portanto, é complexo. Além de agilidade, exigirá equilíbrio no Congresso para assegurar ao mesmo tempo os direitos dos motoristas e a viabilidade do serviço.